terça-feira, 30 de setembro de 2008

As cidades de Nadir

O que me fascina em Nadir é a sua obsessão pelas cidades. Aqui: "Teerão"

João Jales (ver comentário a "Wall Street") lembrou a sua passagem pelas Caldas na única edição dos Encontros Internacionais de Arte que aqui teve lugar. Não assisti ao acontecimento, que deixou um rasto de incompreensão que demorou muito tempo a corrigir ou, pelo menos, a suavizar. Em 2004 estive presente na ESAD à exibição de um filme sobre os Encontros, na posse de um dos organizadores, Egídio Álvaro. Esse facto pode ser recuperado através da reportagem publicada na Gazeta das Caldas.
Os Encontros tiveram lugar em 1977, há mais de três décadas. Seria interessante e útil reunir a documentação existente sobre o acontecimento.

Congresso Viseu-Congrega

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Continuidades e rupturas, séculos XIX-XX



Wall Street

Nadir Afonso

O tempo na cidade

Com a migração de O que eu andei ... para o campo blogspot, tive de remodelar o site Cidade Imaginária. Seleccionei como entrada do mês para a página de entrada  este diálogo entre dois arquitectos urbanistas portugueses:
Gonçalo Byrne:
O que mais se nota quando voas sobre uma cidade são os vazios, as ruas, as tramas... São os sitemas dos espaços entre os objectos que constróem as tais paisagens ligadas ao tempo. Essas paisagens sedimentadas permitem o reconhecimento da cidade: o que é mais e o que é menos antigo. O tempo acaba por ficar impresso.
Álvaro Siza:
O tempo também selecciona... Noto bastante a ansiedade em relação à definição de novos ambientes. A ideia de que as cidades modernas são feias. É uma ideia geral, não é?
Brasília, por exemplo, foi sujeita às críticas mais ferozes pelas mais variadas razões. Passa-se por essa fase porque uma cidade, para se consolidar e ganhar vida própria, precisa de tempo. Recordo-me de ver uma gravura antiga da fundação de Buenos Aires e era um desconsolo... Uma cidade nova horrível que se transformou com o tempo numa cidade maravilhosa, perfeita na sua relação ao longo de um enorme território.
Uma coisa acabada de fazer é sempre uma coisa a que falta muito; a que falta o tempo, as sobreposições, as intervenções.
Gonçalo Byrne, Geografias Vivas. VI Bienal Internacional de Arquitectura de S. Paulo. Lisboa, Ordem dos Arquitectos, 2006. p. 78.

domingo, 28 de setembro de 2008

Sinalética


Há uma Câmara que descrimina desta forma os seus trabalhadores...

Peniche, 2 de Fevereiro de 1786

A década de 1780 foi marcada por convulsões políticas no Novo Mundo. A revolução americana, declarada em 1776, consuma a vitória sobre o exército inglês em 1781. A independência dos Estados Unidos da América é reconhecida em 1783. Em 1780, estala no Peru uma revolta contra o domínio espanhol, conduzida pelo chefe inca, José Gabriel Tupac Amaru. O exército colonial põe-lhe termo no ano seguinte, executando o líder e aprisionando o filho.
Em Abril de 1784, parte de Lima, Peru, com destino a Cadiz, o navio espanhol San Pedro de Alcântara. É um navio de guerra, de 64 canhões. 


Vinha carregado com cobre e metais preciosos, produto da mineração do Peru acumulada nos anos anteriores (durante os quais a instabilidade originada pela guerra da independência americanae o embargo britânico impedira o seu normal escoamento para a Europa). Trazia também um conjunto de colecções de artefactos anteriores à presença espanhola, recolhidas por dois cientistas espanhóis em expedições efectuadas a grutas de uma região do Peru. Finalmente, fazia parte da carregamento do San Pedro cerca de duas dezenas de prisioneiros incas, incluindo o filho do chefe executado, Fernando Tupac Amaru.
O navio zarpou com excesso de peso, enfrentando por isso diversos sobressaltos na sua longa viagem. Quando chegou ao Chile, viu-se obrigado a deixar parte da carga e a regressar ao Peru para reparações. No Rio de Janeiro, já no ano seguinte, foi forçado a uma imobilização de 4 meses, de novo para reparações. A 2 de Fevereiro de 1786, aproximou-se da costa de Peniche e foi embater violentamente contra as rochas da Papoa. Com o choque, o casco do fundo partiu-se e o porão separou-se do resto da embarcação. O mar estava calmo. O comandante do navio foi traído provavelmente pela maré muito baixa e as imprecisões da carta de navegação. 128 pessoas, entre as quais a maioria dos prisioneiros incas, encontrou a morte no naufrágio.
O acontecimento teve uma enorme repercussão internacional e uma extraordinário incidência em Peniche. O governo espanhol não se poupou a esforços para recuperar os tesouros depositados no fundo do mar (calcula-se em cerca de 750 toneladas de cobre, prata e ouro) e contratou mergulhadores e enviou para Peniche equipas técnicas e operários. Durante dois anos, Peniche foi estaleiro destes trabalhos morosos e complexos de resgate.
Depois, lentamente, o tempo foi apagando memórias e sinais.

