segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Alice Jorge, 1986


Este catálogo, também adquirido na Luis Burnay, reporta-se a uma exposição de Alice Jorge (1924-2008) na Galeria Bertrand do Chiado efectuada em Junho de 1986. Tem um estudo de Rocha de Sousa. Nele são reproduzidos alguns dos desenhos realizados em Paris nos anos 60 de nus femininos. Jorge Silva Melo comparou o impacte que estes trabalhos tiveram ao de O Segundo Sexo de Simone de Beauvoir.

Paula Rego, 1988

O Catálogo que adquiri na Luis Burnay (ver "No Alfarrabista II") é uma edição da Serpentine Gallery e corresponde a uma exposição de 47 obras de Paula Rego realizadas entre 1953 e 1988. Tem textos do pintor Victor Willing (marido de Paula, com quem casou em 1953 que veio a falecer em 1988), Ruth Rosengarten (minha antiga colega na Escola Superior de Artes e Design das Caldas da Rainha, autora dos mais importantes estudos sobre o trabalho da pintora) e uma entrevista realizada pelo crítico de arte John McEwen. A exposição decorreu entre 15 de Outubro e 20 de Novembro de 1988.



Paula Rego (foto do catálogo citado)



On the Beach, 1985

Lisboa e a República

domingo, 5 de outubro de 2008

No alfarrabista (II)

Ida, na passada quarta-feira, à Livraria Castro e Silva (Rua do Norte), para ver um lote de documentos manuscritos e impressos relativos à actuação do Partido Republicano em Pombal.
Entre eles, encontro referências directas e indirectas às eleições de 1911 para a Assembleia Constituinte. Num contexto em que a lei eleitoral previa expressamente que, nos círculos onde só concorresse uma lista, esta seria automaticamente considerada eleita, dispensando-se a votação, o círculo de Pombal foi palco de uma acirrada disputa eleitoral entre duas listas republicanas. Estudei o assunto em "Para a história da República nas Caldas. As origens de um conflito político: antigos e modernos, radicais e moderados", in 21 Anos, pela História. Caldas da Rainha: Estudos, Notas e Documentos, 2003, e "Elites locais e competição eleitoral em 1911", in Análise Social, nº 95, 1987.
Os dois documentos aqui reproduzidos são cartas trocadas entre a Comissão Paroquial Republicana e o Directório do Partido em Abril/Maio de 1911 e respeitam à elaboração das listas de deputados. A Comissão Paroquial protesta por não ter sido consultada para a elaboração da lista do círculo e o Directório responde que "os deputados são da nação e não das localidades". No entanto, informa que José Cupertino Ribeiro está disposto a ser candidato pelo círculo.

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Passagem, em seguida, pela Livraria Luis Burnay (Calçada do Combro), onde me encontro com um catálogo de Paula Rego e uma pequena brochura sobre Alice Jorge (ver posts seguintes)

Maria Helena Coimbra


Não é o curriculum de Maria Helena Coimbra que quero evocar, mas a pessoa pelos breves mas intensos momentos em que com ela convivi. Dela recordo dois traços singulares: a afabilidade pessoal e a vivacidade intelectual.
E como o meu reconhecimento de Maria Helena Coimbra teve, na origem, o "Colóquio sobre a Cerâmica Portuguesa Moderna", realizado em 22, 23 e 24 de Fevereiro de 1996, no Museu de José Malhoa, é a imagem da sua participação nesse encontro que quero fixar. Faz justiça, creio, à sua personalidade cativante, num momento em que apresentava uma comunicação sobre oleiros e olarias caldenses que conhecera na sua juventude. O autor da fotografia é Jorge Ribeiro, marido de Maria Helena.

