quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Pelos montes e vales de Tormes ou as emboscadas da navegação por satélite

Ontem à noite todos me confirmaram o fundamento do conselho do Presidente F. Ruas: o melhor percurso de Guimarães a Viseu é agora por auto-estrada (A4 e A24). Agendada a reunião no Museu Almeida Moreira para as 14h30, combinei almoço com P. Simões para as 13. Calculei 1h30 de viagem e saí de Guimarães às 11h30.
Parei o carro à saída de casa para proceder à operação de montagem do gps. Enviei um sms ao Pedro: "Vou estrear o presente de Natal que me deste. Estou a seguir as instruções". Alguns segundos depois de ligado ao isqueiro do carro, o pequeno ecran do aparelho já tinha identificado o ponto de partida. Tive um sobressalto quando uma voz feminina me informou que iria entrar numa rotunda dali a 50 metros e devia tomar a segunda saída à direita. Dez minutos mais tarde, estava na A7 em direcção a Vila Real. Já me habituara à voz feminina com as suas entoações. Liguei o rádio. Emiti um sinal interior de aprovação ao navegador tecnológico.
Uma dezena de quilómetros depois, ele deu-me instruções claras de que devia sair para Vizela. Confesso que ainda duvidei por alguns instantes. A saída não indicava A24, como me tinham assegurado. Mas que motivos fortes eu tinha para ignorar um conhecimento regulado por satélite?
De modo que caí na cilada, como me apercebi vinte minutos mais tarde, quando se tornou claro que eu rumava lentamente atrás de 2 camiões na estrada para Mesão Frio. Não tinha encontrado o mais leve rasto da A24, depois de uma breve passagem pelo IP4. A voz feminina tornara-se omnipresente. A todo o momento mandava virar à direita ou à direita. Quando finalmente comecei a descer para o Douro, o pequeno ecran alterara radicalmente as previsões da hora de chegada a Viseu: em vez das 13h10 indiciadas à saída de Guimarães, surgiam agora umas ameaçadoras 13h50. Parei o carro e reprogramei o navegador, assegurando-me que era Viseu o destino que assumira. Ele reconfirmou todas as más notícias.

Foi então que, olhando com mais atenção a paisagem ao fundo, eu percebi onde estava: em Resende, a caminho da ponte da Ermida. Ou seja em terras de Eça de Queirós. Parei o carro junto desta ponte a cuja inauguração assisti já lá vai mais de uma década e que revi mais recentemente, numa saudosa e belíssima jornada de homenagem ao escritor que imortalizou Tormes. Registei em fotografia o rio Douro lamacento e telefonei aos meus pacientes interlocutores de Viseu a preveni-los do atraso. Cumprimentei Jacinto com um sorriso irónico, dei um abraço cúmplice a Zé Fernandes e saudei Joaninha eterna senhora minha.

Encontrei a A24 muitos quilómetros e minutos depois, vencendo o Montemuro, agora paisagem de geradores eólicos. A chuva dos últimos dias fizera abater sobre a estrada pedras, terras e pequenas correntes de água. Numa curva mais apertada fui forçado a parar, em nome do princípio da precaução, perante dois bovinos indecisos quanto à direcção a tomar.
Cheguei a Viseu, sob um temporal desfeito, eram quase 3 da tarde. Solidário, o Paulo providenciara-me uma sandes dupla.

O quarto de Picasso imaginado e pintado por Nikias Skapinakis

A VARANDA DE PICASSO NA CÔTE D'AZUR
A composição do quadro refere-se às Paisagens - Naturezas Mortas de Picasso realizadas em 1919 na Côte d'Azur. A pintura encostada à mesa baseia-se num "graffiti" de um "tagger" e mostra a circulação da sinalização picassiana na cultura popular do presente (2005).


Nikias Skapinakis, Quartos Imaginários. Lisboa, Edições Gémeo, 2006. p. 73.

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

No Sábado, apesar do frio, na Lagoa de Óbidos


O Presidente e o Parlamento

É certo que o Presidente, na ausência de uma maioria parlamentar de Governo, tem menos margem para utilizar o veto político nos diplomas oriundos da Assembleia. Mas que razões tinha o Partido Socialista para esperar que o Presidente vetasse a lei que adiou por um ano a entrada em vigor do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social? A promulgação era não só expectável (como agora se diz) em face das reservas que sobre a entrada em vigor do mesmo Código o Presidente manifestara   antes das eleições (vide comunicado da Presidência), como consistente com a prática de um Presidente parlamentar. Não foi essa a tese que o Partido Socialista advogou e elogiou em Cavaco Silva na última legislatura?

segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Escrevo, penso, leio...

