segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

P'ra aliviar a mente

Aconteceu depois que passando por um caminho ao longo do qual corria um rio muito claro, chegou-me tanta vontade de dizer que comecei a pensar no modo de lhe obedecer: e pensei que falar dela não era conveniente que o fizesse, se eu não falasse a damas em segunda pessoa, mas somente aquelas que são gentis e que não são puras fêmeas. Então digo que a minha língua falou quase como que movida por si mesma, e disse: Damas que haveis intelecção de amor. Estas palavras eu repeti na mente com grande letícia, pensando em tomá-las por meu começo; pelo que depois, regressado à cidade acima mencionada, pensando uns quantos dias, comecei uma canção com este começo, ordenada do modo que se verá abaixo na sua divisão. A canção começa Damas que haveis.


Damas que haveis inteleccção de amor,
eu quero a vós da dama mia falar,
não porque eu creia o seu louvor esgotar,
mas discorrer p'ra aliviar a mente.
[...]
Dante Alighieri, Vida Nova. Tradução, introdução e notas de Jorge Vaz de Carvalho. Lisboa, Relógio d'Agua, 2010.
Henry Holiday, Dante meet Beatrice, 1883.

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