sábado, 4 de outubro de 2008

Três pontos sobre a Fortaleza de Peniche


Tenho seguido com surpresa a reacção que Irene Pimentel, Diana Andringa e Maria Manuela Cruzeiro desencadearam no seu site Caminhos da Memória contra a projectada instalação de uma Pousada na Fortaleza de Peniche. Tenho por todas elas a maior consideração intelectual, no caso de duas também temperada por estima pessoal e amizade.
Os depoimentos que fizeram no referido site, recorrendo por vezes à crítica fácil e ao argumento deselegante, tentam estabelecer uma linha de fronteira entre os que defendem a memória dos que sofreram a repressão política e os que transigem nessa defesa, cedendo a outros interesses. Irene Pimentel, Diana Andringa e Maria Manuela Cruzeiro não cuidaram de se informar, de analisar a situação da Fortaleza e de eventualmente submeter a contraditório essa análise. Julgaram sumariamente declarações do Presidente da Câmara, que leram em jornais, num tribunal de ética e de espírito cívico de que se apresentam como as únicas detentoras autorizadas, e sentenciaram-no.
Se exigências mínimas de rigor tivessem sido respeitadas, teriam começado por se informar sobre o acontecimento que está na origem da sua sobressaltada tomada de posição. E em vez de projecto, que tomam como tendo sido aprovado, e protocolo, que julgam celebrado com a Câmara, talvez descobrissem que o que foi assinado a 25 de Setembro foi um aditamento a um contrato de exploração anterior, entre o Estado e a Enatur. 
Portanto, ponto um: a construção de uma Pousada na Fortaleza de Peniche há muitos anos que fora decidida por um Governo da Democracia (salvo erro, presidido pelo Eng.º António Guterres) sem que tivesse gerado nenhum clamor “ético” e “cívico”.
O aditamento agora assinado altera porém num aspecto a concessão anterior, permitindo ao grupo privado que entretanto adquiriu 49% do capital da Enatur e assumiu a respectiva gestão, elevar o número previsto de quartos do estabelecimento hoteleiro de Peniche. A Câmara de Peniche dessa altura (2002) acompanhou todo processo. A elaboração do projecto foi entregue ao Arquitecto Siza Vieira, competindo-lhe apresentar uma proposta sobre as áreas que seria necessário ao Estado (proprietário do monumento) ceder para a construção da pousada. Com base no parecer do projectista, seriam posteriormente definidas em protocolo adicional, as áreas cedidas, as áreas não cedidas e as áreas comuns. Nesse protocolo adicional estava prevista a intervenção da Câmara. Aconteceu, no entanto, que o projectista não concluiu o seu trabalho, certamente por desinteresse da Enatur.
Ponto dois: não há nenhum protocolo relativo a este tema em que a Câmara Municipal de Peniche tenha intervindo. As redactoras do site não são muito explícitas quanto ao que defendem para a Fortaleza. Irene Pimentel defende que “devia ser ali erguido um espaço museológico ‘a sério’, actual e com preocupações estéticas, bem como pedagógicas”. Pela minha parte, só me posso congratular com esta indicação. Bem vinda ao clube! Há mais de duas décadas que venho advogando esse objectivo e colaborado com diversos executivos municipais com vista à sua prossecução. Mas confesso que para lá da boa vontade municipal, não encontrei nenhum movimento de ideias nem disponibilidades materiais para empreender essa criação. E seria injusto omitir que o actual executivo camarário tomou o tema em mãos, efectivou contactos e desencadeou um processo aberto de contributos cívicos, científicos e museológicos que lhe permitam dotar-se de um programa museológico. Estou certo que o contributo generoso de Irene Pimentel, Diana Andringa e Maria Manuela Cruzeiro para esse programa será bem acolhido.
Resta discutir se todo o espaço da Fortaleza deve ser musealizado. Aqui certamente divergimos. Mas se as minhas amigas visitarem o local, tomarem em atenção as dimensões da Fortaleza e o seu estado de conservação, ouvirem a população local e tentarem perceber a história secular do monumento e, sobretudo, fizerem contas às fontes de financiamento de um espaço museológico com as características daquele, no mínimo hão-de concordar que o sentido da responsabilidade pública não está distribuído só a um dos lados desta controvérsia.
Em suma, ponto três: há muita matéria para discutir (e trabalhar) se dela eliminarmos preconceitos e ligeireza.

