domingo, 31 de maio de 2009

Ultimos mandatos

Muitos dos candidatos às eleições autárquicas deste ano enfrentarão o desafio de um derradeiro mandato. Por efeito da aplicação da lei que condiciona o número de mandatos, alguns candidatam-se a um terceiro mandato, mas outros propõem-se desempenhar um quarto, quinto ou sexto mandato. Para estes, com uma longa permanência no cargo, a situação em que pedem aos eleitores a renovação de confiança é singular. No dia seguinte à reeleição deixam de poder ser sancionados. Sabem que o eleitorado já não deliberará de novo sobre a sua prestação. Serão presidentes mais livres? Ou menos responsáveis?

sábado, 30 de maio de 2009

No Armazem das Artes

Em Alcobaça, no Armazém das Artes: a história da Primeira República, entre a memória e a política, de 1945 a 1976.
Oportunidade também para rever amigos, em primeiro lugar José Aurélio.

Caras para a Europa

Depois de "Nós Europeus" e "Mais Europa" - baseados na tese porventura inverificável de que a palavra Europa mobiliza a cidadania - o PS colocou finalmente na rua cartazes com as fotos dos seus candidatos. É esta agora a orientação dominante do marqueting eleitoral: as caras dos candidatos (no caso dos de Nuno Melo e Miguel Portas acrescidas, de alteregos, respectivamente Paulo Portas e Francisco Louçã). Parece-me que o fenómeno da personalização numa campanha para o parlamento europeu nunca atingira tal dimensão.

Tango acordeão

Recolheu-se, entre aplausos, a orquestra "Silêncio". No entanto, à saída, O'Neill interpelava, sardónico, alguns soixantehuitards que trotavam, em solilóquio interminável, rua Voz do Operário acima:

Não o amor não tem asas
se tem asas são as mãos
que se enlaçam para a festa
maravilhosa do corpo
e entre elas o coração

coração acordeão

Alexandre O'Neill, Coração Acordeão. Lisboa, O Independente, 2004.p. 13

sexta-feira, 29 de maio de 2009

Lembrança de Astor Piazzolla

Uma noite diferente e inesperada: Festival Internacional de Tango de Lisboa, na Voz do Operário, com convite da embaixada da Argentina (um dos primeiros Estados a reconhecer a nova República Portuguesa em 1910).


Astor Piazzolla, Libertango

Só posso pensar no mar

Começo agora a entrever o porquê destas substituições inconscientes e inevitáveis e empreenderia explicar-lhas se o flagelo de calores a que o Algarve vai sucumbindo me não delisse a vontade. É que é pavoroso e toda a inventiva se esvai na tarefa de lhe mitigar os horrores! Sonho a delícia de me sepultar, vivo, dentro de uma amorangada melancia... Vale-me a presença do mar e só posso pensar no mar... Que grande castigo seria passar sem ele! Eu não vivo contente em sítio donde lhe não veja luzir o azul por entre as árvores... É um segundo céu mais sugestivo por certo do que o outro. A gente do sertão não tem mais do que um céu, e o mais pobrezinho... A proximidade do mar é o único lenitivo possível à torreira do sol e a aragem que ele bafeja torna-se a benção do Verão. Era dever meu, preferindo tudo, celebrar condignamente o gosto de comer fruta dentro dum bote, à sombra do toldo branco, no mar do Algarve, e encarecer esse mar nos seus múltiplices aspectos e nas risonhas cenas de que é o duradoiro teatro iluminado, mesmo quando feito ria, na calma dos estuários monótonos.
[Portimão, Julho de 1901]

M. Teixeira Gomes, Agosto Azul. Obras Completas, vol I. Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 2009. p. 389-390.
Rosa Nunes, Janela oceânica.

Vinho novo

Inauguração, no final da tarde quente, da XII Feira do Vinho do Ribatejo, em Alpiarça. Jantar na Casa dos Patudos, onde me coube a mesa Bordalo Pinheiro: bons amigos, partilhando o interesse pela instituição que José Relvas originou, colaborações diversas no estudo e valorização da sua obra, admiração e estima pela Presidente da Câmara e vereadora da Educação e Cultura, Vanda Nunes. E o prazer da conversa animada por 6 (seis!) vinhos novos do Ribatejo.
Confirmo que o novo vinho, obtido a partir dos modernos processos e com recurso a castas recentemente introduzidas, se vai substituindo ao gosto antigo e ganhando um espaço revigorado.
António Almeida Santos, jovial e afectivo, elegante e culto, na mesa Malhoa,  trouxe um brilho peculiar ao convívio alpiarcence de ontem à noite.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

A vitória de Pep Guardiola

Curiosa coincidência. Figo considerou agora terminada a sua carreira de futebolista. Pep Guardiola tinha sido a força moral do Barça, quando Figo e o Real Madrid lhe desferiram um dos mais duros golpes de sempre. Ontem teve a sua noite gloriosa.

