domingo, 31 de julho de 2011

"Que farei quando tudo arde?"

Desarrezoado amor dentro em meu peito,
tem guerra com a razão. Amor, que jaz
i já de muitos dias, manda e faz
tudo o que quer, a torto e a direito.


Não espera razões, tudo é despeito,
tudo soberba e força; faz e desfaz,
sem respeito nenhum; e quando em paz
cuidais que sois, então tudo é desfeito.


D’outra parte, a Razão tempos espia,
espia ocasiões de tarde em tarde,
que ajunta o tempo; enfim vem o seu dia:


Então não tem lugar certo onde aguarde
Amor; trata treições, que não confia
nem dos seus. Que farei quando tudo arde?

Sá de Miranda: Poesia e Teatro. Selecção, Introdução e Notas de Silvério Augusto Benedito. Lisboa, Ulisseia, 1989. p. 160.

2 comentários:

Isabel X disse...

"Que farei quando tudo arde?"
pergunta sem resposta ou que por ser dita a si mesma se responde?

- Isabel X -

Cláudia S. Tomazi disse...

Tudo é honra, inclusive o amor!
E quando o próprio amor do acaso é a causa, principalmente este.