Em 1975, um arqueólogo francês, Jean Yves Blot, iniciou o longo processo de devolução desta história ao conhecimento. Começou pela investigação de arquivo, onde encontrou abundantes referencias, em Espanha e por toda a Europa. Passou depois ao local, onde a pesquisa se revelou mais difícil. Identificou a zona de impacte e a área onde se tinham procedido a inumação de cadáveres. Organizou campanhas arqueológicas em terra e no mar.
Ontem em Peniche, no Edifício Cultural, Jean Yves, que entretanto implicou no fascínio pelo tema a arqueóloga Maria Luisa Pinheiro, apresentou uma Exposição onde se pode seguir o trajecto e os principais resultados deste longo e persistente trabalho. A exposição é acompanhada pela edição de uma obra intitulada Peniche, Encontro entre Dois Continentes: Concerto para mar e Orquestra. San Pedro de Alcântara, 1786.

sábado, 27 de setembro de 2008

A parede vazia e o gorro de pele (II)

O episódio narrado por Kundera na introdução ao conto "Cartas Perdidas" pode ser lido como uma metáfora do património. Não é original este entendimento. Costumo abrir com ele os trabalhos lectivos na cadeira de "Património Cultural".
De facto, o gorro é o elemento de continuidade do passado, o vestígio que sobreviveu à destruição perpetrada neste caso pelos homens (há testemunhos que desaparecem, por acção do tempo ou da natureza). O vestígio chegou até nós, mas não fala por si. Sem a leitura, a crítica de contexto, a descodificação, atribuição de significado, em suma a interpretação, realizadas com recurso à história e às ciências do património, permaneceria mudo e indecifrado.

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

A parede vazia e o gorro de pele (I)

"Em Fevereiro de 1948, o dirigente comunista Klement Gottwald subiu à varanda de um palácio barroco de Praga para falar às centenas de milhar de cidadãos aglomerados na praça da Cidade Velha. Foi uma grande viragem na história da Boémia. Um momento fatídico, como acontece uma ou duas vezes por milénio.
Gottwald fazia-se acompanhar pelos camaradas e, ao lado, muito perto, estava Clementis. Nevava, fazia muito frio, e Gottwald vinha de cabeça descoberta. Clementis, muito solícito, tirou o gorro de pele que trazia e colocou-o na cabeça de Gottwald.
A secção de propaganda fez centenas de milhar de exemplares da fotografia da varanda de onde Gottwald, de gorro de pele e rodeado pelos camaradas, fala ao povo. Nesta varanda começou a história da Boémia comunista. Todas as crianças conheciam a fotografia, porque a tinham visto nos cartazes, nos manuais ou nos museus.
Quatro anos mais tarde, Clementis foi acusado de traição e enforcado. A secção de propaganda fê-lo desaparecer imediatamente da história e, como é evidente, de todas as fotografias. A partir daí, Gottwald está sozinho na varanda. Onde ficava Clementis, há apenas a parede vazia do palácio. De Clementis restou o gorro de pele na cabeça de Gottwald".
Milan Kundera, "As Cartas Perdidas", in O Livro do Riso e do Esquecimento, 1978 [9ª ed. portuguesa, D. Quixote. 2001]

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Futuro do ensino de Animação Cultural

Na primeira fase do concurso nacional de acesso ao ensino superior público, no curso de Animação Cultural, a funcionar na Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Leiria, foram preenchidas 14 das 30 vagas disponíveis. Espera-se que a segunda fase permita inverter esta tendência e assegurar a continuidade do curso. Mas, se este sobressalto fosse tomado como uma chamada de atenção para o enquadramento do curso, teríamos aqui uma ocasião para repensar o ensino da gestão cultural e a sua correcta inserção na oferta educativa do Instituto. Onde faz sentido localizar a oferta de formações relacionadas com a produção e gestão cultural? Nas escolas de educação ou nas escolas de artes?

