Os chefes e os heróis andavam pelas ruas. Podíamos conhecê-los e quase falar com eles. Eram vitoriados nas janelas onde apareciam, só mais tarde começaram a subtrair-se às multidões, às fotografias a aos jornalistas, a programar as aparições, a calcular os fatos e as gravatas, a fazer-se conduzir incognitamente de forma a que toda a gente soubesse minutos depois, deixaram de poder fazer compras e ir a restaurantes, ir ao café ao pé de casa, ao barbeiro porque - diziam - se tinha tornado ao mesmo tempo incómodo e perigoso, porque começavam na cidade a reaparecer algumas perseguições clandestinas, homens encontrados com bombas que por vezes explodiam nas próprias mãos e que se destinavam aos chefes e aos heróis e ouvia-se no escuro de vez em quando tiros repetidos e carros que arrancavam violentamente.
Os chefes e os heróis eram conhecidos pelo que afirmavam. Ninguém sabia como se alimentavam e se dormiam - algumas pessoas entusiasmavam-se quando os viam.
Os heróis que conhecíamos eram todos os que privavam em reuniões e em casas com estes outros chefes e heróis.
Eduarda Dionísio, Retrato dum Amigo Enquanto Falo. Lisboa, Armazém da Letras, 1979
terça-feira, 1 de novembro de 2011
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1 comentário:
Interessante o tom conspirativo. Tantos temas quantas janelas...
De destacar o título do livro: inspirado.
- Isabel X -
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