sábado, 31 de janeiro de 2009
Fim de ciclo
sexta-feira, 30 de janeiro de 2009
República
O caso: as fontes e os factos
quinta-feira, 29 de janeiro de 2009
31 de Janeiro no Montijo
Conversas no Arquivo
Património Bordalos
quarta-feira, 28 de janeiro de 2009
Homenagem a Ferreira da Silva
A caminho de Peniche (Agosto de 1919)
terça-feira, 27 de janeiro de 2009
Recessão ou depressão?
O cálculo eleitoral
segunda-feira, 26 de janeiro de 2009
"Ponto G"
domingo, 25 de janeiro de 2009
Museu Malhoa
Beneficiando da iniciativa da Liga dos Amigos do Museu de José Malhoa, integrei-me na visita guiada que ontem a Dr.ª Matilde Tomás do Couto, Directora do Museu, realizou. Oportunidade para observar as obras de remodelação, inauguradas a 19 de Dezembro, numa cerimónia a que não pude comparecer.
sábado, 24 de janeiro de 2009
"Oviamente"
Afinou oviamente a voz e perorou. A situação é uma complicação, oviamente, se o projecto do PP for aprovado.
Perguntou a jornalista em estúdio: - que pode suceder, então, nesta votação?
O Governo não devia ter deixado a complicação chegar aqui, oviamente. A classe social dos professores está muito mobilizada. Oviamente.
Classe social, complicação, oviamente.
Como explica a dramatização feita pelo líder parlamentar? - insiste a jornalista junto do comentador.
Mas este por quem verdadeiramente se interessa é pelo Ministro Parlamentar que ainda agora intreviu.
Oviamente. Intreviu. De intrever. Tu intrevaz, ele intreviu.
Mário Soares na Foz do Arelho (3)
Mário Soares na Foz do Arelho (2)
sexta-feira, 23 de janeiro de 2009
Mário Soares na Foz do Arelho (1)
quinta-feira, 22 de janeiro de 2009
República
quarta-feira, 21 de janeiro de 2009
Disse o Presidente Barack H. Obama. Comentou Jorge Sampaio
[...] Para onde quer que olhemos, há trabalho a fazer. O estado da economia pede acção corajosa e rápida, e nós vamos agir – não só para criar novos empregos, mas para lançar novas bases de crescimento. Vamos construir estradas e pontes, redes eléctricas e linhas digitais que alimentem o nosso comércio e nos liguem uns aos outros.
Vamos recolocar a ciência no seu devido lugar e dominar as maravilhas da tecnologia para elevar a qualidade do serviço de saúde e diminuir o seu custo. Vamos domar o sol e os ventos e a terra para abastecer os nossos carros e pôr a funcionar as nossas fábricas. E vamos transformar as nossas escolas e universidades, para satisfazer as exigências de uma nova era.
Podemos fazer tudo isto. E tudo isto iremos fazer. Há alguns que, agora, questionam a escala das nossas ambições, sugerem que o nosso sistema não pode tolerar muitos planos grandiosos. A memória deles é curta. Esqueceram-se do que este país já fez; e do que homens e mulheres livres podem fazer quando à imaginação se soma um objectivo comum, e à necessidade se alia a coragem.
O que os cínicos não compreendem é que o chão se mexeu debaixo dos seus pés, que os imutáveis argumentos políticos que há tanto tempo nos consomem já não se aplicam. A pergunta que hoje fazemos não é se o nosso governo é demasiado grande ou demasiado pequeno, mas se funciona, se ajuda famílias a encontrar empregos com salários decentes, cuidados de saúde que possam pagar, pensões de reformas que sejam dignas. Onde a resposta for sim, tencionamos seguir em frente. Onde a resposta for não, os programas chegarão ao fim.
E a todos aqueles que gerem o dinheiro do povo serão pedidas responsabilidades – para que gastem com sensatez, reformem maus hábitos e conduzam os nossos negócios à luz do dia – porque só assim poderemos restaurar a confiança fundamental entre o povo e o seu governo.
Não se coloca sequer para nós a questão de saber se o mercado é uma força positiva ou negativa. O seu poder de gerar riqueza e de aumentar a democracia não tem paralelo, mas esta crise lembrou-nos que, sem um olhar vigilante, o mercado pode ficar fora de controlo, e que uma nação não pode prosperar quando só favorece os que já são prósperos. O sucesso da nossa economia sempre dependeu não só da dimensão do nosso Produto Interno Bruto, mas do alcance da nossa prosperidade; da nossa capacidade em oferecer oportunidades a todos, não por caridade, mas porque é o caminho mais seguro para o nosso bem comum.
