quarta-feira, 29 de abril de 2009

Não te verei morrer


Idea Vilariño, poeta, crítica literária, ensaísta, tradutora e professora uruguaia. Nasceu em Montevideu, em 1920. Faleceu ontem.


YA NO

Ya no será,
ya no viviremos juntos, no criaré a tu hijo
no coseré tu ropa, no te tendré de noche
no te besaré al irme, nunca sabrás quien fui
por qué me amaron otros.

No llegaré a saber por qué ni cómo, nunca
ni si era de verdad lo que dijiste que era,
ni quién fuiste, ni qué fui para ti
ni cómo hubiera sido vivir juntos,
querernos, esperarnos, estar.

Ya no soy más que yo para siempre y tú
Ya no serás para mí más que tú.
Ya no estás en un día futuro
no sabré dónde vives, con quién
ni si te acuerdas.

No me abrazarás nunca como esa noche, nunca.
No volveré a tocarte. No te veré morir.

Idea Vilariño

Só se morre de gripe mexicana no México?

As autoridades sanitárias mexicanas só sabem de certeza certa que, das 150 pessoas que morreram devido ao surto de gripe viral, 20 estavam infectadas pelo virus da gripe dita porcina.
Há 7 países que informaram a OMS que detectaram casos. Mas até à data nenhum declarou que o tratamento não fora eficaz ou tinha sido extemporâneo. 
Que se passa final no México?

terça-feira, 28 de abril de 2009

Ser contra a governabilidade

O PCP, com a originalidade que lhe é reconhecida, elegeu como primeiro objectivo político "tirar a maioria absoluta ao PS". O CDS, no seu Congresso das Caldas, também já tinha enunciado esse propósito. O PSD idem. O BE não diz outra coisa desde há 4 anos.
Nenhum destes partidos - que tem como finalidade diminuir a governabilidade do País em período de crise - explica responsavelmente como tenciona contribuir para uma solução de Governo no caso de conseguir o seu intento. Todos teorizaram os malefícios da maioria absoluta. 
Mas deviam sentir-se obrigado a fazê-lo. Até porque se o PS realmente perder a maioria absoluta, em razão dos esforços conjugados de todos os outros partidos, estes sim obterão, somados, a maioria absoluta.
E, logicamente, deveriam formar governo.
Mas como, se eles são contra qualquer maioria absoluta?

Que o eleitorado nos livre de semelhante desastre!

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Beso con tapaboca

No El Pais de hoje.

domingo, 26 de abril de 2009

Desejo irreprimível de Liberdade

O alferes miliciano Jaime José Matos da Gama, licenciado em Filosofia, foi um dos actores do 25 de Abril de 1974. Ninguém hoje tem dúvidas de que é um dos políticos mais bem preparados e experientes da geração que fez a Democracia. Registo do mais interessante discurso de ontem, o do "general" no activo  Jaime Gama:

Há muitos anos, participo nesta sessão solene, penso não ter faltado a nenhuma, e aqui reencontro, sempre, nesta manhã de feriado, os mais altos responsáveis do país. Até aqui chegar, a tranquilidade serena das ruas de Lisboa permite-me por alguns momentos rever os factos do dia, desse dia, desde a véspera, o compromisso de honra, a distribuição das missões, a incerteza do resultado, a recepção das senhas, desde a noite, a acção essencial, a tomada das posições-chave, a surpresa, desde o toque de alvorada, a formatura, as primeiras movimentações exteriores, as resistências possíveis, o crescendo da manobra , a incerteza dos resultados, as intervenções decisivas, as imagens simbólicas, o início da curiosidade e do apoio, a vitória sem ódio, a fraternidade, a libertação, a paz, e a esperança.
A essa sequência de recordações vou também buscar inspiração e alento para a mensagem, essa mais formal, que depois vos transmito e ao país, com a consciência do caminho percorrido, nas suas dificuldades e insucessos, nas suas angústias e sofrimentos, mas também nos inegáveis legados, obra de todos, que fomos capazes de conseguir. E descubro, novamente, que, em cada momento verdadeiramente decisivo das nossas vidas, para além da incerteza dos resultados, que, à partida, ninguém pode ter nunca como adquiridos, desde a véspera, desde a noite, desde a alvorada, é sempre a força serena das nossas ideias, o compromisso generoso com aspirações nobres, o desejo irreprimível de liberdade e de justiça que acabam por fazer o seu caminho, triunfar e vencer, e isso mesmo me leva a concluir, que no melhor do nosso espírito devemos permanecer abertos e disponíveis para que cada dia, todos os dias, o nosso coração saiba acolher a luz, a graça, e o dom imensos de um sempre novo 25 de Abril.