À janela de Rosa Nunes

Janela de pedra. Falsa janela com rasgão de azul.
Antónia Rosa Coelho Soares é arqueóloga e exerce funções no Museu de Arqueologia e Etnografia de Setúbal. Rosa Nunes é o nome com que assina fotografias que podem ser vistas no seu blogue - escrita de luz - nesta galeria, nesta e nesta.

quarta-feira, 27 de maio de 2009

À espera do Verão

Parece que chega hoje o Verão. A Margarida Araújo, minha fotógrafa preferida, encontrou, em Santa Cruz, um bom poiso para quem queira esperar por ele.

terça-feira, 26 de maio de 2009

Sindicatos e voto

A prática sindical em cuja formação, após o 25 de Abril, participei entendia o sindicalismo como apartidário. Recusava a tese dos sindicatos correias de transmissão de partidos admitida pelos partidos comunistas e institucionalizada nos países socialistas de partido único. Combatia a visão do sindicalismo como uma espécie de segunda linha da vanguarda a que estivessem confiadas as tarefas de enquadramento e disciplina reivindicativa das massas. Entendia o sindicalismo como uma plataforma de participação autodeterminada e crítica dos trabalhadores.
Ouço na rádio, às 9 da manhã, um dos principais dirigentes sindicais dos professores explicar que a oportunidade da greve de hoje se prende com o período eleitoral. Aos sindicatos compete contribuir para a clarificação das escolhas que os professores eleitores deverão adoptar. Os sindicatos estão assim reduzidos à função de sindicatos de voto.

segunda-feira, 25 de maio de 2009

Abstenção: uma bola de neve?

E se à força de tanto repetir que no próximo dia 7 se espera uma diminuta votação, afinal estivéssemos a contribuir para sublinhar e legitimar a vitória antecipada da abstenção?

domingo, 24 de maio de 2009

Dentro de caixas de vidro

Agora tinha os pés completamente mortos, os joelhos funcionavam como dobradiças velhas, os rins só actuavam quando lhes apetecia, mas o coração persistia teimosamente em continuar a bater. O passado e o futuro eram a mesma coisa para ele, uma esquecida e outra não recordada; não tinha mais noção da morte do que um gato. Todos os anos, no Confederate Memorial Day, agarravam nele e levavam-no para o Capitol City Museum, onde era mostrado da uma às quatro num quarto bafiento cheio de fotografias velhas, uniformes velhos, artilharias velhas e documentos históricos. Tudo isto estava cuidadosamente guardado dentro de caixas de vidro, para que as crianças não lhes pusessem as mãos em cima. Ele envergava o uniforme de general oferecido na memorável estreia do filme em Atlanta e sentava-se, com um olhar carrancudo completamente fixo, dentro de uma área pequena cercada por cordas. Não havia nada que indicasse que estava vivo a nãos er um movimento ocasional dos olhos cinzentos já enevoados, mas uma vez, quando uma criança mais atrevida lhe tocou na espada, o seu braço saltou para a frente num instante e tirou a mãozinha dali com uma sapatada. Na Primavera, quando as casas antigas abriam para peregrinações, era convidado a vestir o uniforme e a sentar-se nalgum lugar mais conspícuo, para dar atmosfera à cena. Algumas dessas vezes limitava-se a sorrir raivosamente aos visitantes, mas noutras falava do evento e das raparigas bonitas.

Flannery O'Connor, "Um encontro tardio com o inimigo", in Um Bom Homem É Difícil de Encontrar. Lisboa, Cavalo de Ferro, 2006, p. 155-156.