Este é o preço e a promessa da cidadania [...]
Curiosamente - embora possa ter entendido mal, porque acabei por ouvir parte da intervenção no Times Square -, registei uma frase dita logo no início - "a nossa nação está em guerra" -, que me parece ser um dos fios condutores de todo o discurso. Repare-se, contudo, que a dinâmica resultante desta afirmação já nada tem que ver com lógicas belicistas de má memória, sendo, ao invés, desenvolvido todo um outro tipo de abordagem que desemboca num apelo à união, à tolerância, à cooperação, à solidariedade, condicentes a uma nova era de paz.
Da consciência da gravidade dos desafios - tão sérios que explicam a metáfora do estado de guerra - decorre boa parte dos restantes argumentos, tal como: a revisitação feita da história da América; o apelo à unidade nacional e à necessidade de um sobressalto patriótico; a invocação repetida do sentido de responsabilidade individual e colectiva; enfim, a reiterada afirmação da certeza de que os americanos conseguirão vencer os reptos presentes e "refundar a América", encetando uma nova era de desenvolvimento e solidariedade, fiel aos valores da igualdade, da liberdade e dignidade de todos os homens e povos, fundadores da democracia americana. É um discurso realista, em que se alia ao tom grave o sinal da confiança, em que a nação é chamada a assumir responsabilidades, cerrar fileiras e deitar mãos à obra, na certeza de que assim se conseguirá um futuro melhor para todos. Sob reserva de uma leitura atenta, estas são as minhas primeiras impressões a quente, ou melhor, a frio, porque aqui está um tempo gélido.
terça-feira, 20 de janeiro de 2009
Yes, we can
Há mais défice?
Bons dias, bons dias! Bonitas!
segunda-feira, 19 de janeiro de 2009
Setora em greve
A caminho de Peniche (Agosto de 1919)
Mr. Tambourine Man
domingo, 18 de janeiro de 2009
Um Congresso para?
À janela (Matisse)
Pierre Schneider escolheu este quadro para a ilustração da obra monumental em 752 páginas que dedicou a Matisse (Matisse, Paris Flammarion, 1984, nova edição 1992).O quadro representa um par (de facto, o próprio pintor e sua mulher, Amèlie) e mostra a dualidade sobre a qual assenta a relação: linhas direitas e linhas curvas, de pé e sentado, interior e exterior. A janela separa e une. Partindo da dualidade, cria cumplicidade.
Uma curiosa leitura desta obra é proposta por Schneider, que mostra como Matisse se separou do modelo de representação do casal estabelecido por Van Eyck em Arnolfini Portrait (1434), buscando inspiração no modelo da Annunciation de Fra Angelico (ca. 1450).
Les Epoux Arnolfini de Van Eyck oferecia o modelo mais conseguido do género. Marido e mulher dão-se a mão. O laço que os une é materializado através de um contacto físico sem insistência: sinal de consentimento e não se sujeição.[…] É o que se teria passado em La Conversation, se a janela - a arte – não tivesse vindo interromper aquela relação. A janela separou os dois esposos, substituindo, como se tivessem acabado de receber uma notícia grave inesperada, a calma familiar por um clima de solenidade hierática.
E de facto um novo esquema composicional é agora introduzido, a meio caminho, tanto formalmente como pelo seu sentido, entre o quadro do casal e o da trindade teofânica: o da anunciação, onde uma das personagens revela à outra a existência da divindade, a qual no entanto é apenas implícita, formando um triângulo cujo vértice dominante é invisível. Na Conversation, o homem surge separado da mulher, como o anjo da Virgem, em inúmeras Anunciações, pensando nomeadamente na de Fra Angélico nas Cenas da Vida de Jesus Cristo, onde o que os separa é uma janela aberta sobre um jardim […]
Pierre Schneider, op. cit. p. 22-23
A caminho de Peniche (Agosto de 1919)
sábado, 17 de janeiro de 2009
Médicos, charlatães e melgas nas Caldas (fins do século XVIII)
sexta-feira, 16 de janeiro de 2009
Poder local
quinta-feira, 15 de janeiro de 2009
Vontade e movimento
15 de Janeiro
Munch, Melancholy, 1894-1895.
quarta-feira, 14 de janeiro de 2009
Reformar a escola pública
Há uma questão, no meio de muitas outras claro, que ficou no ar: uma escola só se reforma de fora para dentro. Não concordo, mas não concordo mesmo, com esta asserção: não cabe neste espaço a discussão, mas se alguém estiver interessado no assunto estou completamente disponível para esse importante debate.