Au printemps de quoi rêvais-tu ?


sábado, 25 de abril de 2009

Vem aí o bloco?

O Presidente na mensagem que hoje dirigiu à Assembleia da República:

Uma campanha em que os adversários políticos se respeitem, sem linguagem excessiva nem crispações, será um contributo para a dignificação da nossa democracia e abrirá espaço para o aprofundamento do diálogo interpartidário que tão necessário é para a resolução dos problemas nacionais. As forças políticas devem ter presente que sobre elas recai a grande responsabilidade de encontrar soluções de governo, e que essa responsabilidade é particularmente acentuada nos tempos difíceis que o País atravessa.
É importante que o debate eleitoral se concentre na resolução dos grandes problemas que o País enfrenta, com os olhos postos no futuro, sem perder tempo nem energias em recriminações sobre o passado.
[...]O emprego, a segurança, a justiça, a saúde, a educação, a protecção social, o combate à corrupção são questões básicas que devem marcar a agenda política e em torno das quais deve ser possível estabelecer consensos entre os partidos estruturantes da nossa democracia.

Qui avait 25 ans en l'an 1974

De acordo com as regras da incorporação militar aplicadas a estudantes universitários, eu devia dar entrada na recruta para oficiais milicianos, em Mafra, no ano de 1974. Refiro-me à famosa regra 20+5 (vinte anos acrescidos do número de anos necessários para a conclusão de uma licenciatura). Em Novembro de 1973, deslocara-me à sede do meu Distrito de Recrutamento, em Santarém, a fim de entregar um requerimento solicitando que me fosse concedida a possibilidade de entrar em última incorporação do ano, para concluir a licenciatura. De facto, terminara o bacharelato em Setembro de 1970, tendo a partir daí realizado uma cuidadosa gestão das cadeiras do 4º e 5º anos do Curso, de modo a adiar até ao limite dos 25 anos a entrada na tropa.
A questão do “serviço militar” tinha sido objecto de discussão com os amigos mais próximos no final da década de 60. Se bem que nesta matéria imperassem as opções individuais, interessávamo-nos pelos argumentos gerais das posições tipo: recusa da incorporação, o que implicava inexoravelmente a emigração clandestina, versus aceitação da imposição proveniente do regime autoritário com todas as consequências. Havia quem defendesse a chamada posição revolucionária: desertar em caso (praticamente inevitável) de mobilização para uma das “frentes de guerra”. Alguns tinham acesso a situações consideradas menos gravosas, como o ingresso na Marinha. Eu encontrava-me na posição dominante: enfrentar a incorporação e as suas consequências com desconfiança e revolta, admitindo no entanto reexaminar a situação mais à frente.

Do outro lado

Qui avait 25 ans en l'an 1974

A madrugada de 25 de Abril de 1974. Octávio Quintela, meu colega no Liceu do Padre António Vieira (PAV) e meu vizinho na Rua Mastro Jaime Silva Filho, telefonou-me bem cedo. – “Pode chegar aqui, por favor?” Havia um tom de urgência e perplexidade e algum mistério que me fez saltar de casa quase de imediato. Encontrávamo-nos todas as manhãs, partilhávamos boleias para a escola, mas aquele encontro estava a acontecer cedo demais. À saída do elevador, Octávio disse-me: - “Correm boatos de que há uma revolução em marcha, você sabe alguma coisa disso?” Surpreendido, disse que ignorava. Então, após alguma hesitação, levou-me até à sala onde estava Mário Sottomayor Cardia. Apresentou-nos. Cardia era seu compadre, padrinho do filho. Octávio parecia confundido: - “Ele chegou aqui esta madrugada, dizendo que há uma revolução e que era melhor não passar a noite em casa. Já pensei falar para a mulher (a escritora Luisa Ducla Soares), mas ele impediu-me de o fazer”. Cardia repetiu-me a sua história. E nós ficámos ali, de ouvido na rádio, até que a música, e os apelos e comunicados do Movimentos das Forças Armadas nos convenceram de que alguma coisa de especial se passava e decidimos não ir ao PAV nesse dia.
Nenhum de nós tinha uma boa ideia do que se podia fazer para ajudar os militares que, aliás, recomendavam insistentemente que a população, sobretudo de Lisboa, se abstivesse de ocupar as ruas para não interferir nas manobras militares. O Mário Sottomayor Cardia parecia alheado, incapaz de fazer ou recomendar qualquer acção. De modo que eu me propus fazer uma coisa que me pareceu, na altura, ser uma boa hipótese: efectuar rondas pelos quartéis de Lisboa que conhecia, tomar nota dos movimentos que pudesse observar do exterior, e reportá-los. Como o Octávio ficava em casa com o Cardia, meti-me no Honda 600 branco de matrícula BM-38-13, que era o meu carro, levei comigo a "Osga de Alvalade", uma podengo português pequeno que então viva na Rua Maestro Jaime Silva Filho, e parti para essa missão absolutamente inútil e caricata de que esforçadamente dei conta aos meus interlocutores já a meio da tarde. Não tinha notado nada de verdadeiramente significativo. A segunda missão foi mais interessante, mas já não me lembro quem a sugeriu: juntar-me a um grupo que ia tentar comunicar com os presos políticos de Caxias. Fui isso que fiz a partir das 18 horas.

