segunda-feira, 20 de abril de 2009

Textos de véspera e do dia seguinte. Jogo e construção

Eduarda Dionísio (1980)
1. Desenho: pirâmide; código: o amor
Texto A [msc]
É uma elaboração intelectual, está bem de ver.
  É uma construção geometrizada, está bem de ver.
     É uma operação mais selectiva do que aditiva, está bem de ver.
       É joeirar e depois pescar, está bem de ver.
         É um esforço minimizado pela planificação prévia, está bem de ver.
           É um trabalho de formiga, digno de um formigueiro inteiro, está bem de ver.
             É um jogo com muitas regras, para jogadores muito pacientes, está bem de ver.
Texto B [jbs]
É uma elaboração intelectual, está bem de ver.
  É uma elaboração manual, está bem de ver.
    É uma construção experimental, está bem de ver.
      É uma construção que se projecta no futuro, está bem de ver.
É um esforço minimizado por uma vontade prévia, está bem de ver.
  É um esforço alimentado pelo trabalho de muitos, está bem de ver.
    É um edifício de degraus, está bem de ver.
      É um edifício que se pode subir a dois e dois, está bem de ver.
Quem chegar ao cimo diz-se que colherá o sopro dos deuses - está bem de ver?
  Quem chegar ao cimo consta que compreenderá uma rosa dos ventos - está bem de ver?
    Quem chegar ao cimo julga-se que dominará para sempre o deserto - está bem de ver?

1 comentário:

Vasco Tomás disse...

De que “amor” se fala aqui?
Há várias palavras que assinalam que não é talvez ou apenas do amor conjugal, mas de um outro amor mais vasto. Qual?
A fiada dos textos inspirados que neste momento estão presentes no blog sob esta égide permite que se conclua que o seu objecto específico é a história política. Neste texto, começa-se pelo método.
O texto A releva a importância do trabalho da razão e da experiência, mas permanece a disjuntura dos dois elementos. O texto B rectifica o anterior no plano epistemológico, uma vez que aponta para a relação dialéctica que existe entre aqueles elementos.
Mas, digo eu, o conhecimento que se engendra esbarra com a infinitude do seu objecto. Por isso, a luz que se desprende ilumina cada vez menos o horizonte. E fica a subida à montanha, onde ocorreria a transfiguração, cada vez mais uma impossibilidade. Desistir então desta empresa? Não, porque, Goethe dixit, no frémito (de todo o amor?) refulge o melhor da humanidade.
São belos os textos no que concitam à abertura de novas possibilidades de dizer o desejo de uma felicidade sonhada e partilhada.