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

A hora da política (II)

Em toda a Europa, a criação de emprego está em queda, como o investimento das empresas e o poder de compra das famílias (o comportamento de indicadores como a compra de automóveis ou de habitação bem o demonstra). O crédito, tanto ao consumo como ao investimento, está mais mais caro e menos acessível.  A diminuição das procuras internas soma-se à das procuras externas: em toda a parte, as exportações também caem.
Em França, o INSEA (Instituto Nacional de Estatística e Estudos Económicos) usa o termo recessão para se referir à evolução previsível da economia francesa e europeia do último trimestre deste ano.
Espero que não nos enredemos na discussão semântica: recessão ou recuo, recessão ou crescimento fraco, etc. Se é a hora da política é a hora de falar verdade e de explicar com rigor o que temos de fazer. Só pode haver confiança na verdade e esperança no rigor.

Eduardo Constantino em Óbidos


Eduardo Constantino é um ceramista com uma prestigiosa carreira internacional. Nasceu nas Caldas da Rainha há 60 anos, mas desde 1976 que vive na Bretanha.
Começou por abordar a cerâmica, experimentalmente, a partir da pintura. Fascinado com os resultados, fez uma aprendizagem da disciplina com um mestre oleiro local, Guilherme Barroso. 
A sua obra, onde é possível discernir diversas fases, tem dado sinais de um aprofundamento constante do processo técnico. Constantino tem uma marcada preferência pelos produtos cozidos a altas temperaturas - grés e porcelana - que lhe permitem obter um mais límpido jogo de brilhos e matizes. 
Expôs em França, na Argélia, em Espanha, na Alemanha, na Suiça, na Noruega e na Grã Bretanha. Em Portugal, apresentou os seus trabalhos nas Caldas da Rainha, na Marinha Grande, em Aveiro, Cascais e Torres Vedras.
A partir de hoje, às 18,30, está também em Óbidos, na Galeria Ogiva.

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

1 de Outubro

Também foi ontem o dia do idoso. Laura Martinho assinalou-o, enviando por mail um libelo contra a manipulação e violência exercida sobre idosos dependentes, em lares e instituições desse tipo. De facto, a designação "lar de idosos" cobre hoje por vezes práticas inescrupulosas, difíceis de identificar e punir legalmente. Mas Laura, segura da sua razão e dos factos que testemunhou relativamente a um seu padrinho, luta, com coragem e determinação, pela justiça.
Transcrevo aqui parte do texto que me enviou:
A violência com os idosos é uma violência exercida no silêncio porque estes já não t~em forças para se afirmar, e, se afirmam ou reclamam, dão-lhes uma "gotinhas" e passam a sofrer em silêncio "voluntário". [...]
Neste dia especial, a não esquecer, a não passar despercebido a quem trabalha na área das políticas sociais, fica aqui uma humilde mensagem:
Que velhice queremos? Que velhice defendemos? Que velhice apoiamos?
Que se faça algo em prol dos direitos dos idosos que sofrem, fechados "a sete chaves", a ingerir "gotinhas".
Investigar ... Há idosos condenados a morrer num sofrimento atroz porque a cegueira de alguns lhes rouba a liberdade, a autodeterminação, a dignidade. Há que pôr cobro a essa chacina, a essa destruição física e mental, exigir uma nova revolução, uma revolução ética por um mundo melhor, onde os idosos tenham direitos, cidadania.
Acredito que é possível mudar o mundo para melhor. Acredito que podemos contar com a força de todos nós para a criação de uma associação em defesa dos direitos dos idosos.
Uma associação capaz de mobilizar toda a sociedade civil com o objectivo de eliminar todas as manifestações perversas no tratamento dos idosos, institucionalizados ou não, apta a denunciar e promover a extinção de todas as empresas da morte, bem como a lançar campanhas de sensibilização junto da população, de todas as faixas etárias, no sentido de um maior respeito e afecto pelo idoso.