Quanto mais se apartam

sexta-feira, 24 de abril de 2009

À janela do 25 de Abril de 1974







Carlos Gil, Um Fotógrafo na Revolução. Lisboa, Caminho, 2004.

Inquietação

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Textos de véspera e do dia seguinte. No tempo em que...

Eduarda Dionísio (1980)
6. Desenho: cigarro; código: eu
Texto A (msc)
Nos tempos que vão correndo torno-me caro. Consumo-me depressa ou devagar, consoante as circunstâncias conjunturais. Produzo, sem grandes esforços, muitas baforadas de fumo. Brilho vermelho, mas nem sempre.
Texto B (jbs)
Consumo-me ora depressa, ora devagar. Mas consumo-me. Sou já só quase um ponto, rodeado de uma pequena espiral. Ainda estou aceso, mas quanto tempo me resta deste brilho vermelho?

Textos de véspera e do dia seguinte. Escadas

Eduarda Dionísio (1980)
5. Desenho: escada (deitada); código: os outros
Texto A (msc)
São úteis se não forem demais. Há que prever situações de emergência. Logo, é necessário preservar a sua existência, mas sem excessos. A distância que vai do pé ao primeiro degrau é fundamental. Os outros devem trepar-se com cautela (evitar os tropeções e as tábuas que rangem) e com lentidão. Se nunca se apresentarem obstáculos, olhar com desconfiança antes de poisar as últimas pegadas, porque não há nenhum que não esteja armadilhado.
Texto B (jbs)
São ora úteis, ora inúteis, ora de mais, ora de menos. As situações excedem-nas. Uma são mais resistentes que outras, umas são, outras parecem ser, apenas. É um erro julgar que só se encontram na vertical. Deitadas, podem percorrer-se. não podem trepar-se. Mas por onde começar? e onde acabar? Nunca sabemos com o que contamos...

quarta-feira, 22 de abril de 2009

À janela de Vasco Trancoso

Epígrafes

A regra de ouro é ajudar aqueles que amamos a fugir de nós.
Friedrich von Hügel
in John Le Carré, Um homem muito procurado.

Quando o cão se está a afogar, essa é a boa altura para lhe bater.
Provérbio (talvez) chinês.
Diário que nunca escreverei

Conhecia a receita. Aquilo curava-se trabalhando e ocupando o tempo livre em afazeres absorventes, se não pudessem ser criativos nem úteis.
Mário Vargas Llosa, Travessuras da Menina Má.

"Não, não! A casa é essa, mas a rua não", respondeu o professor muito bem disposto. "Esse foi o nosso erro! Agora o melhor que temos a fazer é..."
Acabou-se. A rua estava deserta. A vida do dia a dia rodeava-me e o encantamento desaparecera.
Lewis Carrol, Sylvie e Bruno.

Oh,  corça: de que interior tão ledo
de antigos bosques nos olhos tem pujança;
que redonda confiança
misturada a tanto medo.
Rainer Maria Rilke, Carrossel e outros poemas.

terça-feira, 21 de abril de 2009

Textos de véspera e do dia seguinte. Máquina de escrever

Eduarda Dionísio (1980)
4. Desenho: máquina de escrever; código: família
Texto A [msc]
Da pinha, fiz pinhão, do pinhão fiz berlinde, do berlinde fiz fisga, da fisga fiz costela, da costela fiz espingarda, da espingarda fiz máquina de escrever, da máquina de escrever fiz cana de pesca, da cana de pesca fiz fim de semana, do fim de semana fiz uma vida inteira, da vida inteira fiz uma obra volumosa e muito considerada sobre "as relações de troca, produção e consumo na estrutura familiar das sociedades capitalistas.
Texto B [jbs]
Da máquina de escrever fiz letras, das letras fiz palavras, das palavras fiz comunicados, dos comunicados fiz desejos, dos desejos fiz ideias, das ideias fiz memória - a memória possível de tudo isso que era meu e já não era - e de novo ideias, desejos, comunicados, palavras, letras, máquina de escrever.

