segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Manifestações em Barcelona

Cartazes anti-taurinos, que é como quem diz, a favor da lei que proíbe a partir de 2012 as touradas na Catalunha.
Do outro lado - taurino - gritava-se "Liberdad, liberdad!"

10 comentários:

Cláudia - SC, Brasil disse...

Se me permite Prof. João,
posso realatar que a gente catarinense, litorânea é adepta ao que denominam Farra de Boi, na quaresma e Páscoa.
De algum tempo nasceu protestos para acabar de vez, com a Farra que evoluiu para abusiva.
O protesto trata-se de um capítulo que atesta também, a civilidade desta geração para o rastro brutal da atualidade. Aos farristas do sul do Brasil que resistem a lei da proibição e ainda praticam a brincadeira às escondidas, apoiadas nas touradas da Europa, certamente perdem força se balançarem princípios desta tradição.

As pessoas mudaram, mudou-se comportamentos e para esta causa, advogando o Pe. António Vieira.
" vereis nele o mais puro exemplar da candura, sinceridade e verdade, onde nunca houve dolo ou engano. Para haver tudo isto em nós bastava antigamente ser português, não era necessário ser santo."

O mundo estaria corrompendo a cultura através da violência...
O que significa?
A Cultura tem uma dívida com a História, as distorções em que pontencializam este caos na arte e nas tradições parte da sociedade, que sustenta esta intrincada fomentação na educação dos princípios e valores.
Vai doer nos espanhóis, mas, se tiver que estancar o sangue dos Miúras para educar o povo, que seja. Os desafios não pertencem mais a uma arena, mas ao mundo.

Xico disse...

Tudo isto é uma farsa. A violência sobre os animais está na forma como se produz carne para alimento. Odeio visitar, por motivos profissionais, centros de criação de carne ou matadouros. Gosto de touradas. A violência de um é pior que a de outra.
A violência escondida debaixo do tapete é mais violência.
A morte do touro na arena é o ritual da caça do homem ao animal, factor civilizacional. Custa mas é verdade. Sai-se da arena para pecuárias higiénicas mas muitíssimo mais violentas.
Muito teria de falar sobre o ritual da tourada.
Poderia estar em causa o homem e não o touro. Mas não. Na Catalunha não se salvou o touro. Não se diminuiu a violência sobre os animais.
Aproveitou-se politicamente para afrontar Madrid. Um regionalismo bacoco e sem sentido.
Lorca, Picasso, Hemingway, Bacon, Dali, Miró, não eram bárbaros.
Bárbaros são os que não gritam pelo tratamento igual na justiça. Os últimos casos bem o demonstraram.
Desculpe o desabafo prof. joão Serra, e cumprimentos,

Rui disse...

Sempre que em qualquer lado se faz um referendo ao aborto, nunca há anti-abortistas. Há é os eufemistas do “pró-vida”, para dar a entender que os seus opositores, os abortistas, querem pôr na lei que é preciso fazer morrer pessoas, e que quanto mais pequeninas, melhor. Com a proibição das touradas na Catalunha é extraordinário que aqueles que querem ir a um sítio ver espetar ferros pontiagudos e coloridos em touros, escolham o eufemismo “pela liberdade” para dar a entender que os outros são "anti-liberdade". Presume-se, pois, que estes pró-liberdade lutem pela liberdade de ver furar os costados do animal. (Um touro sim, um cão, não, que é violência, mesmo que fosse criado para isso, tadito do canito). Imagino que garantir essa liberdade, nos mesmos termos, mas agora em relação aos homens seria coisa interessante de ver. Quero espetar um garfo no olho do senhor guarda nacional republicano que me passou uma multa, o fascista. Nada mais simples. Grito “Liberdade, liberdade, liberdade” e transformo-me, de repente, num pró-liberdade. Um resistente anti-fascista. Pró-liberdade.

E diz o el mundo que “triunfaron los animales”. Visto daqui, dá a entender que “animales” são os que perderam.

Por falar em "animales" e gente que luta pela liberdade de disparar de helicópteros contra "animales". Sarah Palin diz que o presidente Obama não tem “cojones” para resolver a questão da imigração. Diz ela que quem tem cojones é Jan Brewer. (Especialistas. Temos de escutar os especialistas. Parem lá de rir.)

Será que a senhora Palin sabe que cojones é coisa que A governadorA do Arizona, Jan Brewer, por razões que se não devem à sua competência profissional, nunca terá?