Escribo
pienso
leo
traduzco veinte páginas
oigo el informativo
escribo
escribo
leo.
Dónde estás
dónde estás.

Idea Vilariño


http://amediavoz.com/vilarino.htm

domingo, 27 de dezembro de 2009

Bibliografia

Guimarães
Catálogo da Exposição da Imprensa Periódica Vimaranense (1822-1953). Guimarães. Câmara Municipal, 1953.
Ivo Martins, Vera Velez, Pedro Silva (coord.), D. Afonso ®. Guimarães, Câmara Municipal/A Oficina, 2009.


Manuela de Alcântara Santos, Ourives de Guimarães. Ao serviço de Deus e dos Homens. Guimarães, Museu Alberto Sampaio, 2009.


Maria Adelaide Pereira de Morais, O Palácio de Vila Flor em Guimarães. Porto, Instituto de Genealogia e Heráldica da Universidade Lusófona, 2009.
Revista de Guimarães. Volume Especial Comemorativo dos Centenários da Fundação e da Restauração de Portugal. Guimarães, Sociedade Martins Sarmento, 1940.
Said Jaladi (coord.), Guia de Turismo Científico de Guimarães. Guimarães, 2009.

Culinária
Edmond Neirick, Jean-Pierre Poulain, História da Cozinha e dos Cozinheiros. Sintra, Colares Editora, 2006.
Isabel M. R. Mendes Drumond Braga, Os Menus em Portugal. Para uma História das Artes de Servir à Mesa. Lisboa, Chaves Ferreira Publicações, 2006.

M. Margarida Pereira-Müller, Cozinha Árabe. História e Receitas. Sintra, Colares Editora, 2009.
Shelag e Jonathan Routh, Notas de Cozinha de Leonardo da Vinci. Lisboa, Arte Mágica, 2002.

Queirosiana
Ana Margarida Dinis Vieira, As Vertentes do Olhar na Ficção Queirosiana. Lisboa, Nova Vega, 2008.

Beatriz Berrini, Eça e Pessoa. Lisboa, A Regra do Jogo, 1985.
Edgard Marques, Interpretação Espiritual de Eça de Queirós. Estudo Biográfico. Lisboa, Guimarães Editores, s/d.
Eloy do Amaral, O Amor de Eça à Terra Portuguesa. Coimbra, Livraria Atlântida, 1945.
Joel Serrão, O Primeiro Fradique Mendes. Lisboa, Livros Horizonte, 1985.
Júlio de Oliveira, Ramalho Ortigão e Eça de Queirós. Rememoração e Esclarecimento de Factos de Ordem Literária e Jornalística. Porto, 1945

sábado, 26 de dezembro de 2009

sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Carta de um professor "cansado e um pouco desesperado"

Ouvi Ariane Mnouchkine* chamar-nos "heróis da cultura" e é verdade que precisamos muitas vezes  de coragem para tentar instilar nos cérebros das nossas crianças o fermento da cultura, da ciência e da poesia, o grão do civismo e da reflexão. É igualmente verdade que por vezes travamos este combate em vão e que os panos destinados às nossas classes saem mal cortados, pouco preparados para se adaptarem às mudanças do mundo contemporâneo, menos ainda para as pensarem. Poderão até - se acaso encontrarem aplicação - ser por esta consumidos ou esmagados sem resistência. Alguns salvar-se-ão, certamente. Mas esta escolha - esta selecção - apresenta cada vez mais uma relação directa com a origem social, ao passo que os heróis da cultura estão cansados e um pouco desesperados.
No Le Monde de ontem. 
* Fundadora e directora do Théâtre du Soleil

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Óbidos, 1909

Fonte: Ilustração Portuguesa, 2 de Agosto de 1909.


segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Sector cultural e criativo em 2006

O Ministério da Cultura encomendou um estudo sobre o impacte económico da área cultural e criativa em Portugal em 2006. As conclusões são muito "animadoras" para os novos profissionais da cultura. Vale a pena discutir a metodologia e os pressupostos deste "sector da economia".

domingo, 20 de dezembro de 2009

Caldas da Rainha, 1909



Festas hípicas das Caldas na Ilustração Portuguesa de 6 e 13 de Setembro de 1909.

sábado, 19 de dezembro de 2009

Maria João Seixas


Embora com atraso, as minhas felicitações à nomeada para a direcção da Cinemateca e o meu aplauso a quem a nomeou. Uma excelente decisão da nova Ministra da Cultura.