Textos de véspera e do dia seguinte. PREC

Eduarda Dionísio (1980)
3. Desenho: 2 CV; código: o passado
Texto A [msc]
Os tempos gloriosos do PREC: as manifestações de punho no ar e bandeiras ao vento. Os grandes empenhamentos e as grandes viagens: os pneus furados e Viva a revolução! as portas não abrem e Viva  a revolução! as janelas não vedam e Viva a revolução! os faróis estão zarolhos e Viva a revolução! o tejadilho chove e Viva  a revolução!
E o regresso à normalidade: Já levaste hoje o carro a arranjar? Todo o mundo vai levar!
Texto B [jbs]
Os tempos gloriosos do PREC: as manifestações de punho no ar e bandeiras ao vento. Os grandes empenhamentos e as grandes viagens: os pneus furados e Viva a revolução! as portas não abrem e Viva a revolução! as janelas não vedam e Viva a revolução! os faróis estão zarolhos e Viva a revolução! o tejadilho chove e Viva a revolução!
Os tempos sem glória da resistência: e por quanto tempo este carro aguentará? Sem tejadilho, sem faróis, sem limpa-pára-brisas, sem janelas, sem portas, sem pneus - mas sobretudo sem viagens, sem bandeiras, sem punhos no ar?

À Janela de Margarida Araújo

segunda-feira, 20 de abril de 2009

Textos de véspera e do dia seguinte. As lebres e o caracol

Eduarda Dionísio (1980)
2. Desenho: alarme (combóio); código: o futuro
Texto A [msc]
No tempo em que os animaizinhos atravessavam as florestas descuidados, reuniu o 1º Congresso das lebres libertárias para resolver do valor e oportunidade de uma expedição revolucionária ao vale das estrelas. Não eram passados cinco segundos quando decidiram por unanimidade, claro está, avançar sim, avançar já e em força.
Por descargo de consciência, a que chamaram solidariedade, propuseram fazer-se acompanhar pelo caracol, indivíduo sério e  muito de sua casa, como se sabe. A resposta ao convite - devidamente escrito, assinado, lacrado e selado - tardou mas chegou: "Sejam prudentes, evitem acidentes". Certo é que as lebres, umas precipitadas, partiram; sabe-se que gozaram imensamente mas diz-se que não regressaram.
Texto B [jbs]
No tempo em que os animaizinhos atravessavam as florestas descuidados, reuniu o 1º Congresso das lebres libertárias para resolver do valor e oportunidade de uma expedição revolucionária ao vale das estrelas. Não eram passados cinco segundos quando decidiram por unanimidade, claro está, avançar sim, avançar já e em força.
Por descargo de solidariedade, a que chamaram consciência, propuseram fazer-se acompanhar pelo caracol, indivíduo sério e muito de sua calma, como se sabe. Era porém evidente que ele não poderia competir com elas em ligeireza. Gozando imensamente com isso, partiram; "lá te esperamos", gritaram já ao longe, algumas, das janelas da carruagem.
Acreditando na promessa, o caracol, tomou o fio do carril. Ao fim do dia, tinha já percorrido metade do caminho, quando as lebres, esquecidas do prometido, voltavam de bolsos cheios. "Já o combóio?" - perguntou desapontado o caracol. E, apercebendo-se claramente do logro e do risco: - "Alguma se lembrará de puxar, a tempo, o sinal de alarme?"

Textos de véspera e do dia seguinte. Jogo e construção

Eduarda Dionísio (1980)
1. Desenho: pirâmide; código: o amor
Texto A [msc]
É uma elaboração intelectual, está bem de ver.
  É uma construção geometrizada, está bem de ver.
     É uma operação mais selectiva do que aditiva, está bem de ver.
       É joeirar e depois pescar, está bem de ver.
         É um esforço minimizado pela planificação prévia, está bem de ver.
           É um trabalho de formiga, digno de um formigueiro inteiro, está bem de ver.
             É um jogo com muitas regras, para jogadores muito pacientes, está bem de ver.
Texto B [jbs]
É uma elaboração intelectual, está bem de ver.
  É uma elaboração manual, está bem de ver.
    É uma construção experimental, está bem de ver.
      É uma construção que se projecta no futuro, está bem de ver.
É um esforço minimizado por uma vontade prévia, está bem de ver.
  É um esforço alimentado pelo trabalho de muitos, está bem de ver.
    É um edifício de degraus, está bem de ver.
      É um edifício que se pode subir a dois e dois, está bem de ver.
Quem chegar ao cimo diz-se que colherá o sopro dos deuses - está bem de ver?
  Quem chegar ao cimo consta que compreenderá uma rosa dos ventos - está bem de ver?
    Quem chegar ao cimo julga-se que dominará para sempre o deserto - está bem de ver?