Cláudia disse...

Interessante a facilidade que mistura-se política á necessidade de conteção ao espetáculo que sinaliza vestígio da tirania.
É... Por que, bárbaros não tem organição social nenhuma. Então, barbarie não é. É tirania mesmo.

O boi é um serviçal milenar, acompanhando o homem nesta transformação da pedra lascada à informática. E, o que de fato mudou para este animal?
Nada, os princípios ainda são de sacrifícios enchendo os olhos pelo desafio do homem deter a fera.
Não entendem estes que a maior fera está em vos deter esta vaidade, ou, a necessidade de poder sobre a razão.

Por que um touro tem que morrer a vistas de todos, em meio aos risos e espanto? Ou, o que justifica a apreciação e satisfação dessa morte?

Xico disse...

Cara Cláudia,
O seu post é de uma sinceridade que me interpelou, e por isso procurei responder-lhe mal sabendo como o fazer.
Quanto à política, não fui eu que a misturei. Na Catalunha sim.
Quanto à corrida de toiros,tendo presente a poesia de Lorca, só me ocorre dizer-lhe, face à sua pergunta:"Por que um touro tem que morrer a vistas de todos, em meio aos risos e espanto? Ou, o que justifica a apreciação e satisfação dessa morte?"

O homem, civilizado domesticou as aves e engaiolou-as em caixas onde não possam bater asas mas possam botar.
O homem civilizado domesticou o porco, e a porca jaz em prisão estreita de onde não possa virar. A máquina sopra por baixo dela, cada vez que se deita, fugindo os bácoros do sopro, evitando serem esmagados.
O homem civilizado domesticou a vaca, e obriga-a a manter-se em estado de prenhice para lhe poder sacar o leite.
Na arena, o homem enfrenta o bicho que um dia domesticou e lembra-se que o domesticou porque o dominou. E em luta mata-o. Como devem ser todas as mortes. Em luta, frente às navalhas dos seus cornos, oferece-lhe o corpo mas sabe que vai ganhar porque domina. O povo ri e espanta-se do domínio do homem e não da morte do touro.
Não se riam cada vez que passarem frente aos escaparates do supermercado onde frangos e perus se penduram para vosso gáudio e sobretudo não lambam os beiços. Porque são beiços de quem se esqueceu da luta, do sabor do sangue e do suor que outros tiveram para dominar as feras.
Bem certo que maior domínio é o da besta e da fera que há em nós. Na arena transforma-se a besta em arte. Acabar a arena para esconder a besta, é eternizá-la em doçuras de sibarita.

Cláudia disse...

Minhas estimas à compreensão Sr. Xico, pela sinceridade e que vai além de vossa imaginação. É difícil aceitar que mudan-se as regras, é. Mas a Cultura tem de fazer suas opções, de consciência e responsabilidade pela não disseminação de violência. Principalmente os editoriais cujo efeito é orientador do povo.

Com relação a toda honra na plástica do toureiro, assimilando a competência da questão do desafio que causa a impressão de ritual, de abater a fera que mora no animal, isso nos remete a uma espécie de Vudu, espetando, ponto a ponto, e sangrando lentamente e como agravante o delírio dos presentes.
Cristãos, deveriam repensar esta questão. Seria uma lástima, para um lugar tão apreciado quanto a Espanha se abordarem este aspecto, que ainda não fora mencionado mas, e que vos aponto.
Então como o turismo ou a referência do lugar?
Nesse caso, entra a história, as touradas vão ser sempre um marco da Espanha, e a cultura que tenha sua representação de forma simbólica sem as vias de fato.
Concorrendo a superior astúcia do homem, mas, sem morte, e classifiquem como quiser, mas continuaria o touro um objeto da malícia do homem.
Quanto aos confinamentos de animais domésticos, é o resto do iceberg que não está em evidência. Cada um ao seu tempo.

Rui disse...

