[...] Para onde quer que olhemos, há trabalho a fazer. O estado da economia pede acção corajosa e rápida, e nós vamos agir – não só para criar novos empregos, mas para lançar novas bases de crescimento. Vamos construir estradas e pontes, redes eléctricas e linhas digitais que alimentem o nosso comércio e nos liguem uns aos outros.
Vamos recolocar a ciência no seu devido lugar e dominar as maravilhas da tecnologia para elevar a qualidade do serviço de saúde e diminuir o seu custo. Vamos domar o sol e os ventos e a terra para abastecer os nossos carros e pôr a funcionar as nossas fábricas. E vamos transformar as nossas escolas e universidades, para satisfazer as exigências de uma nova era.
Podemos fazer tudo isto. E tudo isto iremos fazer. Há alguns que, agora, questionam a escala das nossas ambições, sugerem que o nosso sistema não pode tolerar muitos planos grandiosos. A memória deles é curta. Esqueceram-se do que este país já fez; e do que homens e mulheres livres podem fazer quando à imaginação se soma um objectivo comum, e à necessidade se alia a coragem.
O que os cínicos não compreendem é que o chão se mexeu debaixo dos seus pés, que os imutáveis argumentos políticos que há tanto tempo nos consomem já não se aplicam. A pergunta que hoje fazemos não é se o nosso governo é demasiado grande ou demasiado pequeno, mas se funciona, se ajuda famílias a encontrar empregos com salários decentes, cuidados de saúde que possam pagar, pensões de reformas que sejam dignas. Onde a resposta for sim, tencionamos seguir em frente. Onde a resposta for não, os programas chegarão ao fim.
E a todos aqueles que gerem o dinheiro do povo serão pedidas responsabilidades – para que gastem com sensatez, reformem maus hábitos e conduzam os nossos negócios à luz do dia – porque só assim poderemos restaurar a confiança fundamental entre o povo e o seu governo.
Não se coloca sequer para nós a questão de saber se o mercado é uma força positiva ou negativa. O seu poder de gerar riqueza e de aumentar a democracia não tem paralelo, mas esta crise lembrou-nos que, sem um olhar vigilante, o mercado pode ficar fora de controlo, e que uma nação não pode prosperar quando só favorece os que já são prósperos. O sucesso da nossa economia sempre dependeu não só da dimensão do nosso Produto Interno Bruto, mas do alcance da nossa prosperidade; da nossa capacidade em oferecer oportunidades a todos, não por caridade, mas porque é o caminho mais seguro para o nosso bem comum.
[...] Os nossos desafios podem ser novos. Os instrumentos com que os enfrentamos podem ser novos. Mas os valores de que depende o nosso sucesso – trabalho árduo e honestidade, coragem e fair play, tolerância e curiosidade, lealdade e patriotismo – esses são antigas. Estas coisas são verdadeiras. Têm sido a força silenciosa do progresso ao longo da nossa história. O que é pedido, então, é o regresso a essas verdades.
O que nos é exigido agora é uma nova era de responsabilidade, um reconhecimento, da parte de cada americano, de que temos obrigações para connosco, com a nossa nação, e com o mundo, deveres que aceitamos com satisfação e não com má vontade, firmes no conhecimento de que nada satisfaz mais o espírito, nem define o nosso carácter, do que entregarmo-nos todos a uma tarefa difícil.Este é o preço e a promessa da cidadania [...]
Um primeiro comentário: "Um discurso realista"
Um discurso de uma enorme lucidez, sobriedade e firmeza, marcado por uma clara preocupação de inclusividade e exprimindo, digamos, os valores de um "novo humanismo".
Curiosamente - embora possa ter entendido mal, porque acabei por ouvir parte da intervenção no Times Square -, registei uma frase dita logo no início - "a nossa nação está em guerra" -, que me parece ser um dos fios condutores de todo o discurso. Repare-se, contudo, que a dinâmica resultante desta afirmação já nada tem que ver com lógicas belicistas de má memória, sendo, ao invés, desenvolvido todo um outro tipo de abordagem que desemboca num apelo à união, à tolerância, à cooperação, à solidariedade, condicentes a uma nova era de paz.