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Esquinas, a cidade como encruzilhada

"Quando me pediram para realizar uma exposição sobre as cidades, pensei de imediato que não iria reincidir numa apresentação temática dos "problemas" urbanos (infraestruturas, habitação, periferias, renovação, etc.),  evitando igualmente fazer uma leitura tecnocrática (que falasse, por exemplo, de fluxos, mutações, reflexos ou margens). Pensei, antes, em dar a ver a cidade de forma muito concreta, material e tangível, algo que que valorizasse mais os sentidos do que a abstracção, muito mais o lado político que o lado mecânico. Pensei então no interesse figurativo das esquinas, na condição da esquina como paradigma da diversidade urbana, arquitectónica, cívica e cultural.
A diversidade cultural é um facto urbano. No mundo contemporâneo, onde mais de 80% da população vive em cidades (e a restante não tardará a deixar-se assimilar por elas, a única garantia que permite transformar a solidão em intercâmbio e a ignorância em progresso).
Para mostrar a diversidade cultural não é necessário imaginar um mosaico de exotismos, mas apresentar as cidades como o lugar de cruzamento e mistura, lugar plural e contraditório por excelência, longe das simplificaçôes que muitas vezes fazemos."
Manuel de Solá-Morales, Comissário da Exposição Cidades, Esquinas, (Barcelona, 2004)


Alvaro Siza, Boujour Tristesse, Berlim, 1980-1984.

terça-feira, 23 de setembro de 2008

Mercado sem produtos

Conversa solta de quem há muito não se encontra. Diz a certa altura o meu interlocutor: há cerca de 2 meses estava a jogar com mais de três milhões de euros no mercado de derivados, sem que verdadeiramente existisse algum euro nas transacções. Explique-me, pedi eu.
- Imagine que um Banco chega junto de si e lhe diz que o seu crédito à habitação deve estar protegido contra os aumentos das taxas de juro e que, por isso, lhe vai fazer um empréstimo pelo montante igual ao valor do seu crédito. Diz-lhe ainda que trimestralmente (ou semestral ou anualmente) lhe irá creditar os juros dessa aplicação e, simultaneamente, debitar os juros do empréstimo que lhe facultou.
O professor "compra" 250.000 euros a uma taxa fixa, por exemplo Euribor do dia a 6 meses, e em seguida o seu Banco apresenta-se no mercado com 250.000 euros que "venderá" a uma taxa superior ou inferior àquela que contratou. Se no fim do período acordado a taxa obtida no mercado estiver mais alta, o Professor recebe a diferença, se estiver mais baixa, paga a diferença.
À primeira vista, parece razoável. Mas sucede que o Professor agravou a sua situação financeira pessoal, pois não sabe se as taxas vão subir ou descer e corre o risco de não receber qualquer rendimento da sua aplicação e ainda ter de pagar se as coisas não correrem bem.
Como é que funciona este mercado de derivados (CDS - Credit Derivatives Swaps)? Aí estão à venda ziliões de créditos, com taxas negociadas ao minuto. Sem qualquer mecanismo de controlo, é deste jogo que resultam as subidas ou descidas de taxas de juro. O movimento financeiro é imenso. Para o negócio não cair como um castelo de cartas, é preciso manter esse movimento.
Os intervenientes neste mercados são de facto apostadores. A aposta é simples: os juros vão subir ou vão descer? Se não, repare. O professor fez uma aplicação num mercado de um montante que não tem (os tais 250.000 euros), através de um Banco que também o não tem. No mercado onde ele vai ser transaccionado, não existem, igualmente, esses 250.000 euros. É um mercado virtual.
Se uma autoridade entrar neste mercado e quiser ver a liquidez das operações, tudo se desfaz: não existe dinheiro nem verdadeiramente existiu jamais, mas apenas comissões, ordens electrónicas e expectativas. A bolha estoira!