sábado, 23 de maio de 2009

MANIFesta

Esta edição da MANIFesta veio até Peniche, o que me pareceu uma boa decisão, tanto da parte das entidades promotoras, como da Câmara que apoiou a iniciativa. Estive nas edições anteriores de Tondela, Amarante e Serpa. Reflectindo a evolução das preocupações dos intervenientes nos processos a que dá expressão, e edição de Peniche parece ser mais rica nas matérias que propõe a debate e menos rica na feira de produtos. As Iniciativas Locais de Emprego que constituíam o núcleo dinamizador da ANIMAR (congrega associações de desenvolvimento local), com a sua atenção virada para o artesanato e o património, retomando e revalorizando actividades tradicionais, viram o seu espaço hoje determinado pelos temas do empreendedorismo e do negócio. As vedetas de Tontela e Amarante foram a "In Loco", uma associação algarvia beneficiária do saber e da experiência de Priscila Soares e Alberto Melo, e as Capuchinhas de Montemuro, que em Vale Benfeito realizavam, com o apoio de designers de têxtil e moda uma renovação dos antigos tecidos e cortes serranos e, simultaneamente, davam vida a um projecto teatral envolvido na recriação de imaginários locais. Em Peniche discutiu-se sobretudo inovação social e políticas territoriais, agora que a crise global aí está, na sua dimensão mais brutal, e o programa Equal vai chegar ao fim, deixando saudades, e sobre o QREN se avolumam dúvidas e algumas desconfianças. Não ouvi Vieira da Silva, que, ao que me contaram, não se mostrou tão entusiasmado, como muitos esperariam, com os resultados dos processos de inovação social induzidos pelos processos locais, mas ouvi Jorge Lacão abordar com seriedade e convicção os problemas da igualdade de género e assisti a um seminário intitulado "Inovar para o desenvolvimento sustentável do território". Falei com muita gente e muito com alguns amigos que já não via há muito ou que, embora vendo, não tivera oportunidade de incluir numa conversa distendida. Um certo espírito de tertúlia foi recuperado nesta MANIFesta, o que foi sem dúvida agradável. Peniche, com o seu novo semblante aberto e acolhedor e a sua noite amigável foi um excelente anfitrião. O tempo não ajudou, obrigando ao cancelamento do concerto dos "Deolinda". Mas não perdi a orquestra "Nova Geração", no palco do Stella Maris, multicor e comovente.

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Bénard da Costa

Era dos principais animadores do Tempo e o Modo que resistiu à fase da viragem à esquerda da revista  no final da década de 60 quando me apercebi da sua existência. Alguns dos meus amigos tinham sido seus alunos no Liceu Camões e não hesitavam em lhe atribuir o qualificativo de "o melhor professor que tivemos". Há tempos estive a rever a entrevista que João Bénard da Costa fez a Manoel de Oliveira onde todo o seu extraordinário saber cinéfilo e sobretudo a sua apuradíssima sensibilidade para a estética do cinema se revelam. Os seus livros de crónicas sobre filmes e actores são obras de consulta e de releitura.
Dirigiu o jornal de campanha do candidato presidencial Jorge Sampaio em 1995. Foi nessa altura que verdadeiramente nos conhecemos. Trabalhei com ele em múltiplos 10 de Junho. João Bénard sucedeu a António Alçada Baptista em 1998 na presidência da Comissão do dia 10 de Junho durante o dois mandatos do Presidente, de quem aliás era amigo pessoal. Os discursos que proferiu nesses dias são peças de antologia de uma retórica feita de alusões literárias, de referências cinéfilas, de observações políticas elegantes, de discretas embora pertinentes invocações filosóficas. 

quinta-feira, 21 de maio de 2009

Na Escola Sebastião da Gama

Quando chegámos perto da escola, tive a impressão de já ali ter estado. Reconheci depois esse tempo já distante: um princípio de tarde chuvoso de Fevereiro de 1987, quando o cortejo fúnebre de Zeca Afonso saia do ginásio da Escola Sebastião da Gama em Setúbal.
O edifício é de 1955, como o atesta a assinatura da pintura parietal da autoria do pintor setubalense Luciano dos Santos (1911-2006), destinando-se inicialmente a Escola Técnica.
Numa das paredes laterais do pórtico do átrio, uma laje negra chama-me a atenção. Nela estão inscritos nomes dos que "responderam ao chamamento da pátria": antigos alunos da escola mortos, como militares, nas guerras de África. O primeiro de 1967, o último de Janeiro de 1974

quarta-feira, 20 de maio de 2009

A Primeira República vista da Segunda

Hoje à noite, no Centro Cultural e de Congressos das Caldas da Rainha: uma tentativa de perceber não só o que diferencia - e que é muito - os dois regimes, mas sobretudo de que forma a memória do que se passou entre 1910 e 1926 esteve presente nas decisões tomadas pelos actores políticos, entre 1974 e 1976, acerca da configuração do novo regime democrático.
De manhã, às 10 horas, na Escola Secundária Sebastião da Gama, em Setúbal, integrada num ciclo de palestras sobre a História Política do Século XX,  intervenção sobre "Os regimes constitucionais de 1911 e 1976 numa perspectiva comparada"

terça-feira, 19 de maio de 2009

Fim de tarde

A lezíria entrou agora no seu máximo esplendor. A natureza responde ao trabalho secular do homem e desdobra-se em promessas.  Um viajante atravessa Alpiarça a caminho de Almeirim ao pôr-do-sol, em busca de continuidades. Respondem-lhe pássaros em voo baixo e um vento fresco que corre ao longo do rio.

