terça-feira, 10 de abril de 2012

Registo

Martins Sarmento, fotógrafo
Prosseguindo a tarefa de recuperar memorias fotográficas vimaranenses, o projecto “Reimaginar Guimarães” , da responsabilidade da programação de cinema e audiovisual da Capital Europeia da Cultura, efectua agora uma incursão no espólio fotográfico de Francisco Martins Sarmento, depois de nos ter proposto uma descoberta da cidade através da colecção fotográfica da associação “A Muralha”.
Para muitos será uma revelação. De Martins Sarmento (1833-1899) conhecem-se algumas das áreas em que se desdobrou a versatilidade do seu labor de homem de cultura, da arqueologia à etnografia, mas permaneceu quase desconhecida a sua actividade como fotógrafo. A julgar por uma observação perfunctória da colecção de negativos e provas conservada na Sociedade que tem o seu nome, estamos perante uma actividade a que foi dedicado um interesse continuado, sobre a qual se procurou acumular conhecimento técnico e sobretudo experiência.
A fotografia dava então os primeiros passos, determinada por condições onde se somavam estímulos de teor científico e de teor artístico. Entre os pioneiros da fotografia estão figuras portuguesas, como Frederick William Flower, Carlos Relvas e Carlos de Bragança. E Francisco Martins Sarmento, podemos agora acrescentar.
Antes de se associar ao jornalismo, nos finais do século XIX, a fotografia foi apropriada como recurso por diversas disciplinas, como a medicina, a antropologia ou a arquitectura, enquanto nela se adivinhava também o potencial artístico concorrente com a pintura, tanto nas modalidades de retrato como de paisagem.
Terão sido ambos os registos que seduziram Martins Sarmento. Figura intelectual de primeiro plano da segunda metade do século XIX, integra o conjunto singular de investigadores que recolheu e sistematizou uma imensa massa de conhecimentos sobre Portugal e os portugueses: o território na sua dimensão geográfica e humana, nas suas diversidades regionais e na sua biografia arqueológica e patrimonial; as gentes, na sua dimensão etnográfica, e as suas modalidades culturais, e as suas criações históricas mais significativas.
A paixão de Martins Sarmento pela fotografia é explicável a esta luz. Se se trata de uma paixão, como parece, trata-se de uma paixão congruente com as preocupações de um espírito tão curioso como inquieto. Fascinado pela história, pelos vestígios das culturas perdidas, tanto quanto dos traços das culturas sobreviventes nos seus contemporâneos. Tocado pelo desafio artístico, surpreendendo na fotografia mais do que um meio mecânico de registo, uma forma plástica.

João Serra

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