Confiança na escola pública?
Futebol de salão
terça-feira, 13 de janeiro de 2009
Melancolia (s)
Não sei o que mais impressiona neste quadro do jovem pintor de Córdova: se a (irónica?) paleta de cores, se a rigidez da atitude do corpo de formas vincadas, se o olhar que se desprende do livro para nos olhar sem nos ver.
Vinho do Porto
Centenas de moldes centenários das peças de cerâmica de Rafael Bordalo Pinheiro estão guardados numa cave da Fábrica de Faiança das Caldas da Rainha. Com a fábrica em risco de fechar, o que irá acontecer à vespa, às rãs, aos golfinhos mitológicos e a toda a fauna e flora criados por Bordalo? Há quem apele ao Estado para que ajude a manter vivo este património. A artista plástica Joana Vasconcelos, que tem vendido muitas peças feitas a partir de Bordalo, garante que esta produção tem toda a viabilidade económica.
Na sexta-feira, a vespa gigante ainda estava no forno. Só dois dias depois é que se saberia se o animal, criado há mais de um século por Rafael Bordalo Pinheiro e recriado agora a partir do molde original, sairia bem. "É a primeira que se fabrica desde 1900. Isto é histórico", diz a técnica de cerâmica Elsa Rebelo. Só há uma vespa igual a esta, é centenária, e está ali mesmo ao lado, num muro da fábrica de cerâmica das Caldas da Rainha.
Na loja da fábrica já resta muito pouco. As prateleiras foram-se esvaziando ao longo das últimas semanas ao ritmo das notícias sobre a crise económica e os riscos de encerramento das Faianças Artísticas Bordalo Pinheiro.
Mas quem passar para lá da loja, atravessar o jardim, com o laguinho em redor do qual ainda estão alguns dos animais do tempo de Bordalo Pinheiro, passar pelo lobo, pelo golfinho mitológico, pela abelha gigante, e seguir até às oficinas da fábrica, vai encontrar alguns operários (trabalham aqui cerca de 12 ou 13 pessoas) agarrados às peças que fazem à mão há anos.
Uma delas está a decorar uma concha enorme com limos e musgo, molhando o barro com uma esponja, corrigindo os defeitos com uma faca pequena, e adicionando os detalhes. Na bancada em frente, outro operário faz folhinhas a partir de um molde de gesso. Encostados a uma parede estão duas cabeças de cavalo gigantes, um banco em forma de cogumelo e uma réplica do lobo e a cegonha.
"Esta" - Elsa aponta para a peça dos dois animais - "esteve três ou quatro meses para secar, está à espera de ser pintada a pincel com vidrados cerâmicos, e depois ainda terá nova cozedura." Quem encomendar uma peça desta dimensão terá, por isso, que se preparar para esperar alguns meses, sobretudo se o tempo estiver húmido, o que atrasa o processo de secagem.
São, todas elas, peças que só voltaram à vida há poucos anos, depois do lento e complexo processo de recuperação dos moldes centenários de Bordalo. "O cavalo foi feito há menos de um ano. O caracol é muito recente, ainda só fizemos dois ou três." Desmembrada ainda está uma enorme lagosta, porque os animais gigantes são feitos em vários bocados e depois de saírem do forno têm ainda de ser montados.
A montagem tem a dificuldade acrescida de os animais serem curvos, sem uma base estável, porque foram, em muitos casos, concebidos para decorar beirais de telhados. "Bordalo tinha uma equipa de técnicos que, como nós hoje, estudavam em conjunto a melhor maneira de fazer as coisas", diz Elsa, que é, ela própria, filha de ceramistas. "Por vezes chegamos a estar três, quatro ou cinco pessoas à volta de uma peça a pensar 'como é que vamos fazer isto?'"
Um chalé de cortiça
Desde há oito ou nove anos que os operários especializados começaram a recuperar os moldes originais do criador da figura do Zé Povinho, guardados numa cave, e a tentar refazer as peças - primeiro as mais pequenas e depois, à medida que iam ganhando confiança, as maiores, até chegarem aos animais gigantes. Depois, um dia, há poucos anos, a artista plástica Joana Vasconcelos visitou a fábrica, apaixonou-se pelos animais e começou a fazer encomendas. A vespa que sexta-feira estava no forno é para ela.
Mas este é um mundo em risco. As Faianças Artísticas Bordalo Pinheiro estão à beira da falência, os 172 operários já não recebem há dois meses, e Jorge Serrano, o principal dos treze sócios da empresa, não vê possibilidades de a empresa continuar a funcionar depois da quebra brutal das encomendas, feitas sobretudo pelos Estados Unidos, da louça de fabrico industrial que nos últimos tempos garantiu a sobrevivência do negócio.