segunda-feira, 18 de maio de 2009

Manuel Cipriano Gomes

Abertura no Museu de Cerâmica da Exposição sobre Manuel Cipriano Gomes, Manuel Mafra. Um ceramista profundamente inovador, no que o conceito também tem de descoberta de processos por cópia e imitação. Uma intuição rara para o processo de composição cerâmica, onde jogam cores, formas e interacção dos elementos da perspectiva e do relevo. Se a cerâmica é uma arte que se desenvolve na fronteira ténue entre a previsão e o acidente, uma arte de condicionamento de um certo tipo de acaso, Mafra foi um experimentador bem sucedido, um ceramista percursor da cerâmica moderna.
Esta Exposição tem o mérito de repor no seu verdadeiro lugar uma figura que se reporta à grande cerâmica europeia da segunda metade do século XIX, que fez entrar as Caldas nesse circuito. Para trás fica, espero que definitivamente, a tentativa injustificada de colocar Manuel Cipriano no roteiro da olaria oestina, à qual realmente não pertence nem nunca pertenceu.
Nas peças que agora podem ser apreciadas no Museu de Cerâmica, o visitante vai ser surpreendido pelo ritmo, pelo humor, pela ternura, pelo virtuosismo, pela acuidade de observação, pela imaginação, pelo bom gosto, pelo ilusionismo, pela teatralidade, pelo colorido das peças de Manuel Mafra.
Um palavra de apreço pelas afirmações adequadas e sensatas da Secretária de Estado da Cultura. Uma palavra de incomodidade pela estranha (e errada e injusta) omissão do facto de esta exposição se integrar na Festa da Cerâmica Caldas 2009. 

domingo, 17 de maio de 2009

Incerteza e risco: a redução de desastres


As Nações Unidas, através da agência internacional para a Redução de Desastres (UNISDR, United Nations International Strategy for Disaster Reduction) acaba de publicar um importante relatório sobre o tema: Global assessment report on disaster risk reduction: risk and poverty in a changing climate.
Outros documentos sobre a questão podem ser consultados aqui e aqui.

Mas

A estima pessoal e o apreço pela figura cultural e cívica não estão em causa. Dúvidas e perplexidades sobre a vontade e a oportunidade políticas de Manuel Alegre acumularam-se desde o momento em que decidiu apresentar a sua candidatura presidencial. A decisão recente de depor as armas é perfeitamente compreensível, mas só dá razão àquelas minhas dúvidas e perplexidades. 

sábado, 16 de maio de 2009

Peras de Louça

Fábrica de Faianças das Caldas da Rainha, Prato com peras, 1905
A convite da Confraria da Pera Rocha, formulado pelo Eng.º Torres Paulo, aceitei o desafio de fazer a "oração de sapiência" do encontro anual da organização. Escolhi como tema a representação da pera na cerâmica naturalista caldense, desde Manuel Mafra aos nossos dias. Aproveitei para dar um breve salto à pintura de natureza-morta de Baltazar Figueira e sua filha Josefa de Óbidos, da segunda metade do século XVII.
No enquadramento do anfiteatro de ar livre do Museu do Hospital e das Caldas, animado pelo coro dos Pimpões, espero que esta incursão das artes decorativas na gastronomia não tenha parecido despropositada nem ociosa.
Josefa de Óbidos, Natureza morta com frutos e flores, cerca de 1670

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Em Lisboa e Atenas

O 25 de Abril em Lisboa e Atenas.
De Nikias Skapinakis, o pintor ontem revisitado pela mão de Jorge Silva Melo (que também me facultou a reprodução digital deste quadro).
Para o Vasco Trancoso, que hoje recebe uma merecida distinção por décadas de serviço público e dedicação à cidade.

