sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Hoje almoçarei sozinho

Conhecemo-nos participando em tarefas cívicas mobilizadoras e exigentes. Partilhávamos a amizade de um amigo comum. A jovialidade, a argúcia e finura de espírito do Francisco Ferreira Gomes, dirigente estudantil da primeira geração de 60, não passavam despercebidos, apesar do seu feitio discreto. Desde que saira da Lever, empresa de que fora director-geral durante duas décadas, dedicava-se ao ensino, para o qual Daciano Costa o cativara. Um dia, já nesta fase da sua vida, entrara pelo escritório dos seus antigos companheiros da Faculdade de Direito de 1957-1962, para concluir o estágio de advocacia que, em tempo, não realizara.
Hoje almoçarei sozinho no restaurante chinês onde na última década, criámos o hábito de marcar um almoço para "falar de política". De facto, falávamos de tudo, porque a curiosidade, o gosto da conversa amena e afável e o mundo do Francisco eram inesgotáveis, e a política não passava de puro pretexto.
Não há processo de iludir o luto originado pela morte de um amigo. Descobrimo-nos mais sós e desamparados.

2 comentários:

Anónimo disse...

À FRAGILIDADE DA VIDA HUMANA


Esse baixel nas praias derrotado
Foi nas ondas Narciso presumido;
Esse farol nos céus escurecido
Foi do monte libré, gala do prado.


Esse nácar em cinzas desatado
Foi vistoso pavão de Abril florido;
Esse Estio em Vesúvios encendido
Foi Zéfiro suave, em doce agrado.


Se a nau, o Sol, a rosa, a Primavera
Estrago, eclipse, cinza, ardor cruel
Sentem nos auges de um alento vago,


Olha, cego mortal, e considera
Que és rosa, Primavera, Sol, baixel,
Para ser cinza, eclipse, incêndio, estrago.


Francisco de Vasconcelos (1665-1723)

Anónimo disse...

"Eu poderia suportar, embora não sem dor, que tivessem morrido todos os meus amores... mas enlouqueceria se morressem todos os meus amigos!"
Vinícius de Moraes