Nada me satisfaz mais do que assistir a um debate elevado e firme. Não desejando interrompê-lo, não posso deixar de interpelar os contendores sempre que uma qualquer linha de argumentação prossegue uma evolução que restringe aquele meu prazer original. Egoísmo meu, admito-o. É muito instável e inesperado que se utilize uma argumentação deste tipo: "Isto dos touros a morrer nas praças é algo terrível, mas há outras coisas tão más ou piores do que esta, longe do olhar público; coisas que ninguém, por hipocrisia e conveniência, parece denunciar (as vacas, os pássaros, o porco, os frangos, os perus)". Em primeiro lugar, este expediente apenas confirma a tese do adversário pela qual isto dos touros a morrer nas praças é algo terrível - ao ponto de ser comparável com outras realidades horrendas ou mais horrendas, longe do olhar público. Mas depois, num golpe de rins inesperado, aproveita-se a tal "hipocrisia", o tal silêncio conivente que se denunciou, as tais outras realidades horrendas ou mais horrendas para justificar que aquilo que é terrível - isto dos touros a morrer nas praças - permaneça inalterado, até porque - e aqui é que a coisa fica desconcertante - não são realidades comparáveis (matar um frango num aviário ou um touro numa arena).

Prefiro, de longe, que se diga "Gosto de ver as touradas". E que não se diga mais nada.

Caro Xico, matar um touro para comer parece-me uma coisa estupenda, sobretudo para quem esteja com mesmo muita fome. Matá-lo para mostrar que a besta nos é inferior, ou que o touro é outra coisa qualquer, é uma decisão menos importante mas mais formidável. Tão formidável como a lei da selva, da primazia da violência e da força sobre os mais fracos de que nos vamos lenta, demoradamente, distanciando. Quanto aos literatos "beiços de sangue" e a sua impressionante proposta de matar todos os frangos do mundo numa arena, ("como devem ser todas as mortes") assim como as vacas, os pássaros, os porcos, os frangos, os perus parece-me uma coisa que poderia, na realidade, terminar com o desemprego no mundo. Mas lá que se perdia um bocadinho o prazer ritual da arena, isso perdia. Ver um lidador perder hora e meia a vestir o seu traje de luces para ir correr atrás de uma galinha ou um perú numa praça sempre cheia de gente não inspiraria nenhum Hemingway (brinco, apenas, consigo, não me leve a sério).

Parece-me óbvio que a cultura toma opções, sim. A cultura cumpre-se em fazer escolhas. E vai fazendo-as lenta, demoradamente. E isso até nem é triste, demorar produz as melhores coisas. Veja os vinhos e a leitura. Mas concordo que demorar leva por vezes demasiado tempo. E nós, simplesmente, não vivemos tanto tempo ao ponto de achar que possamos esperar pela última página.

Cláudia disse...

Gostaria de me retratar com o Sr. Xico, e o Sr. Rui, bem como minha escusa ao titular deste Blog, Prof. João Serra, pela inconveniente pressão no quesito de idéias não compatíveis com o sofrimento privilegiado. Tal qual não fora a intenção de destratar as touradas espanholas comparando-as ao hermetismo em questão.
Entendo como exagero o qual reconheço o deslize ao respeito desta tradição.
Obrigada pela compreensão.

Xico disse...

Rui
Claro que o levo muito a sério, mesmo quando brinca.
É claro que uma peruada na arena seria no mínimo risível.
Eu gosto de touradas. À espanhola, que as portuguesas sofrem do mesmo mal que nos faz afirmar que somos um povo de brandos costumes.
Não gosto é que me chamem bruto, ou bárbaro por gostar de touradas, ou que tenho as mãos sujas de sangue como já ouvi. Daí as comparações que fiz.
Percebo perfeitamente que não gostem e nenhum mal viria ao mundo se acabassem e acabarão quando deixarem de fazer sentido.
O que não gosto é de proibições com aproveitamentos higienistas, hipócritas ou políticos, ou com o argumento falacioso de ser por piedade aos animais.
Mas ocupamos um espaço que não é nosso, mas o gosto por uma boa polémica é sempre uma tentação a que não consigo resistir.
Bem hajam ao Rui e à Cláudia por estes momentos e ao professor João Serra por me aturar no seu espaço.

João B. Serra disse...

Claudia,
A sua opinião livre e autónoma e sem preconceito é sempre bem vinda a este blogue. É um dos seus motivos de orgulho. Aqui respira-se liberdade, sem má fé. Todos os que assentavam o seu comentário na indiferença perante os valores e o vale tudo para tentar tirar partido da tolerância e respeito pelo contraditório mudaram de poiso. Aqui discutimos, não insinuamos nem fazemos processo de intenção. Por isso a sua opinião é sempre esperada e saudade e agradecida.