Skapinakis por Jorge Silva Melo

Presença na Cinemateca: Nikias Skapinakis, o Teatro dos Outros, de Jorge Silva Melo.
O filme (o autor chama-lhe documentário) com imagens belíssimas dos telhados de uma Lisboa envelhecida, onde há mansardas e janelas, gatos e homens que espreitam o céu, uma palmeira, ruas quase desertas, que o pintor, Nikias, avista do seu atelier (o antigo atelier de Columbano). Estas imagens a preto e branco, metáfora de um país sombrio condenado ao cinza pelo salazarismo, ecoam pela pintura de Skapinakis, essa sim a cores. Esse contraste, esse jogo que Jorge Silva Melo, manipula com a técnica do flash-back, revela os contrastes, as afinidades, as continuidades e as mudanças de direcção da obra do pintor. O ponto de partida, é também ele, um exercício magnífico de subtileza e interpretação: um conjunto de quadros apresentados por Nikias em 2006 na Fundação Arpad-Vieira da Silva intitulada "Quartos Imaginários", cada uma das telas dedicada a um pintor.
O ciclo "Retratos de Artistas" de JSM prossegue na próxima Segunda-Feira com Álvaro Lapa: a Literatura, e na Sexta, com Conversas com Glicínia Quartim e Bartolomeu Cid dos Santos: por Terras Devastadas.

quinta-feira, 14 de maio de 2009

A 13 de Maio

Jantar seguido de palestra na Casa Veva de Lima. Anabela Baptista, colega e amiga desde os bancos de escola, introduz-me neste espaço com marcas exóticas onde quinzenalmente se reconstitui o ambiente dos saraus e convívios culturais que Maria Ulrich organizava com a presença de sua mãe, Genoveva de Lima Mayer ou Genoveva Ulrich. O palacete dos Ulrich fica situado na rua Silva Carvalho, perto das Amoreiras, e é hoje património municipal. A animação da casa é assegurada pela associação Veva de Lima, promotora dos encontros regulares que referi.
Neste video e neste site dão-se a conhecer parte da casa, da sua história e da vida da instituição.
A palestra de ontem, a cargo do Prof. de Economia João César das Neves, teve por tema o culto mariano em Portugal. Na noite de 13 de Maio, falou-se da Terra de Santa Maria e das 21 festividades dedicadas à Mãe de Deus que a Igreja viria a decretar ser a Imaculada Conceição. Extraordinário!
Presença discreta mas significativa da cerâmica caldense na profusão decorativa dominada pelo tema obsessivo da borboleta e do cisne. De notar uma jarra de Manuel Gustavo Bordalo Pinheiro e um "Papagaio" de Avelino Belo que me pareceu ter sido inspirado ou talvez mesmo reproduzir modelo de Manuel Mafra.

quarta-feira, 13 de maio de 2009

Raul Proença

25 anos depois, regresso à Escola Raúl Proença para participar, com a colega Celeste Custódio, num colóquio sobre o pensamento político e educativo do seu patrono, moderado por Isabel Xavier (que soma à condição, hoje, de colega a, bem mais penosa - para ela -, de antiga aluna). Nenhum dos presentes - excepto, creio, o Dr. Mário Gonçalves, à época Director do Centro Hospitalar das Caldas da Rainha - tomou parte na sessão solene em que o Ministro da Educação, Prof. José Augusto Seabra, descerrou o medalhão que passou a assinalar na Escola Secundária das Caldas da Rainha o nome do coordenador do Guia de Portugal. Uma geração nos separa desse momento que assinalou também uma viragem na intervenção intelectual na cidade. Há 25 anos participei nessa aventura, hoje estive presente na passagem de testemunho.

Defender a legalidade democrática

Se o Ministério Público é o órgão do Estado ao qual compete a defesa da legalidade democrática, quem superintende o Ministério Público nesse exercício, em nome do povo?

segunda-feira, 11 de maio de 2009

SLB

Diz o meu amigo Medeiros Ferreira, de quem, todas as Segundas Feiras na Antena 1, recebo uma surpreendente lição de saber e ironia, que vem aí Scolari. Acredito na fonte.
Que nos valha pois, inconformados sofredores benfiquistas, Nossa Senhora do Caravaggio!

Felicitações

Parabéns aos meus inúmeros amigos que fazem do FCP uma "religião" e que sempre acreditaram, com ou sem pronuncia do norte, que o "Puerto é uma naçom".

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Vem Serenidade

Vem, serenidade,
e faz que não fiquemos doentes, só de ver
que a beleza não nasce dia a dia na terra.

E reúne os pedaços dos espelhos partidos,
e não cedas demais ao vislumbre de vermos
a nossa idade exacta
outra vez paralela ao percurso dos pássaros.