Caldas da Rainha, 1908


Ilustração Portuguesa, 12 de Outubro de 1908
(clique na foto para aumentar)

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Peniche, 1908


Ilustração Portuguesa, 21 de Setembro de 1908

,

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Gosto de ti como do sol das nossas vidas!...

A 13 de Dezembro celebra-se em Guimarães Santa Luzia, protectora da visão, com uma romaria à pequena capela que tem o nome da santa. Com as penitências, pedidos e promessas, os romeiros colocam na cara um disco de madeira com a representação da face da mártir com os olhos bem marcados.
A festa é ocasião para a troca de um presente constituído por uma caixa de cartão decorada contendo, devidamente acondicionados numa cama de algodão uma passarinha, um sardão e um coração com uma dedicatória amorosa.
Estes objectos são formados por uma massa de centeio coberta de açúcar branco e pequenos quadradinhos de papel prateado.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Vista do alto de uma janela a cidade era um perigo

Estava à varanda da sala de visitas, e atrás o maquinismo da casa funcionava com alegria, a fumaça se exalando do fogão – como uma história antiga. A rua do Mercado cheia, porém, de novas luzes e de novos carros. Lucrécia esperava Mateus, mergulhava o rosto na rua, ai! suspirava no primeiro andar, bondes e carros abafavam a exclamação. Inúmeras buzinas macias ou esgalhadas enchiam o ar do sobrado de ruídos, quase luzes.
Mas através das buzinas abafadas sentia-se o prazer das ruas como fontes de um jardim, o apito do guarda-civil entre os postes: algo mecânico sucedia no mundo. E, atrás, o par de meias secava na cadeira. Ai, suspirava com o rosto coberto de pó-de-arroz, o marido não vinha, ai!, dizia a cara exposta.
E de súbito o som desafinado, um trem descarrilando dentro do relógio da torre, um! – cara de cal – dois! – o incêndio da casa – três eram oito horas e Mateus não vinha! Os olhos estavam secos mas as buzinas soluçavam e da rua subia cheiro de açúcar e vinagre.
Como se transformara o subúrbio! o suor da noite quente colava roupas ao corpo, o perfume exaltado de farinha erguia-se até ao nariz: tudo esperava chuva.
De facto já chovia. Gotas espaçadas de início, e depois, pouco a pouco, mas já incomensurável, o mundo inteiro chovia – por mais longe que se olhasse havia a chuva furiosa e constante, as ruas banhadas se esvaziavam. As luzes refrescadas. Pelos canos as águas escorriam com pressa.
Vista do alto de uma janela a cidade era um perigo.
Carros, de condutores invisíveis, deslizavam n'água e de súbito mudavam de direcção, não se sabia porquê. S. Geraldo perdera os motivos e agora funcionava sozinho. Bondes nos trilhos abafavam outros ruídos, e certas coisas pareciam mover-se inteiramente silenciosas – um carro elegante apareceu tranquilo e desapareceu. Em S. Geraldo nascera uma vida diária que nenhum forasteiro perceberia. Chovia e os tempos eram maus, estava-se em plena crise.
Mas havia uma glória que até então nunca se atingira. Indivisível pelos habitantes. Se acontecia um assassinato, era S. Geraldo quem assassinara. Nunca as coisas haviam pertencido tanto às coisas. Fora para sempre deflagrada uma mola, e a cidade era um crime.
Esta cidade é minha, olhou a mulher. Como pesava.
Poucos minutos depois a chuva cessou. As calçadas molhadas cheiravam alto, restos de peixe da manhã eram arrastados para os esgotos... a padaria já apagara as luzes, as estrelas estavam limpas.


