sábado, 19 de junho de 2010

Tempos

Fisicamente, habitamos um espaço, mas, sentimentalmente, somos habitados por uma memória. Memória que é a de um espaço e de um tempo, memória no interior da qual vivemos, como uma ilha entre dois mares: um que dizemos passado, outro que dizemos futuro. Podemos navegar no mar do passado próximo graças à memória pessoal que conservou a lembrança das suas rotas, mas para navegar no mar do passado remoto teremos de usar as memórias que o tempo acumulou, as memórias de um espaço continuamente transformado, tão fugidio como o próprio tempo.[...]
O que sabemos dos lugares é coincidirmos com eles durante um certo tempo no espaço que são. O lugar estava ali, a pessoa apareceu, depois a pessoa partiu, o lugar continuou, o lugar tinha feito a pessoa, a pessoa havia transformado o lugar.

José Saramago, Palavras para uma Cidade.

5 comentários:

Paulo G. Trilho Prudêncio disse...

Viva João.

Bela escolha.

Abraço.

Isabel X disse...

Tão bela a atitude de Pilar del Rio durante as cerimónias fúnebres de Saramago. Digna. Como se em si, na sua figura tão gentil, se conjugassem o Amor e a Morte...

Lindo e trite o sorriso de quem sabe um segredo só dela...

- Isabel X -

Cláudia - Brasil disse...

Há lugares e pessoas, pessoas e lugares, mas, em termos, um lugar que era Portugal, chama-se Saramago.
Pois, este país chamado Saramago, desapropiou-se da pessoa para ser um colóquio universal:
de falas,
conceitos e,
primores.
Como entender esta conveniência de valores...
A qual, deveras uma pessoa responder por entre tantas, e, apenas de tantas, outras sem causa dispersarem valores?

O mundo perdeu um Portugal de muitos Saramagos...

Xico disse...

Disse Saramago que a responsabilidade do homem é a responsabilidade do escritor. Sendo contemporâneo de Saramago também me é difícil separar o escritor do homem que nunca denunciou o gulag e que apoiou com a sua palavra as maiores ditaduras do século XX e XXI e que defendeu a implantação de uma ditadura em Portugal.
Se o escritor merece honras pela escrita, ficava bem um maior comedimento pelo homem que foi. Afinal foi ele próprio quem afirmou, em relação a Gunter Grass: "Nunca separei o escritor da pessoa que o escritor é. A responsabilidade de um é a responsabilidade de outro”

Chantre disse...

Caro Xico
Essas coisas podem pensar-se, mas nunca dizer-se! Pelo menos, para já...