E dá asas ao peso
da melancolia,
e põe ordem no caos e carne nos espectros,
e ensina aos suicidas a volúpia do baile,
e enfeitiça os dois corpos quando eles se apertarem,
e não apagues nunca o fogo que os consome.
o impulso que os coloca, nus e iluminados,
no topo das montanhas, no extremo dos mastros
na chaminé do sangue.

Serenidade, assiste
à multiplicação original do Mundo:
Um manto terníssimo de espuma,
um ninho de corais, de limos, de cabelos,
um universo de algas despidas e retracteis,
um polvo de ternura deliciosa e fresca.

Vem, e compartilha
das mais simples paixões,
do jogo que jogamos sem parceiro,
dos humilhantes nós que a garganta irradia,
da suspeita violenta, do inesperado abrigo.

Excerto de um dos mais extraordinários textos da poesia portuguesa, de Raul de Carvalho. A totalidade do poema Serenidade és Minha pode ser lido aqui.
Vem serenidade. Ou vou eu à tua procura. Até Segunda-Feira. 

Abraçogs

Descobri-os ontem anunciados na portada de um pequeno restaurante no Largo do Carmo. Sim, é em Maio que eles voltam. E um tropel de memórias irrompeu de imediato, ameaçando revolver a paz de cemitério a que as tenho condenadas. E ali fiquei eu, como o outro velho do Abismo de Chicago, a murmurar palavras, a associar lugares, a inventar passados contra tudo o que deixámos que se perdesse. À espera, sem esperança, de que, escutando-as, alguém saiba o que com elas fazer.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

Recomendo vivamente

O blog de João Vasconcelos Costa: inteligente, útil, confiável.

Grau zero

Não me conformo com a escalada da crispação que parece querer instalar-se no debate político. Não percebo a quem serve, sendo certo que esse é um dos agentes do afastamento dos cidadãos da vida política e um contribuinte líquido para a abstenção eleitoral. A internet é uma plataforma indefesa  desse jogo perigoso que não respeita regras nem sequer de civilidade. Todos os dias tenho a minha caixa de correio inundada de lixo "político" da pior extracção, baseado na acusação gratuita e anónima, que não solicitei, saído de umas tantas centrais apostadas em promover o grau zero (?) da política. 

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Dimensões e limites da autoridade democrática: a escola

Editada originalmente em 1987, a obra de Ami Gutmann, directora do Centro de Valores Humanos da Princeton University, Democratic Education, coloca questões que permanecem na ordem do dia. A educação continua a ser um dos problemas mais importantes da vida política e a política de educação remete para um debate de teoria política. Em democracia, a educação é um aspecto central da relação entre Estado e famílias, das modalidades de controlo democrático do serviço público e da actividade de profissionais, do funcionamento dos sistemas de participação, autoridade, deliberação. A educação democrática é reveladora e constituinte da liberdade, da cidadania, da igualdade de oportunidades, da não discriminação, da tolerância, do cosmopolitismo e do multiculturalismo. Não há cultura democrática e educação política sem escola democrática.
Um excelente contributo para a reflexão política. Tradução em língua castelhana Amy Gutamann, La Educación Democrática. Una Teoria Política de la Educación. Barcelona, Paidós, 2001.

terça-feira, 5 de maio de 2009

Nem realidade nem sonho

Era o que ele estudava. "A estrutura, quer dizer, a estrutura", ele repetia e abria a mão branquíssima ao esboçar o gesto redondo. Eu ficava olhando seu gesto impreciso porque uma bola de sabão é mesmo imprecisa, nem sólida nem líquida, nem realidade nem sonho. Película e oco. "A Estrutura da Bola de Sabão, compreende?" Não compreendia. Não tinha importância. Importante era o quintal da minha meninice com os seus verdes canudos de mamoeiro, quando cortava os mais tenros, que sopravam as bolas maiores, mais perfeitas. Uma de cada vez. Amor calculado, porque na afobação o sopro desencadeava o processo e um delírio de cachos escorriam pelo canudo e vinham rebentar na minha boca, a espuma descendo pelo queixo. Molhando o peito. Então eu jogava longe canudo e caneca. Para recomeçar no dia seguinte, sim, as bolas de sabão.