Clarice Lispector, A Cidade Sitiada. Lisboa. Relógio d'Àgua, 2009 [edição original 1949]. pp 99-100-

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Substituição

Uma cerimónia simples, no Palácio de Belém, para o Presidente dar posse ao Professor Rui Vieira Nery do cargo de vogal executivo da Comissão Nacional para as Comemorações do Centenário da República. Pedi a substituição neste cargo, ao fim de um ano de funções, em virtude da manifesta impossibilidade de compatibilizar funções executivas aqui e na Fundação Cidade de Guimarães. Acompanharei todavia as iniciativas da Comissão, ao longo do ano de 2010, ora no plano cívico, ora como investigador participante nalgumas delas.
Grata oportunidade para conhecer a nova assessora para a Comunicação Social do Presidente, Ana Zita Gomes, cujo pai, Rui Gomes, bem conheço, da Câmara e Assembleia Municipal das Caldas da Rainha.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Prado

A exposição de Joaquin Sorolla levou 450 000 visitantes ao Prado. Graças a este êxito, o Museu fechou o ano com o mesmo número de visitantes do ano passado: 2 650 000.

Joaquin Sorolla, Clotilde sentada no sofá, 1901
Se o número total de visitantes não diminui com a crise, em contrapartida mudou o seu perfil. O afluxo de estrangeiros não foi superior aos dos espanhóis, ao contrário do que vinha sendo hábito. Houve mais mulheres que homens a entrar no Prado e o grupo etário dominante foi o dos 25-34 anos.

À janela de Peter Paul Schouten


Paisagens que podem ser vistas aqui.

Regeneração urbana

Até à data nada foi feito para contrariar o divórcio urbanístico entre a cidade das Caldas da Rainha e a Escola Superior de Artes e Design. O campus está hoje mais afastado do centro, devido às barreiras constituídas por uma circular com duas faixas de rodagem em cada sentido e um denso quarteirão habitacional que ocupou os espaços vazios. É mais difícil e perigoso agora ir a pé ou de bicicleta para a ESAD. Em suma, caminhou-se no sentido inverso do que seria desejável.
Há três anos que, com reduzido eco, venho alertando para esta situação e insistindo com todas as instituições e responsáveis políticos envolvidos na necessidade de corrigir e inverter esta tendência de segregação e fragmentação urbanas.
Entre as diversas medidas que podem ser sugeridas, creio que uma se torna cada vez mais oportuna: criar no centro da cidade um espaço de que a escola possa fazer montra e extensão, onde os alunos possam apresentar trabalhos e fazer experiências criativas, onde, em suma, a escola se revele e desvele.
Se a escola é conhecimento e criação, todo o espaço urbano que lhe seja afectado é um contributo para  a melhor regeneração urbana: aquela que se processa com resgate de áreas degradadas para o exercício do talento e da criatividade.

domingo, 13 de dezembro de 2009

À janela de Remmelt Van Veelen





Paisagens diversas. Podem ser vistas aqui. 

Encontro sobre Ferreira da Silva

O Encontro de ontem teve exactamente o estatuto previamente definido: uma troca de pontos de vista sobre o percurso de um artista, Ferreira da Silva, na cidade contemporânea. Não se tratou de um seminário académico, mas sim de um registo de depoimentos e memórias vividas de relações com o autor e a sua obra.

Várias dezenas de amigos e admiradores de Ferreira da Silva passaram pelo Auditório 2 do Centro Cultural e de Congressos das Caldas da Rainha. 18 usaram da palavra para contar histórias, referir factos e sublinhar atitudes, evocar acontecimentos.

O denominador comum das intervenções residiu na singularidade da figura deste artista. Não é um artista de atelier que periodicamente nos mostra o seu trabalho em exposições ou galerias. É um artista que está no meio de nós, que nos interpela, que projecta e constrói à nossa vista, que interage quotidianamente com os seus concidadãos. Em suma, um artista que nos observa e nos interpela, que nos inquieta e questiona, que nos mostra o outro lado das coisas e nos modifica, que nos faz felizes e porventura mais humanos, no contacto com os objectos que espalha à nossa volta.

