domingo, 22 de julho de 2012

Vasco Pulido Valente e Guimarães 2012


Sou um leitor regular de Vasco Pulido Valente. Tenho acompanhado as suas deambulações jornalísticas e possuo todas as recolhas em livro das suas crónicas. Não sou daqueles que apenas admira a qualidade literária dos seus textos, onde se recupera tanto a ironia de Eça como a verrina de Camilo ou a polémica de Raul Proença. Não há crónica em que não some ao prazer da leitura o encontro com uma ideia sedutora e uma observação pertinente.
A crónica de Vasco da passada sexta-feira é dedicada ao que denomina “Politica de Eventos”,  um tema no qual caberiam em pé de igualdade os Jogos Olímpicos, de Londres (2012) e de Atenas (2004), e a Expo 98 realizada em Lisboa, esta alvo de um balanço particularmente critico.
Não discuto nem esse balanço da Expo 98, nem sequer a comparabilidade da escala dos referidos “eventos” – jogos olímpicos e exposição universal – pois, como e sabido, há diferentes formas de avaliar os impactos económicos e sociais dos investimentos este tipo e, por outro lado, as cidades europeias modernas sempre recorreram a operações em que aliam actividades culturais e desportivas a intervenções urbanísticas. Londres, Paris, Atenas, Lisboa, Turim, Milão, Florença, Berlim, Munique, Amesterdão, Porto, Manchester, Madrid, Barcelona são algumas das que, em distintos momentos da respectiva história, desde a segunda metade do século XIX até hoje, foram palco de grandes Feiras, Exposições, Jogos, Festivais, nos quais procuraram elevar a sua capacidade de atracção de visitantes, a sua projecção económica e politica, a sua notoriedade, em suma.
O texto de Vasco Pulido Valente termina com uma inesperada referencia a Guimarães, cuja Capital da Cultura, nós (os portugueses, claro) nos estaríamos, aliás nos continuaríamos a mostrar, muito orgulhosos. Inesperada porque não suporia que para o autor, Guimarães pudesse situar-se no mesmo patamar de Lisboa 98, Atenas 2004 e Londres 2012. E de facto não situa, nem pelo orçamento nem pela ambição. Eu tenderia a pôr Guimarães 2012 no nível de Lisboa 94 e Porto 2001, já que não posso pedir a um cronista que há décadas comenta o dia a dia da politica portuguesa que conheça o evento “Capitais Europeias da Cultura” e se documente sobre Weimar 1999, Avignon , Bergen, Bolonha, Bruxelas, Helsínquia, Cracóvia, Reykjavik, Praga, Santiago de Compostela 2000, Roterdão 2001, Bruges, Salamanca 2002, Graz 2003, Génova Lille 2004, Cork 2005, Patras 2006, Luxemburgo, Sibiu 2007, Liverpool Stavanger 2008, Linz, Vilnius 2009, Essen, Pécs, Istambul 2010, Turku, Tallinn  2011, para só falar das mais recentes.
Dir-se-ia que a quantidade e qualidade de menções da imprensa portuguesa e internacional a Guimarães 2012 induziu Vasco, leitor assíduo de imprensa, a consagrar uma espécie de sobredimensionamento do “evento”. Mas realmente não se pode equiparar nem no investimento urbanístico nem na mobilização de conteúdos Guimarães a Londres ou Atenas.
Finalmente, Vasco Pulido Valente também se equivoca quando aplica a mesma categoria, “politica de eventos” a Guimarães 2012. Esse é porventura o erro mais grave. Nada em Guimarães aponta nesse sentido. O que se trata é de politica de cidade e de politica cultural, de política pública, portanto. Podemos discutir as opções tomadas, mas elas foram todas orientadas não pela lógica do evento mas pela lógica da valorização do território e das pessoas. É por isso que Guimarães tem merecido visita e aplauso, escrutínio e nota positiva. Mas para isso é preciso vir à cidade, sem preconceito, e aí tentar perceber.
Não posso, assim, concluir esta nota sem um convite ao Vasco, para que nos visite e questione, a partir do que observar e dos critérios que verificar no local. Venha daí. Guimarães não é assim tão longe...

2 comentários:

Isabel X disse...

Há vozes muito inteligentes que, não raras vezes, nos ajudam a pensar e a ver as coisas de um modo invulgar e interessante.

De outras vezes, obscurecem o brilho do argumento nítido, deixando-se tomar pelo vício da crítica, ainda que infundada e sem escrutínio.

Penso que acaba por tornar-se uma espécie de doença...

- Isabel X -

Chantre disse...

Mesmo a um dos três mais lúcidos cronistas da nossa praça (os outros dois são Helena Matos e Alberto Gonçalves - para quando uma comenda pelos bons serviços prestados à higiéne mental do país?) se deve tolerar a desatenção...