Joubert: O fim da vida é amargo. Menos de um ano depois de escrever estas palavras, aos sessenta e um anos, o que em 1895 devia parecer uma idade muito mais avançada do que hoje, Joubert cunhou uma formulação muito mais enigmática sobe o fim da vida: Devemos morrer amáveis (se pudermos). Esta frase comove-te, em especial as palavras entre parêntesis, que, no teu entender, demonstram uma rara sensibilidade de espirito, uma dolorosa compreensão de como é difícil ser-se amável, particularmente para quem é velho, quem se afunda na decrepitude e depende dos cuidados de outras pessoas. Se pudermos. Não há provavelmente maior proeza do ser humano do que inspirar amor até ao fim, seja esse fim amargo ou não.
Paul Auster, Diário de Inverno. Memórias. Lisboa, ASA, 2012. p. 168.
quinta-feira, 20 de setembro de 2012
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4 comentários:
Conheço dois casos de muito perto: o de alguém que ficou amargo ao envelhecer e o de alguém muito amável, cada vez mais, à medida que a idade avançava e, com ela, a doença, o sofrimento e a morte. Nunca me ocorreu pensar que isso lhe era difícil, tão grande era a naturalidade com que o fazia.
Quando, após tratá-lo, lhe perguntava se precisava de mais alguma coisa, respondia -me invariavelmente:
"Do teu bem estar!"
- Isabel X -
" (...) Louvado seja (Deus)pelos que passaram / Os tormentos do mundo dolorosos, / E, contentes, sorrindo, perdoaram; / Pela alegria dos que trabalharam, / Pela morte serena dos bondosos.
Louvado seja Deus na mãe querida, / A natureza que fez bela e forte; / Louvado seja pela irmã Vida, / Louvado seja pela irmã Morte."
Francisco de Assis
Morrer, segundo o poeta tão citado,
é apenas "deixar de ser visto". Exige pouco de quem morre, no acto da sua morte.
É na doença terminal que a "amabilidade" (a tenacidade da luta em nome do resto da vida, a dignidade com que se aceita ser humilhado e vencido e a coragem de calar as despedidas) é posta à prova.
E é, afinal, a continuação da vida já vivida.
Volto ao assunto: "Se pudermos" é uma expressão algo enigmática que deixa em aberto muitas hipóteses.
Tudo está na capacidade de perdoar, parece-me. Antes de mais, a si mesmo.
Durante muito tempo considerei que perdoar era um dom. Mais tarde, lendo Hannah Arendt, e aderindo à argumentação que a autora desenvolve sobre o perdão, aprendi que era um poder.
Ou seja: podemos perdoar ou não. Podemos ser amáveis ou não.
- Isabel X -
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