sexta-feira, 25 de março de 2011

Disse ele

Insustentável.

1 comentário:

Cláudia disse...

Kundera, diz, que insustentável é a leveza do ser.
Penso, outro modo.

À bordo do Núbiak, o homem de Deus. Um objeto vinha rolando sinuosamente após ter cruzado a extensão da cabine aos movimentos que oscilava a maré.
O capitão Óliver distante e revirava a arca.
Aos pés do padre a peça, persistia batendo. Do incômodo ruído, levanta a batina e pronto a chutar. A surpresa, um cálice. Há tempos, sem um para celebrar. Longa é a data que a cuia, ampara o vigor da comunhão.
Extasiado, sente a tentação de tocá-lo. Segurar firme, o símbolo com significado da partilha.
O que poderia ter mais valor, neste fim de mundo... Atirado, pedindo para ser levado e elevado. Um cálice de verdade. O padre sonhador, suspira.
- Tomai e babei...
Quando o capitão, pressenti o sussurro:
- Tuas palavras padre?
O susto fez o padre recobrar o sentido e temeroso sem entender viu-se com o objeto nas mãos. O capitão de costas, continuava sua busca revirando a arca.
O padre atrapalhado puxou a gola do pescoço e jogou para dentro, levantando expressou.
- Receio o adiantado da noite, os aldeões darão por minha falta...
- Não se demora, creio estar por aqui... Retruca o capitão atrapalhado.
Para Mêno, os pensamentos açoitavam. Aterrorizado pelo ato, um tiritar de queixo, ressoa e pondera ao desafiador golpe.
- Deus meu!... Ter que surrupiar um ladrão. Como suportar esta maldade e tal desgosto. Os soluços começaram a tomá-lo de arrependimento. Prestes a desfazer-se da fraqueza, ligeiramente esforça-se para alcançar a pequena peça. Com dificuldade contorce o braço junto do peito, arcando-se. Quando a passos dali:
- Padre! Padre! Achei... Seu presente!
Tomado pelo pânico padre Mêno, ficara sem tempo de largar.
A proximidade do capitão ofereceu mais angústia. Eis, para a desgraça do pobre homem o capitão, trás nas mãos outro, cálice.
Ao aproximar-se com a peça que esplendorosa e maior, oferece ao padre que de pé, hesita recebê-la. Pois, não quer acreditar no destino. De repente, tonto, cambaleia. Sendo erguido pelo capitão.
- Estou bem, estou bem. Com a mão elevada à altura do peito.
- Dói seu coração, padre? Aonde aqui...
- Não me toque pelo amor de Deus. Respirava fundo, possuído pelo terror. Apontou o dedo e descerrou.
- Se acaso achas que vou compactuar, com hediondo aceitando um furto de alguma igreja... Neste ato malogrado? Enganas-te...
O padre estava de olhos pregados no fabuloso cálice do corsário. Com nervos a flor da pele, tentava aliviar a tensão, com incessantes esfregões na testa.
O capitão em insistência.
- Vos estais arredio por este objeto, o que entendeis das fraquezas da alma? Um ser tão virtuoso, superior, abnegado. Sem intimidades com o pecado.
- Cale-se em nome do Senhor, não percebes o quanto estou mau. Aos gritos, possuído por um incompreensível desconforto o padre tomou distância do capitão, e tentou repousar. Estirado ofegante, por vias de um colapso.

Fragmento - Ilha da Magia, ep. Beijando a Face de Deus, pg. 197