terça-feira, 23 de setembro de 2008

Mercado sem produtos

Conversa solta de quem há muito não se encontra. Diz a certa altura o meu interlocutor: há cerca de 2 meses estava a jogar com mais de três milhões de euros no mercado de derivados, sem que verdadeiramente existisse algum euro nas transacções. Explique-me, pedi eu.
- Imagine que um Banco chega junto de si e lhe diz que o seu crédito à habitação deve estar protegido contra os aumentos das taxas de juro e que, por isso, lhe vai fazer um empréstimo pelo montante igual ao valor do seu crédito. Diz-lhe ainda que trimestralmente (ou semestral ou anualmente) lhe irá creditar os juros dessa aplicação e, simultaneamente, debitar os juros do empréstimo que lhe facultou.
O professor "compra" 250.000 euros a uma taxa fixa, por exemplo Euribor do dia a 6 meses, e em seguida o seu Banco apresenta-se no mercado com 250.000 euros que "venderá" a uma taxa superior ou inferior àquela que contratou. Se no fim do período acordado a taxa obtida no mercado estiver mais alta, o Professor recebe a diferença, se estiver mais baixa, paga a diferença.
À primeira vista, parece razoável. Mas sucede que o Professor agravou a sua situação financeira pessoal, pois não sabe se as taxas vão subir ou descer e corre o risco de não receber qualquer rendimento da sua aplicação e ainda ter de pagar se as coisas não correrem bem.
Como é que funciona este mercado de derivados (CDS - Credit Derivatives Swaps)? Aí estão à venda ziliões de créditos, com taxas negociadas ao minuto. Sem qualquer mecanismo de controlo, é deste jogo que resultam as subidas ou descidas de taxas de juro. O movimento financeiro é imenso. Para o negócio não cair como um castelo de cartas, é preciso manter esse movimento.
Os intervenientes neste mercados são de facto apostadores. A aposta é simples: os juros vão subir ou vão descer? Se não, repare. O professor fez uma aplicação num mercado de um montante que não tem (os tais 250.000 euros), através de um Banco que também o não tem. No mercado onde ele vai ser transaccionado, não existem, igualmente, esses 250.000 euros. É um mercado virtual.
Se uma autoridade entrar neste mercado e quiser ver a liquidez das operações, tudo se desfaz: não existe dinheiro nem verdadeiramente existiu jamais, mas apenas comissões, ordens electrónicas e expectativas. A bolha estoira!

2 comentários:

J J disse...

Esta é muito boa porque explica, de forma simples, o benefício evidente que um mercado financeiro “à solta” constitui para a "economia real"…
A situação em que estamos resulta de uma administração inepta ou (e?) corrupta que permitiu, sob a capa de "deixar o mercado funcionar", que meia dúzia dos seus amigos especuladores ganhassem milhões à custa das empresas e de todos nós. Resultados à vista.

João B. Serra disse...

Este post procurou responder à observação precedente do "submarino". Obrigado pelo estímulo.