Catarina Portas, que vende peças de Bordalo - incluindo as célebres andorinhas - na sua loja A Vida Portuguesa, em Lisboa, lançou o alerta numa crónica recente no P2: "Na minha loja, vendo Bordalo Pinheiro. E porque vejo o brilho nos olhos dos designers ou jornalistas estrangeiros quando miram e compram uma peça Bordalo, asseguro-vos que este é um património que pode e deve ser explorado comercialmente. E terá sucesso. Assim exista compreensão para mudar uma estratégia seguida nos últimos anos que fez a Bordalo crescer, preferindo a grande produção para exportação de loiça quase corriqueira e facilmente copiável, em vez de apostar seriamente naquilo que mais ninguém tem nem sabe fazer, a delicada e laboriosa reprodução do seu acervo."
Um apelo que é repetido por Joana Vasconcelos. "Há um património do Rafael mal estimado, que devia ser uma coisa do país e não propriedade de uma fábrica", diz, indignada. Descobriu-o quando estava a preparar uma exposição no Museu Bordalo Pinheiro. "Estava a trabalhar com o sapo, e dou de caras com aquele caranguejo gigante. 'Há mais disto?', perguntei." Depois não parou. "Andamos há quatro anos a tentar recuperar a vespa, é um trabalho de enorme complexidade técnica."
Às vozes que pedem um apoio para salvar a herança de Bordalo junta-se a de Raquel Henriques da Silva, investigadora e professora de História de Arte. "A crise está ligada à fábrica de produção corrente, em massa, essa é a área que entrou em ruptura. Por seu lado, o núcleo histórico tem vindo a ser reactivado, e agora corre o risco de ser engolido nesta crise."
Uma jarra com 2,5 metros
A fábrica começou a funcionar em 1884, mas uma década depois a situação era já bastante difícil. Em 1895, Bordalo recebeu do político José Relvas uma encomenda para fazer uma jarra. Decidiu dedicá-la a Beethoven e fazê-la enorme. "Tinha 2,60 metros", conta Elsa. João B. Serra, professor na Escola Superior de Artes e Design das Caldas da Rainha, explica, num texto publicado na Gazeta das Caldas, a importância que a jarra teve na altura: "Encarada como uma extravagância bordaliana, uma provocação de génio aos condicionamentos do processo cerâmico, a Jarra Beethoven pode talvez ser tomada como uma tentativa de esconjurar a maldição de uma empresa que falhara sucessivamente os projectos industriais que presidiram à sua criação. Certo é que a maldição se abateu cedo sobre a própria jarra."
José Relvas achou-a demasiado grande e, depois disso, "a jarra deambulou ao longo dos anos 1898 e 1899 entre Caldas e Lisboa [...] e entre Lisboa e Rio de Janeiro, sempre em busca de um comprador que lhe fizesse jus". Para tentar salvar a fábrica, Bordalo viajou com a jarra até ao Brasil na esperança de a vender. Foi leiloada, mas ficou numa rifa que não fora comprada por ninguém. Sem mais alternativas, Bordalo acabou por a oferecer às autoridades brasileiras. Hoje, conclui João Serra, "permanece prisioneira da sua maldição, num discreto recanto do Museu das Belas-Artes do Rio de Janeiro".
Rafael Bordalo Pinheiro morreu em 1905, a fábrica foi vendida em hasta pública, mas o filho, Manuel Gustavo, conseguiu recuperar na justiça os moldes centenários que lhe pertenciam por herança. "Os operários não quiseram um novo patrão, por isso juntaram-se a Manuel Gustavo e, mesmo em ateliers emprestados, nunca pararam de trabalhar", conta Elsa. Três anos depois da morte do pai, Manuel Gustavo fundou, no terreno ao lado do original, a Fábrica San Rafael. Com a sua morte, em 1920, um grupo de caldenses tomou conta da fábrica. "Houve vários ciclos e tornou sempre a renascer. Espero que desta vez aconteça o mesmo."
Mas se a Jarra Beethoven é peça única, outras que Bordalo fez não precisam de o ser (embora no museu da fábrica das Caldas existam algumas que também estão condenadas a isso, por não terem já molde, como o São Jorge e o Dragão que está à entrada do museu). Existe uma cave cheia até ao tecto de moldes de gesso, cuidadosamente arrumados e identificados. A lápis está escrito o que o formato redondo do exterior do molde não deixa perceber: "vespa", "a cegonha e o lobo". Mais à frente, numa prateleira, estão os bustos, de Camilo Castelo Branco, Ramalho Ortigão, Eça de Queirós e do próprio Rafael Bordalo Pinheiro, no meio de um medalhão de frutos.