1 de Outubro


A Comissão Nacional para as Comemorações do Centenário da República abriu hoje as suas portas. Já tem sede (Palácio Foz, Praça dos Restauradores, 1250-187), uma pequena equipa (Maria João Lamy e Paula Meireles), endereço electrónico (comissaorepublica@cnccr.pt), telefone (213405500) e fax (213405519).
Era o dia mundial da música. Houve por isso um concerto no Palácio (para saber mais sobre a programação cultural do Palácio Foz, clique aqui). Ainda não conhecemos os cantos à casa, mas a minha antiga colega de curso (e dirigente estudantil) Anabela Baptista, fez-nos a apresentação.  

A hora da política (I)

Lula pediu em Nova Iorque que a política tomasse o seu lugar na crise financeira. Que ocupasse o posto de comando, uma expressão vulgarizada pelos velhos leninistas. Pedir o regresso da política não equivale a pedir o regresso dos políticos, que tem outra conotação, aliás negativa. Trata-se sobretudo de recuperar o sentido de um discurso e de tomadas de decisão. Um discurso realista, que pressuponha que a verdade é a condição da confiança (ai dos políticos cataventos que continuam a apostar em ocultações e manipulações da realidade). Tomadas de decisão que sejam claras nos objectivos e nos meios, que sejam oportunas. O sistema financeiro não é um alvo a abater (se o mercado continuar a funcionar como até aqui é o que sucederá). É um factor fundamental para a vida económica. Tem de ser preservado, saneado, racionalizado, protegido. É o que se está a fazer em diversos países europeus, em especial do Norte. 

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Pequeno tigre


"um pequeno tigre que nunca se habituou às areias do caixote, mas foi quem primeiro me tomou o coração de assalto"
Eugénio de Andrade

terça-feira, 30 de setembro de 2008

As cidades de Nadir

O que me fascina em Nadir é a sua obsessão pelas cidades. Aqui: "Teerão"

João Jales (ver comentário a "Wall Street") lembrou a sua passagem pelas Caldas na única edição dos Encontros Internacionais de Arte que aqui teve lugar. Não assisti ao acontecimento, que deixou um rasto de incompreensão que demorou muito tempo a corrigir ou, pelo menos, a suavizar. Em 2004 estive presente na ESAD à exibição de um filme sobre os Encontros, na posse de um dos organizadores, Egídio Álvaro. Esse facto pode ser recuperado através da reportagem publicada na Gazeta das Caldas.
Os Encontros tiveram lugar em 1977, há mais de três décadas. Seria interessante e útil reunir a documentação existente sobre o acontecimento.

Congresso Viseu-Congrega

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Continuidades e rupturas, séculos XIX-XX



Wall Street

Nadir Afonso

O tempo na cidade

Com a migração de O que eu andei ... para o campo blogspot, tive de remodelar o site Cidade Imaginária. Seleccionei como entrada do mês para a página de entrada  este diálogo entre dois arquitectos urbanistas portugueses:
Gonçalo Byrne:
O que mais se nota quando voas sobre uma cidade são os vazios, as ruas, as tramas... São os sitemas dos espaços entre os objectos que constróem as tais paisagens ligadas ao tempo. Essas paisagens sedimentadas permitem o reconhecimento da cidade: o que é mais e o que é menos antigo. O tempo acaba por ficar impresso.
Álvaro Siza:
O tempo também selecciona... Noto bastante a ansiedade em relação à definição de novos ambientes. A ideia de que as cidades modernas são feias. É uma ideia geral, não é?
Brasília, por exemplo, foi sujeita às críticas mais ferozes pelas mais variadas razões. Passa-se por essa fase porque uma cidade, para se consolidar e ganhar vida própria, precisa de tempo. Recordo-me de ver uma gravura antiga da fundação de Buenos Aires e era um desconsolo... Uma cidade nova horrível que se transformou com o tempo numa cidade maravilhosa, perfeita na sua relação ao longo de um enorme território.
Uma coisa acabada de fazer é sempre uma coisa a que falta muito; a que falta o tempo, as sobreposições, as intervenções.
Gonçalo Byrne, Geografias Vivas. VI Bienal Internacional de Arquitectura de S. Paulo. Lisboa, Ordem dos Arquitectos, 2006. p. 78.

