Octávio Paz, "O Astro da Alvorada", in A Chama Dupla. Lisboa, Assirio & Alvim, 1995. p.105-106.
segunda-feira, 23 de março de 2009
Escolhemos esse sacrifício
O acaso objectivo, tal como Breton o expõe, apresenta-se como outra explicação do enigma da atracção amorosa. Como as restantes - a bebida mágica, a influência dos astros ou as tendências infantis da psicanálise - deixa intacto o outro mistério, o fundamental: a conjunção entre destino e liberdade. Acidente ou destino, acaso ou predestinação, para que a relação se realize precisa da cumplicidade da nossa vontade. O amor, qualquer amor, implica um sacrifício; contudo, sabendo isto, escolhemos sem pestanejar esse sacrifício. Este é o mistério da liberdade, como admiravelmente o viram os trágicos gregos, os teólogos cristãos e Shakespeare. Também Dante e Cavalcanti pensavam que o amor era um acidente que, graças à nossa liberdade, se transformava numa escolha. Cavalcanti dizia: o amor não é a virtude mas, nascido da perfeição (da pessoa amada), é o que a torna possível. Devo acrescentar que a virtude, seja qual for o sentido que dermos a essa palavra, é primeiro que tudo e sobretudo um acto livre. Em suma, para dizê-lo usando uma enérgica expressão popular: o amor é a liberdade em pessoa. A liberdade encarnada num corpo e numa alma...
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