"Começou-se a arrumar os moldes nesta cave e, paralelamente, a recuperar peças, mas de pequeno porte, como o Arola, a figura do imigrante português que volta do Brasil, e que há tempo que não se produzia", continua Elsa. "Há cinco ou seis anos decidimos aventurar-nos nas peças gigantes. E isso é outro mundo. Um molde recente da vespa ou da lagosta pesa, no seu conjunto, uns 500 ou 600 quilos. São precisos seis homens para o virar ao contrário. O custo de recuperação destas peças é avultadíssimo." Os moldes antigos são cheios uma última vez, o bloco de barro que sai desse molde é depois trabalhado, para acentuar os relevos, e daí é tirado um novo molde.
Quando estas figuras, há muito desaparecidas, recomeçaram a aparecer nas lojas da fábrica, "as pessoas ficaram muito admiradas, mesmo os caldenses, que não conheciam muitas delas". Alguns tinham fotografias antigas onde se podia ver um ou outro daqueles bichos, "outros, mais idosos, lembravam-se de algumas destas peças, como os caracóis, a decorar o parque D. Carlos I nas Caldas".
Apesar da situação da fábrica, Elsa Rebelo parece ter uma energia renovada enquanto anda de um lado para o outro, recebendo jornalistas e visitantes. "Temos trabalhado aqui, a fazer arqueologia industrial, sem um cêntimo de apoio de lado nenhum, e, no fundo, a salvaguardar um património que pertence a um país." Se não surgir uma solução para a fábrica, corre-se o risco de perder este património - que é também humano, já que estes são operários especializados em cerâmica bordaliana e não existe hoje (ao contrário do que acontecia no tempo de Bordalo) uma escola que ensine estas técnicas específicas às gerações mais novas.
Reinventar Bordalo
"Se se perder esta dinâmica é muito difícil voltar a encontrá-la", avisa Raquel Henriques da Silva, defendendo "um apoio especial do Governo para garantir que este núcleo histórico possa continuar". É preciso, diz, "reactivar a produção destas peças gigantescas, que são um deslumbre, são de uma beleza perturbante".
A intervenção de Joana Vasconcelos e as encomendas de Catarina Portas são prova do potencial comercial deste núcleo, acredita Raquel Henriques da Silva. "O que estimulou o Bordalo está a voltar a acontecer. Ele era um artista interessado em dar uma feição moderna [à cerâmica das Caldas]. Agora está a acontecer com a Joana Vasconcelos." É importante, frisa, que estes moldes não vão parar a um museu, mas que se mantenha a produção viva. "Gostava que um economista me provasse que isto não tem viabilidade económica."
Joana Vasconcelos confirma. "Estamos a falar de um grande artista português. Aquilo devia ser património do Estado, e estimado como tal. Além disso, tem valor comercial. Podia ser vendido como objecto de luxo, topo de gama, da nossa cultura. Eu própria vendo estas peças e apercebi-me do poder comercial que elas têm." Uma das suas sugestões é a de que se convidem designers para fazer novas obras a partir daqueles moldes, reinventando o trabalho de Bordalo com uma visão contemporânea. "Cada vez que lá vou arrepio-me a pensar nas peças fantásticas que estão naqueles moldes."
Para explicar o que está em causa, Raquel Henriques da Silva usa uma comparação: "É como se o vinho do Porto estivesse em risco de acabar submerso em vinho a martelo."
Interrogado sobre o assunto, na sexta-feira, o ministro da Cultura, José António Pinto Ribeiro, disse à Rádio Renascença que considera muito importante conservar os moldes, mas que o mais importante é "manter aquela fábrica viva" e que isso não passa pelo seu ministério. "Ultrapassa-me completamente enquanto ministro da Cultura." O P2 contactou o Ministério da Economia, mas não foi possível obter uma resposta em tempo útil.
Elsa Rebelo não desanima e continua a fazer planos. Olha para um par de rãs debaixo de uma bananeira, uma delas com um pequeno leque na mão, numa peça já danificada. "O molde das rãs está a desfazer-se completamente. Se não for impossível, será pelo menos muito difícil recuperar este par de rãs. Mas eu ainda não desisti de o pôr em pé."
Texto: Alexandra Prado Coelho
Foto: Pedro Cunha
in Jornal Público | 13 de Janeiro de 2009