domingo, 28 de setembro de 2008

Sinalética


Há uma Câmara que descrimina desta forma os seus trabalhadores...

Peniche, 2 de Fevereiro de 1786

A década de 1780 foi marcada por convulsões políticas no Novo Mundo. A revolução americana, declarada em 1776, consuma a vitória sobre o exército inglês em 1781. A independência dos Estados Unidos da América é reconhecida em 1783. Em 1780, estala no Peru uma revolta contra o domínio espanhol, conduzida pelo chefe inca, José Gabriel Tupac Amaru. O exército colonial põe-lhe termo no ano seguinte, executando o líder e aprisionando o filho.
Em Abril de 1784, parte de Lima, Peru, com destino a Cadiz, o navio espanhol San Pedro de Alcântara. É um navio de guerra, de 64 canhões. 


Vinha carregado com cobre e metais preciosos, produto da mineração do Peru acumulada nos anos anteriores (durante os quais a instabilidade originada pela guerra da independência americanae o embargo britânico impedira o seu normal escoamento para a Europa). Trazia também um conjunto de colecções de artefactos anteriores à presença espanhola, recolhidas por dois cientistas espanhóis em expedições efectuadas a grutas de uma região do Peru. Finalmente, fazia parte da carregamento do San Pedro cerca de duas dezenas de prisioneiros incas, incluindo o filho do chefe executado, Fernando Tupac Amaru.
O navio zarpou com excesso de peso, enfrentando por isso diversos sobressaltos na sua longa viagem. Quando chegou ao Chile, viu-se obrigado a deixar parte da carga e a regressar ao Peru para reparações. No Rio de Janeiro, já no ano seguinte, foi forçado a uma imobilização de 4 meses, de novo para reparações. A 2 de Fevereiro de 1786, aproximou-se da costa de Peniche e foi embater violentamente contra as rochas da Papoa. Com o choque, o casco do fundo partiu-se e o porão separou-se do resto da embarcação. O mar estava calmo. O comandante do navio foi traído provavelmente pela maré muito baixa e as imprecisões da carta de navegação. 128 pessoas, entre as quais a maioria dos prisioneiros incas, encontrou a morte no naufrágio.
O acontecimento teve uma enorme repercussão internacional e uma extraordinário incidência em Peniche. O governo espanhol não se poupou a esforços para recuperar os tesouros depositados no fundo do mar (calcula-se em cerca de 750 toneladas de cobre, prata e ouro) e contratou mergulhadores e enviou para Peniche equipas técnicas e operários. Durante dois anos, Peniche foi estaleiro destes trabalhos morosos e complexos de resgate.
Depois, lentamente, o tempo foi apagando memórias e sinais.