Lygia Fagundes Telles, A Estrutura da Bola de Sabão. Lisboa, Livros do Brasil, 2001. p. 149.

segunda-feira, 4 de maio de 2009

Notícias da gripe: prudência

Depois de terem lançado o pânico, baseado no que pareceu ser um descontrolo sanitário no México, as autoridades ainda não constataram a especial virulência do virus H1N1. À táctica terrorista dos primeiros dias, sucedem agora prudência e apelos à calma.
Vamos ver.
Mas não deixa de ser inquietante. Estando o planeta sujeito a um assalto sazonal de gripe ao longo de todo o século XX ,pelo menos (ou seja, sendo a gripe globalmente epidémica), a prevenção é aqui quase inexistente. Em que direcção se tem estado a investir na investigação quanto ao trânsito de virus entre o homem e o animal?

domingo, 3 de maio de 2009

O mundo já mudou mas nós não

De uma das vozes mais lúcidas da política europeia, Felipe González:

[...] Como não é esta a perspectiva, a confusão aumenta e cada vez mais se responsabiliza os políticos locais, de uma cor ou de outra, pelo que está a acontecer, esquecendo que é a ausencia de um normativo aplicável global e localmente que está na origem desta grande bolha financeira que nos afoga com a sua implosão. Enfrentamos uma crise de governância global sem instrumentos para a corrigir.
A convicção dominante durante anos de que o mercado se auto-regulava por intermédio de uma "mão invisível" afastou a política da sua função reguladora como um estorvo ao crescimento, com a mesma determinação com que agora se exige aos políticos que reparem o desastre. Já não há outros responsáveis senão os Governos em exercício. Fala-se pouco dos autores do cataclismo e menos ainda das causas profundas que levaram a esta situação. O que resta é a exigência de responsabilidade dos Governos, a procura irracional de bodes expiatórios no quadro em que não são responsáveis, o da política.
O mundo mudou, mas nós não mudámos. A crise mostrou a existência de um antes e um depois que vem surgindo há mais de duas décadas, com a revolução tecnológica e a queda do muro de Berlim.

O restante texto do presidente da Comissão de Sábios que foi encarregada de elaborar um relatório sobre o Futuro da Europa
pode ser lido aqui.

sábado, 2 de maio de 2009

Vulcões, ilhas, arquipélagos

Comecemos pela Fábula Urbis: fica num daqueles prédios com que dantes se rematavam esquinas, na Rua Augusto Rosa, por detrás da Sé de Lisboa. No rés-do chão é livraria, uma livraria olissiponense, sábia e cuidadosamente organizada, num espaço acolhedor. O primeiro andar, duas pequenas salas de cujas janelas se vê a Lisboa e o Tejo de Carlos Botelho, é galeria espaço de tertúlia.
Ali nos reunimos ontem ao fim da tarde para ver as fotografias de Ana Maria Bettencourt sobre ilhas açorianas e caboverdianas, ouvi-la falar destes seus trabalhos que afinal são inseparáveis de um condição insular com que se identifica e de uma opção militante pela escola e pela intervenção social e política. E para ouvir Elisabete Caramelo dizer alguns dos mais belos poemas de língua portuguesa. E falar de experiências de insularidades diversas, que afinal talvez sejam apenas formas de ver a terra de longe, a terra longe.

Duas estratégias: egoísta e altruista

Entrevista com Marc Barthélemy, membro da equipa que efectuou a simulação da propagação da gripe mexicana para a Organização Mundial de Saúde, no Le Monde de ontem.

Pergunta: 
Que nível deve ser accionado para desacelerar a propagação do H1N1 ou reduzir os seus efeitos?

Resposta:
Simulámos a propagação de uma doença de tipo gripal transmissível entre humanos e testámos duas estratégias de utilização dos stocks de medicamentos antivirais disponíveis pelo mundo.
Na primeira estratégia, cada país utiliza os seus stocks de forma egoísta, reservando-os pera a sua própria população. Na segunda, os países mais ricos dispensam uma pequena parte - da odem dos 10 a 20% - das suas reservas aos primeiros países atingidos pela epidemia. Nas nossas simulações esta gestão "altruísta" ou "colaborativa" dos stocks de antivirais reduz o impacte da pandemia. Relativamente aos resultados obtidos com uma gestão "egoísta", o número de casos em todo o mundo pode ser dividido por 10 a 1000, segundo os países e a estação do ano em que se desencadeie a epidemia. Além disso, graças a este modelo de gestão, o pico da epidemia pode ser atrasado pelo menos um ano. Este período pode revelar-se crucial porque permite desenvolver e produzir uma vacina para os virus gripais do tipo H1N1.