sábado, 12 de dezembro de 2009

Ofélia


RAINHA
Cresce um mal no encalço de outro,
Tão rápido se sucedem. Afogou-se a vossa irmã, Laertes.
LAERTES
Afogou-se? Como, onde?
RAINHA
Um salgueiro há que cresce atravessado no ribeiro
E as cãs das folhas recorta na corrente espelhada.
Com elas fantasiosas grinaldas teceu ela,
De pães-de-leite, urtigas, margaridas e abelhas-flor,
A que na fala de pastores se dá mais grosseiro nome
E a que as raparigas castas chamam dedo-de-morto.
Aí, nos pendentes ramos, suas coronais de erva
Alçando-se a pendurar, uma haste despeitada se partiu,
E esses troféus de erva e ela mesmo em baixo ruíram
No ribeiro choroso. Em redor se tufaram as roupas
Em que por um momento qual sereia flutuou,
Enquanto entoava esparsas de velhas laudas,
Como alguém inapercebido do seu próprio infortúnio,
Ou como criatura que nativa fora, e adestrada era,
A um tal elemento. Mas não muito tempo passou
Até que os vestidos, com o peso que beberam,
Arrastaram a pobre infeliz desse canto tão melífluo
A uma morte lamacenta
LAERTES
Ah, morreu então afogada.
RAINHA
Afogada, afogada.
LAERTES
Água em demasia possuis tu, pobre Ofélia,
Por isso a mim me nego as lágrimas. Mas
Deste modo somos feitos; a natureza segue o hábito,
Diga o pudor o que disser. (Chora) Quando estas secarem,
Morrerá a mulher então em mim. Adeus, senhor,
Tenho uma fala de fogo que gostaria de acender,
Mas esta minha fraqueza extingue-a.


Shakespeare, Hamlet, 4.7. 
Tradução de António M. Feijó. Lisboa, Edições Cotovia, 2007.

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Obama Nobel

"Não ignoro a controvérsia em torno da atribuição deste prémio."

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Ainda o Ikea

Henrique Cayatte, a quem contava as minhas aventuras no Ikea de Matosinhos:
"Sabe a história daquele quadro alemão de uma multinacional que mudava cada seis meses de local de trabalho? Quando chegava à nova cidade, arrendava o apartamento e indicava à secretária as referências dos móveis com que pretendia mobilá-la. Tudo pelo catálogo do Ikea. Costumava dizer: eu vivo na mesma casa; mudo de vista duas vezes por ano".


Não digo nada sobre a moral desta história. Mas conto que só à segunda tentativa consegui adquirir a mesa e as cadeiras que o catálogo anunciava. Da primeira, o stock do dia estava esgotado. Alguém sabe que fazem os nossos vizinhos galegos da mobília antiga que agora aos fins de semana substituem pela do Ikea? A menos que, como sugere o Paulo Simões, as compras se destinem a satisfazer apenas o prazer de montar e desmontar armários...

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Ikea

2 horas no Ikea de Matosinhos. Mais de metade do parque automóvel tem matrícula espanhola e mais de metade das famílias que enchem o pavilhão falam entre si castelhano. Área metropolitana do Porto ou de Vigo?

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Só por ser humano

Condição


Ergo os braços ao céu, desesperado,
Lama rasteira, nem ao menos posso
Ter a nobreza altiva dos penedos!
Em vez de lanças de granito, dedos
De carne e osso
Num leque de impotência!...).


Com a corda ao pescoço,
peço clemência
a quem, a que tirano?
a nenhum Deus que veja
Ou anteveja...
Peço clemência, só por ser humano.

Miguel Torga, Diário IX.

domingo, 6 de dezembro de 2009

Steiner

Ouvi há uma semana, na Antena Um, um breve resumo da oração que Georges Steiner proferiu na cerimónia do doutoramento Honoris Causa que lhe foi conferido na Universidade de Lisboa. Steiner teria pedido desculpa à audiência por não saber falar português, lamentando não poder ler no original Saramago e Lobo Antunes.
O valor universal da nossa língua reside, de facto, na literatura.

sábado, 5 de dezembro de 2009

Financiamento antes e depois da crise

A julgar pelo que leio na imprensa, os juízes do Tribunal de Contas emitiram um juízo de natureza política sobre a alteração das condições de financiamento da construção de auto-estradas antes e depois da crise internacional. Em tempo de governo minoritário, o Tribunal entrou na corrida da competência concorrencial com a Assembleia da República.
O efeito perverso desta atitude sabê-lo-emos quando a banca for de novo chamada a intervir neste tipo de operações. Alguém duvida que os termos do financiamento serão ainda mais desfavoráveis?