Em 1975, um arqueólogo francês, Jean Yves Blot, iniciou o longo processo de devolução desta história ao conhecimento. Começou pela investigação de arquivo, onde encontrou abundantes referencias, em Espanha e por toda a Europa. Passou depois ao local, onde a pesquisa se revelou mais difícil. Identificou a zona de impacte e a área onde se tinham procedido a inumação de cadáveres. Organizou campanhas arqueológicas em terra e no mar.
Ontem em Peniche, no Edifício Cultural, Jean Yves, que entretanto implicou no fascínio pelo tema a arqueóloga Maria Luisa Pinheiro, apresentou uma Exposição onde se pode seguir o trajecto e os principais resultados deste longo e persistente trabalho. A exposição é acompanhada pela edição de uma obra intitulada Peniche, Encontro entre Dois Continentes: Concerto para mar e Orquestra. San Pedro de Alcântara, 1786.

sábado, 27 de setembro de 2008

A parede vazia e o gorro de pele (II)

O episódio narrado por Kundera na introdução ao conto "Cartas Perdidas" pode ser lido como uma metáfora do património. Não é original este entendimento. Costumo abrir com ele os trabalhos lectivos na cadeira de "Património Cultural".
De facto, o gorro é o elemento de continuidade do passado, o vestígio que sobreviveu à destruição perpetrada neste caso pelos homens (há testemunhos que desaparecem, por acção do tempo ou da natureza). O vestígio chegou até nós, mas não fala por si. Sem a leitura, a crítica de contexto, a descodificação, atribuição de significado, em suma a interpretação, realizadas com recurso à história e às ciências do património, permaneceria mudo e indecifrado.

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

A parede vazia e o gorro de pele (I)

"Em Fevereiro de 1948, o dirigente comunista Klement Gottwald subiu à varanda de um palácio barroco de Praga para falar às centenas de milhar de cidadãos aglomerados na praça da Cidade Velha. Foi uma grande viragem na história da Boémia. Um momento fatídico, como acontece uma ou duas vezes por milénio.
Gottwald fazia-se acompanhar pelos camaradas e, ao lado, muito perto, estava Clementis. Nevava, fazia muito frio, e Gottwald vinha de cabeça descoberta. Clementis, muito solícito, tirou o gorro de pele que trazia e colocou-o na cabeça de Gottwald.
A secção de propaganda fez centenas de milhar de exemplares da fotografia da varanda de onde Gottwald, de gorro de pele e rodeado pelos camaradas, fala ao povo. Nesta varanda começou a história da Boémia comunista. Todas as crianças conheciam a fotografia, porque a tinham visto nos cartazes, nos manuais ou nos museus.
Quatro anos mais tarde, Clementis foi acusado de traição e enforcado. A secção de propaganda fê-lo desaparecer imediatamente da história e, como é evidente, de todas as fotografias. A partir daí, Gottwald está sozinho na varanda. Onde ficava Clementis, há apenas a parede vazia do palácio. De Clementis restou o gorro de pele na cabeça de Gottwald".
Milan Kundera, "As Cartas Perdidas", in O Livro do Riso e do Esquecimento, 1978 [9ª ed. portuguesa, D. Quixote. 2001]

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Futuro do ensino de Animação Cultural

Na primeira fase do concurso nacional de acesso ao ensino superior público, no curso de Animação Cultural, a funcionar na Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Leiria, foram preenchidas 14 das 30 vagas disponíveis. Espera-se que a segunda fase permita inverter esta tendência e assegurar a continuidade do curso. Mas, se este sobressalto fosse tomado como uma chamada de atenção para o enquadramento do curso, teríamos aqui uma ocasião para repensar o ensino da gestão cultural e a sua correcta inserção na oferta educativa do Instituto. Onde faz sentido localizar a oferta de formações relacionadas com a produção e gestão cultural? Nas escolas de educação ou nas escolas de artes?