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Explicações

Acorreram todos este fim de semana aos mais influentes órgãos de comunicação. Vieram explicar que não, que não foi da desregulação da economia americana a responsabilidade. Foi da ganância dos povos (e, em especial dos pobres) e outras explicações universais. O mercado está a funcionar (funciona sempre) e vai repor as coisas no são.
O mercado aceitou negociar sem produtos. As pessoas (gananciosas, claro) viram as suas aplicações volatilizarem-se em poucos dias. Este mercado a funcionar reporá confiança nas suas vidas?

O luto mais impiedoso

A morte de um filho.

No alfarrabista (I)

Pequena mas interessante colheita: um número [3, 1947] da revista Formes et Coleurs, Revue Internationale des Arts, du Gout et des Idées, editada em Lausanne, dedicada ao tema O Mar ["Hauts Lieux Méditerranéens", "Le Navigateur et le Ciel", "Le Nu et la Mer", "La Mer et le Génie Anglais", etc.], 6 números da revista A Arquitectura Portuguesa e Cerâmica e Edificação [1952-1955].


Cerâmicas de Vitor Palla
[A Arquitectura Portuguesa..., nº 3/4, Abril de 1953]




















Henri Matisse, "Devant la Mer" [Formes et Couleurs..., 3-1947]

domingo, 21 de setembro de 2008

Manuel de Oliveira

Vi (e nalguns casos revi) tudo o que Serralves nos mostra de e sobre Manuel de Oliveira. Prestei especial atenção à entrevista conduzida por João Bénard da Costa (o comissário da exposição), aos excerptos de filmes organizados em função de uma leitura dos métodos narrativos do cineasta e sobretudo aos documentários. Douro, Faina Fluvial (1931), que não conhecia, é uma obra inesquecível.

Imagens do Porto

Um janela sobre as cidades: Porto e Gaia.

[Hotel da Bolsa, 19 de Setembro de 2008]

Voltar ao Porto

Reencontrar a cidade e as marcas que nela deixamos. Redescobrir as marcas que em mim ficaram.

[Praça Humberto Delgado, Dezembro de 2006]


Teresa Perdigão

Enfim, a Teresa decidiu-se a partilhar o seu olhar de antropóloga e de mulher sobre o território e as pessoas. Podemos agora acompanhar com o nosso o seu fascínio pelas culturas que nos identificam e pedir-lhe ajuda para tentar perceber o que se perde e o que se muda.

15 de Setembro

É certo que os ritmos de vida e trabalho se diversificaram e os calendários se comprimiram. Mas os professores sempre se regem por anos lectivos e 15 de Setembro assinala um novo ano.
O que eu andei ... nasceu dentro da Cidade Imaginária [www.cidadeimaginaria.org]. Ganha hoje autonomia, sem cortar as ligações com o sítio onde nasceu. É por isso que este primeiro post recupera o último do seu local de origem:

Yesterday (na cidade imaginária ouvem-se os Beatles e identificam-se imagens)

Alan Aldridge coordenou em 1969 e 1971 a edição de dois volumes sob o título The Beatles: Illustrated Lyrics. A obra é constituida pelos poemas das canções cantadas pelo grupo acompanhadas de imagens alusivas. Na página 87, "Yesterday", uma composição de Paul McCartney, é ilustrada com uma fotografia de David Bailey (fotógrafo inglês, nascido em 1938, que registou imagens dos Beatles e de outras figuras muito conhecidas, tendo inspirado a personagem do fotógrafo de moda do filme "Blow-up" de Antonioni (1966). Bailey associou "Yesterday"(originalmente Scrambled Eggs) a um prato com um ovo estrelado que fora utilizado como cinzeiro. A fotografia foi também publicada por Luis Pinheiro de Almeida e Teresa Lage, Beatles em Portugal (Assirio & Alvim, 2002, p. 32). Estes autores contam que Paul McCartney esteve em Albufeira em Maio de 1965, onde terminou a composição de "Yesterday", que viria ser gravada em 14 e 17 de Junho do mesmo ano. Não informam, porém, se a fotografia foi tirada durante esssa estadia. O livro de Aldridge (que consultei por empréstimo de João Jales) também não identifica o local onde foi realizada. Mas há particularidade da imagem que merece destaque: o prato, uma peça de faiança branca que foi produzida pela Fábrica Secla das Caldas da Rainha.