Alguém arrisca um prognóstico sobre a estratégia preferida dos países ricos?

sexta-feira, 1 de maio de 2009

Bartolomeu Cid

Bartolomeu Cid dos Santos, Homenagem a Cesário, 1985


Um privilégio: ter assistido, no dia 30, à antestreia de dois filmes produzidos para a RTP2 (série Figuras Relevantes da Cultura Portuguesa) - Bartolomeu Cid dos Santos. Por Terras Devastadas de Jorge Silva Melo e Manuel Hermínio Monteiro. m.h.m. de André Godinho.
Jorge Silva Melo não pode terminar o filme com Bartolomeu. Sendo notórios o fascínio e o sentimento de perda que a figura do artista geraram no autor do filme, há um equivalente de pudor que perpassa ao longo da montagem. Essa contenção é um dos traços mais interessantes da forma como Jorge Silva Melo lidou com uma personagem tão entusiasta, tão envolvente, tão espontânea como Bartolomeu. A personalidade cativante do artista, o seu corpo grande, o olhar menino e atento, as mãos tingidas de negro, a memória fluente e as palavras evocativas ocupam a cena, sem excessos ou sublinhados, para que possamos perceber nos testemunhos dos próximos e na sequência de trabalhos, a nostalgia, o romantismo, a absorção e os labirintos, a viagem, os enigmas da sua obra ímpar.
Para quem como eu não conheceu Manuel Hermínio Monteiro, o filme do jovem cineasta André Godinho, é uma dupla revelação. A figura do editor que mudou o livro em Portugal e nos legou esse livro único que é a A Rosa do Mundo: 2001 Poemas para o Futuro foi tratada nos termos exigentes e compreensivos que merece. O resultado é um filme excelente.

Ana Maria Bettencourt

Foi eleita ontem pela Assembleia da República para a Presidência do Conselho Nacional da Educação. Ana Maria Bettencourt é Professora Coordenadora do Instituto Politécnico de Setúbal. Uma excelente escolha que é o reconhecimento de um continuado e exigente trabalho de reflexão sobre as políticas educativas, a valorização da função docente e o reforço da escola pública.
Nota pessoal.
Trabalhei uma década próximo de Ana Maria, cuja militância, saber e rigor me habituei a admirar. Também conheci os resultados do seu olhar de fotógrafa (os visitantes da cidade imaginária talvez se recordem das suas fotografias sobre vulcões). Mas destes seus dotes, falarei em seguida.

Notícias da gripe: as perguntas

Continuo a ler na imprensa mundial as notícias da nova gripe. Continua por explicar o motivo pelo qual se morreu de gripe mexicana no México. Continua por contabilizar qual o número exacto de mortos com a nova gripe relativamente ao total de mortos por gripe. 
A gripe que chega à Europa todos os Invernos atinge cerca de 20% da população. Essa gripe não é pandémica? Chega todos os anos, todos os anos é combatida com a vacina preparado em função do virus do ano anterior, mas não é considerada pandémica. Porquê?
Todos os anos se morre de gripe na Europa e no Mundo. Li que cerca de 40000 europeus morrem por ano de gripe. Parece um número suficientemente expressivo para encarar a gripe normal como um sério risco para a saúde pública. E, no entanto, além da vacina aconselhada (mas não obrigatória) para os grupos de risco, o que se prescreve ao paciente que experimenta os sintomas da gripe é que tome um analgésico ou um antipirético e sobretudo se recolha em casa e descanse dois a três dias.
Por outras palavras: há razões para crer que esta nova gripe é mais mortal que as anteriores? Até à data, ninguém respondeu a esta questão. Mas não há evidência que o comprove, nem mesmo no México. Parece que esta gripe tem uma capacidade de propagação mais rápida, mas também esse aspecto teria de ser comprovado. Se o virus sobrevive apenas 48 horas fora do meio favorável, em que que é que essas 48 horas diferem de outros virus de gripe?
Claro que 48 horas dão para viajar de avião. Sempre deram. Todos os virus que sobrevivam mais de umas horitas podem viajar de avião...
Em suma: a OMS conclamou o que chamou pré-pandemia. Ou seja, abriu a caixa da Pandora da pandemia. E depois apelou a que não entrássemos em pânico. Com franqueza!!!
E se em vez de entrarem neste perigoso jogo cuja regras são as do espectáculo mediático, respondessem objectivamente às perguntas que devem ser colocadas? 


À espera da gripe: armazém de Tamiflu no Reino Unido.

À janela de Vasco Trancoso


Janela do Hospital das Caldas da Rainha.
Fotografia cedida por Vasco Trancoso que entretanto decidiu partilhar os seus múltiplos dotes na blogosfera.