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Esquinas, a cidade como encruzilhada

"Quando me pediram para realizar uma exposição sobre as cidades, pensei de imediato que não iria reincidir numa apresentação temática dos "problemas" urbanos (infraestruturas, habitação, periferias, renovação, etc.),  evitando igualmente fazer uma leitura tecnocrática (que falasse, por exemplo, de fluxos, mutações, reflexos ou margens). Pensei, antes, em dar a ver a cidade de forma muito concreta, material e tangível, algo que que valorizasse mais os sentidos do que a abstracção, muito mais o lado político que o lado mecânico. Pensei então no interesse figurativo das esquinas, na condição da esquina como paradigma da diversidade urbana, arquitectónica, cívica e cultural.
A diversidade cultural é um facto urbano. No mundo contemporâneo, onde mais de 80% da população vive em cidades (e a restante não tardará a deixar-se assimilar por elas, a única garantia que permite transformar a solidão em intercâmbio e a ignorância em progresso).
Para mostrar a diversidade cultural não é necessário imaginar um mosaico de exotismos, mas apresentar as cidades como o lugar de cruzamento e mistura, lugar plural e contraditório por excelência, longe das simplificaçôes que muitas vezes fazemos."
Manuel de Solá-Morales, Comissário da Exposição Cidades, Esquinas, (Barcelona, 2004)


Alvaro Siza, Boujour Tristesse, Berlim, 1980-1984.

terça-feira, 23 de setembro de 2008

Mercado sem produtos

Conversa solta de quem há muito não se encontra. Diz a certa altura o meu interlocutor: há cerca de 2 meses estava a jogar com mais de três milhões de euros no mercado de derivados, sem que verdadeiramente existisse algum euro nas transacções. Explique-me, pedi eu.
- Imagine que um Banco chega junto de si e lhe diz que o seu crédito à habitação deve estar protegido contra os aumentos das taxas de juro e que, por isso, lhe vai fazer um empréstimo pelo montante igual ao valor do seu crédito. Diz-lhe ainda que trimestralmente (ou semestral ou anualmente) lhe irá creditar os juros dessa aplicação e, simultaneamente, debitar os juros do empréstimo que lhe facultou.
O professor "compra" 250.000 euros a uma taxa fixa, por exemplo Euribor do dia a 6 meses, e em seguida o seu Banco apresenta-se no mercado com 250.000 euros que "venderá" a uma taxa superior ou inferior àquela que contratou. Se no fim do período acordado a taxa obtida no mercado estiver mais alta, o Professor recebe a diferença, se estiver mais baixa, paga a diferença.
À primeira vista, parece razoável. Mas sucede que o Professor agravou a sua situação financeira pessoal, pois não sabe se as taxas vão subir ou descer e corre o risco de não receber qualquer rendimento da sua aplicação e ainda ter de pagar se as coisas não correrem bem.
Como é que funciona este mercado de derivados (CDS - Credit Derivatives Swaps)? Aí estão à venda ziliões de créditos, com taxas negociadas ao minuto. Sem qualquer mecanismo de controlo, é deste jogo que resultam as subidas ou descidas de taxas de juro. O movimento financeiro é imenso. Para o negócio não cair como um castelo de cartas, é preciso manter esse movimento.
Os intervenientes neste mercados são de facto apostadores. A aposta é simples: os juros vão subir ou vão descer? Se não, repare. O professor fez uma aplicação num mercado de um montante que não tem (os tais 250.000 euros), através de um Banco que também o não tem. No mercado onde ele vai ser transaccionado, não existem, igualmente, esses 250.000 euros. É um mercado virtual.
Se uma autoridade entrar neste mercado e quiser ver a liquidez das operações, tudo se desfaz: não existe dinheiro nem verdadeiramente existiu jamais, mas apenas comissões, ordens electrónicas e expectativas. A bolha estoira!

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Explicações

Acorreram todos este fim de semana aos mais influentes órgãos de comunicação. Vieram explicar que não, que não foi da desregulação da economia americana a responsabilidade. Foi da ganância dos povos (e, em especial dos pobres) e outras explicações universais. O mercado está a funcionar (funciona sempre) e vai repor as coisas no são.
O mercado aceitou negociar sem produtos. As pessoas (gananciosas, claro) viram as suas aplicações volatilizarem-se em poucos dias. Este mercado a funcionar reporá confiança nas suas vidas?