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Presidenciais

Aproxima-se o mês em que os candidatos que queiram condicionar o processo decisório dos partidos têm de avançar e declarar a sua disponibilidade: Janeiro de 2009. As eleições presidenciais serão em Janeiro de 2011. A única dúvida é se o farão imediatamente antes ou depois da votação do Orçamento Geral de Estado na Assembleia da República.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Insólito

Pergunta-me um jornalista do Expresso se tenho memória de uma situação em que Governo e Parlamento legislaram em simultâneo e no mesmo sentido. Respondo que não. De facto, o Presidente acaba de ser colocado na insólita situação de ter recebido para promulgação um decreto-lei do Governo e uma lei da Assembleia da República, ambos revogando as taxas moderadoras para internamentos e cirurgias em ambulatório.
Recordo-me sim, de situações inversas, em que o Presidente teve perante si dois diplomas de sinal contrário, um proveniente do Governo e outro, contrariando este, dimanado da Assembleia. Acompanhei próxima ou directamente alguns deles, como o das "portagens do Oeste". O Presidente questionou na altura  o que poderia ser entendido como uma invasão do legislativo na esfera de competência do executivo, mas o Tribunal Constitucional, ao qual o Presidente solicitou a fiscalização preventiva do diploma da Assembleia, considerou que em determinadas matérias era admissível o que designou por "competência concorrencial". O Presidente, porém, manteve a sua convicção e usou, neste caso, o veto político contra a lei.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Mudança de hábitos?

Diz-me o meu amigo Paulo S. - com fundamento em experiência própria - que a afluência aos shoppings está a diminuir. Trata-se de um efeito da crise sobre os comportamentos das famílias. Os portugueses evitam os centros comerciais onde o apelo consumista é dificilmente controlável e se acaba por adquirir mais do que aquilo que se tinha projectado comprar. Aparentemente, estariam a voltar ao comércio de cidade, guiados por uma procura orientada e precisa. Se assim for, estaríamos a assistir a uma mudança nos hábitos dos consumidores, a qual induz modificações nas atitudes dos próprios cidadãos.

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Nota melancólica no 1º de Dezembro

Dia do orgulho pátrio, invenção republicana, já o foi. Hoje arrasta um destino incerto. O 1º de Dezembro sinaliza a viabilidade portuguesa na Ibéria. O Estado democrático lida mal com este tema e a sociedade civil ignora-o. O debate académico pequena atenção lhe presta e a identidade é problemática que não desperta o espaço mediático.
A União Democrática do Centro, um partido da direita popular suiça, colocou na agenda política o direito de construção de mesquitas com minaretes. A Confederação convocou os suiços a pronunciar-se em referendo. Apesar das sondagens - que como se sabe na Suiça são realizadas por empresas portuguesas - terem verificado um desinteresse geral e previsto uma vitória da abstenção, registou-se uma votação massiva e 57% dos votantes disseram não.
Em França, os efeitos desta interdição teme-se que sejam contaminadores. Depois da questão do uso da burca, agora é a questão dos cemitérios muçulmanos quando a segunda geração de emigrantes quer ser inhumada em solo francês. O Estado laico lida com o multiculturalismo através do referendo ou da lei? Na Europa, a segunda religião é islâmica.

Desassossego e uma certa impaciência

Perante o carácter global da crise, podemos observar diferentes formas de encarar o futuro. Países como a China ou a Índia vêem esse futuro como algo que lhe pertence. Não perdem tempo ou esforço a recriar o passado, ainda que o não esqueçam. Concentram-se no presente e no futuro que se lhes oferece e estão dispostos a ganhar. Todo a gente os reconhece como ganhadores. Na Europa percebe-se desassossego e uma certa impaciência. O sentimento de que o passado foi melhor, mas que não voltará a ser o que foi, enche o futuro de incerteza. Somos mais velhos, menos produtivos e temos dificuldade em modificar o modelo de sucesso que já não está em vigor.. A UE, mais necessária do que nunca, perde relevância aos olhos dos seus cidadãos e do resto do mundo. Nos Estados Unidos, que estiveram à cabeça da mudança tecnológica, que acreditaram no unilateralismo como única potência resultante do desaparecimento da bipolaridade, que está na origem desta crise financeira e económica, este momento é entendido como de emergência nacional e mundial. Estão num processo de revisão de quase tudo: desde o unilateralismo à posição face à mudança climática, passando pelo sistema financeiro e as falhas da coesão social que deixa fora do serviço de saúde 47 milhões de cidadãos.


Felipe González, "Bicentenarios y crisis global" . El País, 28 de Novembro, 2009.