Da consciência da gravidade dos desafios - tão sérios que explicam a metáfora do estado de guerra - decorre boa parte dos restantes argumentos, tal como: a revisitação feita da história da América; o apelo à unidade nacional e à necessidade de um sobressalto patriótico; a invocação repetida do sentido de responsabilidade individual e colectiva; enfim, a reiterada afirmação da certeza de que os americanos conseguirão vencer os reptos presentes e "refundar a América", encetando uma nova era de desenvolvimento e solidariedade, fiel aos valores da igualdade, da liberdade e dignidade de todos os homens e povos, fundadores da democracia americana. É um discurso realista, em que se alia ao tom grave o sinal da confiança, em que a nação é chamada a assumir responsabilidades, cerrar fileiras e deitar mãos à obra, na certeza de que assim se conseguirá um futuro melhor para todos. Sob reserva de uma leitura atenta, estas são as minhas primeiras impressões a quente, ou melhor, a frio, porque aqui está um tempo gélido.
Curiosamente - embora possa ter entendido mal, porque acabei por ouvir parte da intervenção no Times Square -, registei uma frase dita logo no início - "a nossa nação está em guerra" -, que me parece ser um dos fios condutores de todo o discurso. Repare-se, contudo, que a dinâmica resultante desta afirmação já nada tem que ver com lógicas belicistas de má memória, sendo, ao invés, desenvolvido todo um outro tipo de abordagem que desemboca num apelo à união, à tolerância, à cooperação, à solidariedade, condicentes a uma nova era de paz.
Da consciência da gravidade dos desafios - tão sérios que explicam a metáfora do estado de guerra - decorre boa parte dos restantes argumentos, tal como: a revisitação feita da história da América; o apelo à unidade nacional e à necessidade de um sobressalto patriótico; a invocação repetida do sentido de responsabilidade individual e colectiva; enfim, a reiterada afirmação da certeza de que os americanos conseguirão vencer os reptos presentes e "refundar a América", encetando uma nova era de desenvolvimento e solidariedade, fiel aos valores da igualdade, da liberdade e dignidade de todos os homens e povos, fundadores da democracia americana. É um discurso realista, em que se alia ao tom grave o sinal da confiança, em que a nação é chamada a assumir responsabilidades, cerrar fileiras e deitar mãos à obra, na certeza de que assim se conseguirá um futuro melhor para todos. Sob reserva de uma leitura atenta, estas são as minhas primeiras impressões a quente, ou melhor, a frio, porque aqui está um tempo gélido.
Jorge Sampaio (Diário de Notícias, 21 de Janeiro)
Antigo Presidente da República Portuguesa
Alto Representante da ONU para o Diálogo das Civilizações
7 comentários:
Gostei do que "Disse o Presidente Barack H. Obama", mas como disse num comentario anterior,a linha do horisonte é até nós vemos. As suas propostas têm, e muito bem como Presidente, um olhar global quado nos diz: "O que nos é exigido agora é uma nova era de responsabilidade, um reconhecimento, da parte de cada americano, de que temos obrigações para connosco, com a nossa nação, e com o mundo, deveres que aceitamos com satisfação e não com má vontade, firmes no conhecimento de que nada satisfaz mais o espírito, nem define o nosso carácter, do que entregarmo-nos todos a uma tarefa difícil".
Acredito, o pensamento que tiro de tudo o que ele disse é positivo.
João Ramos Franco
Gosto principalmente da "...força silenciosa do progresso ao longo da nossa história." São raros os momentos em que nos sentimos também ser esse momento: "So help me God!"
- Isabel X -
"Os nossos desafios podem ser novos. Os instrumentos com que os enfrentamos podem ser novos. Mas os valores de que depende o nosso sucesso – trabalho árduo e honestidade, coragem e fair play, tolerância e curiosidade, lealdade e patriotismo – esses são antigas. Estas coisas são verdadeiras."
MV
Gostei deste discurso forte, embora contido, com imagens simples mas eficazes. Ao contrário da maioria dos comentadores que achou este discurso discreto, achei-o um exclente discurso, cuidadosamente medido, contado e pesado.
MT
Também pensei que os comentadores não tinham bom senso ao analisarem este discurso da forma que fizeram. Até parece que não sabem distinguir campanha eleitoral e tomada de posse como presidente dos E.U.A.!
- Isabel X -
Este é um discurso cuidadoso de um homem que sabe que o excesso de expectativas é o seu pior inimigo. Ao contrário do seu antecessor, que prometia o "paraíso americano" para o Mundo e nos deixou no Inferno em que vivemos.
Nesse aspecto, é um bom começo.
Sentir a História, esperando que a missão de Obama se cumpra, transformada em mais um combate pela História.
A tentação de comparar Obama com kennedy paira em todas as mentes e em muitas análises.Esperemos que a presidência de Obama seja melhor e com final feliz, no final dos dois mandatos que lhe estão reservados.
A minha esperança e desejos é que estejamos no início de uma nova era, de liberdade, igualdade e fraternidade, combate longe de estar ganho...
NB
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