O luto mais impiedoso

A morte de um filho.

No alfarrabista (I)

Pequena mas interessante colheita: um número [3, 1947] da revista Formes et Coleurs, Revue Internationale des Arts, du Gout et des Idées, editada em Lausanne, dedicada ao tema O Mar ["Hauts Lieux Méditerranéens", "Le Navigateur et le Ciel", "Le Nu et la Mer", "La Mer et le Génie Anglais", etc.], 6 números da revista A Arquitectura Portuguesa e Cerâmica e Edificação [1952-1955].


Cerâmicas de Vitor Palla
[A Arquitectura Portuguesa..., nº 3/4, Abril de 1953]




















Henri Matisse, "Devant la Mer" [Formes et Couleurs..., 3-1947]

domingo, 21 de setembro de 2008

Manuel de Oliveira

Vi (e nalguns casos revi) tudo o que Serralves nos mostra de e sobre Manuel de Oliveira. Prestei especial atenção à entrevista conduzida por João Bénard da Costa (o comissário da exposição), aos excerptos de filmes organizados em função de uma leitura dos métodos narrativos do cineasta e sobretudo aos documentários. Douro, Faina Fluvial (1931), que não conhecia, é uma obra inesquecível.

Imagens do Porto

Um janela sobre as cidades: Porto e Gaia.

[Hotel da Bolsa, 19 de Setembro de 2008]

Voltar ao Porto

Reencontrar a cidade e as marcas que nela deixamos. Redescobrir as marcas que em mim ficaram.

[Praça Humberto Delgado, Dezembro de 2006]


Teresa Perdigão

Enfim, a Teresa decidiu-se a partilhar o seu olhar de antropóloga e de mulher sobre o território e as pessoas. Podemos agora acompanhar com o nosso o seu fascínio pelas culturas que nos identificam e pedir-lhe ajuda para tentar perceber o que se perde e o que se muda.

15 de Setembro

É certo que os ritmos de vida e trabalho se diversificaram e os calendários se comprimiram. Mas os professores sempre se regem por anos lectivos e 15 de Setembro assinala um novo ano.
O que eu andei ... nasceu dentro da Cidade Imaginária [www.cidadeimaginaria.org]. Ganha hoje autonomia, sem cortar as ligações com o sítio onde nasceu. É por isso que este primeiro post recupera o último do seu local de origem:

Yesterday (na cidade imaginária ouvem-se os Beatles e identificam-se imagens)

Alan Aldridge coordenou em 1969 e 1971 a edição de dois volumes sob o título The Beatles: Illustrated Lyrics. A obra é constituida pelos poemas das canções cantadas pelo grupo acompanhadas de imagens alusivas. Na página 87, "Yesterday", uma composição de Paul McCartney, é ilustrada com uma fotografia de David Bailey (fotógrafo inglês, nascido em 1938, que registou imagens dos Beatles e de outras figuras muito conhecidas, tendo inspirado a personagem do fotógrafo de moda do filme "Blow-up" de Antonioni (1966). Bailey associou "Yesterday"(originalmente Scrambled Eggs) a um prato com um ovo estrelado que fora utilizado como cinzeiro. A fotografia foi também publicada por Luis Pinheiro de Almeida e Teresa Lage, Beatles em Portugal (Assirio & Alvim, 2002, p. 32). Estes autores contam que Paul McCartney esteve em Albufeira em Maio de 1965, onde terminou a composição de "Yesterday", que viria ser gravada em 14 e 17 de Junho do mesmo ano. Não informam, porém, se a fotografia foi tirada durante esssa estadia. O livro de Aldridge (que consultei por empréstimo de João Jales) também não identifica o local onde foi realizada. Mas há particularidade da imagem que merece destaque: o prato, uma peça de faiança branca que foi produzida pela Fábrica Secla das Caldas da Rainha.