Estávamos em 2005. Não adivinhávamos que a edição portuguesa viria a ter aquela tradução desastrada e muito menos que recairia em Durão Barroso, escolha inexplicável, a elaboração do prefácio. Espero que o meu fraco entusiasmo pelo ensaio não tenha sido influenciado por estes factos aleatórios.
De qualquer modo, se erigir o roteiro dos cafés ao estatuto de roteiro fundamental da Europa é um achado e um achado sugestivo, não parece muito consistente. José Barreto, um especialista na história ( e na geografia) dos cafés (a propósito, amantes de café e de cafés, não percam o seu blog, culto e um pouco azedo como convém, mas recheado de informação pertinente e quase sempre interessantes imagens) contestou-a com soma de argumentos convincentes.
Se a noção de Europa se corporiza nos seus cafés, há várias décadas que começou a perdê-los. Mantiveram-se com esforço alguns cafés históricos, mas os cafés que sobreviveram nas ultimas décadas perderam as funcionalidades que estavam associadas ao acto de beber café e às pessoas que neles paravam – para conspirar, para namorar, para jogar, para observar, para obter informações orais ou escritas, para ver e ser visto, para estudar, para conversar, para beber café e para fumar.
Se a noção de Europa se corporiza nos seus cafés, há várias décadas que começou a perdê-los. Mantiveram-se com esforço alguns cafés históricos, mas os cafés que sobreviveram nas ultimas décadas perderam as funcionalidades que estavam associadas ao acto de beber café e às pessoas que neles paravam – para conspirar, para namorar, para jogar, para observar, para obter informações orais ou escritas, para ver e ser visto, para estudar, para conversar, para beber café e para fumar.
Dos meus cafés, sobram poucos. Nas Caldas, perdi o Lusitano (que aqui podemos ver numa reprodução de um anúncio de 1912), em Lisboa a Capri, o Londres, o Monte Branco, o Monte Carlo. Mas ainda são visitáveis a Biarritz, a Suprema, o Luanda. Em Almada, onde o Carlos Cáceres Monteiro me levou para conhecer a namorada e apresentar a uma amiga momentaneamente solitária, não sobreviveu nenhum daqueles onde aguardavamos ansiosos. Em Castelo Branco, onde dei as primeiras aulas (1970/71) foi em vão que procurei, há tempos, os pontos de encontro com os alunos quase da minha idade. Se foi nestes cafés que a ideia de Europa foi construida (enigmática embora sugestiva metáfora), a sua estrutura material está hoje seriamente abalada.
2 comentários:
Locais deliciosos...com morte lenta...muitos deles ocupados por bancos- sempre o vil metal!-
Salazar chamava-lhes "lugares de ócio e dissolução”.
Já agora...sou apreciadora de café, mas detesto cherne!!!
Vivi alguns anos nos Cafés da Av de Roma, Praça de Londres e Alameda. Comprei o meu primeiro (e único!) livro de Anatomia no Café Luanda no início do ano lectivo de 1971/71 ao Zé Mário Rego.Depois fui conhecendo a "malta chique" do VÁVÁ e da Suprema, as liceais do Roma (hoje penso que Hamburguer house), os bilhares do Londres (o Jorge Theriaga, futuro campeão nacional, era meu colega e companhia nesse ano), as senhoras queques da Mexicana, os intelectuais da Copacabana (onde o João Lourenço bebia chávenas consecutivas de "café de saco"), os estudantes do Império. Tantas estórias...
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