À janela de Margarida Araújo

sábado, 18 de abril de 2009

Registo de interesses

Intervenção que hoje fiz na sessão de apresentação da candidatura do Eng.º Delfim Azevedo à Câmara Municipal das Caldas da Rainha, na sede da Comunidade Intermunicipal do Oeste, às 18 horas.

Caro Delfim Azevedo
Caros amigos
Tomo aqui a palavra, com todo o gosto, a convite, prontamente aceite, do candidato, e por motivos pessoais e políticos, que me apresso a esclarecer. 
Por detrás desta cumplicidade há uma velha razão. Estávamos em 1985. Em Outubro (6) realizaram-se eleições antecipadas, convocadas pelo Presidente Ramalho Eanes que deram, alguns talvez se recordem: 30% ao PSD, 21% ao PS e 18% ao PRD. Seguiam-se-lhes eleições autárquicas, em 15 de Dezembro. A disputa da Câmara das Caldas ia ocorrer num contexto de alguma imprevisibilidade: chegara ao fim um Executivo em que o CDS tivera a maioria, conquistada pelo Eng. Paiva e Sousa e continuada pelo Coronel Monroy. O PSD preparava-se para candidatar pela primeira vez o Dr. Fernando Costa, em detrimento de candidaturas de continuidade que seriam as do Dr. Lalanda Ribeiro ou do Dr. Mesquita de Oliveira (cabeça de lista nas eleições de 1982). O PRD, animado pelos resultados das legislativas, anunciava uma candidatura com o Drs. Jorge Varanda e Vicente do Carmo, e o PS tinha convidado o Dr. Manuel Sá Lopes para encabeçar a sua lista onde surgia também o Engº José Valente, antigo vereador de uma Câmara PSD. Foi então que dois cidadãos caldenses, sem partido, escreveram uma carta ao PRD e ao PS propondo a criação de uma plataforma política comum de forma a criar uma alternativa à candidatura do PSD.
O Eng.º Delfim Azevedo era o responsável pela secção do PS das Caldas da Rainha e aceitou de imediato o repto para encetar conversações com o PRD. A primeira reunião, a que assisti, realizou-se nas instalações da Gazeta das Caldas. Esteve presente o outro subscritor da carta, o Dr. José Luís de Almeida e Silva. O Engº Delfim Azevedo pediu que um de nós mostrasse disponibilidade para integrar as listas, caso se verificasse acordo. Fui eu o voluntário de serviço.
O resultado das conversações foi nulo. O PRD não mostrou interesse na coligação e eu acabei por integrar a lista do PS para a Assembleia Municipal, na qualidade de independente. Mais uma vez o devo a insistência do Engº Delfim Azevedo. O argumento dele era que pela ausência de acordo não podia ser responsabilizado o PS que propusera que a composição da coligação tivesse por base os resultados das legislativas. Fui o 3º da lista e o PS elegeu exactamente 3 deputados municipais. Foi a minha primeira experiência nessa função.
Tal como nessa altura, há 24 anos, o Eng. Delfim Azevedo é hoje protagonista de um projecto corajoso e de risco. Estamos todos mais velhos – eu mais do que ele, porque a gente do Porto sempre tem tido mais motivos de rejuvenescimento nesta última década – o que aliás sublinha a atitude corajosa e a aceitação do risco da parte de quem certamente teria agora boas razões para se resguardar de embate tão exigente.
Refiro-me a coragem e risco políticos, evidentemente. De facto trata-se de enfrentar uma gestão autárquica instalada há exactamente 24 anos, que vai pedir um último reconhecimento eleitoral e espera que a inércia e o conformismo joguem a seu favor.
Não vou alongar-me muito mais, porque certamente os amigos e camaradas aqui presentes querem sobretudo ouvir o candidato, as suas razões e propostas.
Por isso direi apenas e sumariamente o seguinte. Que o Engº Delfim Azevedo e o PS têm de convencer o eleitorado a sair de uma confortável abstenção e de um voto resignado no PSD para uma alternativa, um nova orientação estratégica da cidade e do concelho.
Essa alternativa, mais do que a recusa do quarto de século de uma gestão muito casuística se bem que muito presente – tão presente que às vezes me pergunto se não estiolou muita iniciativa particular e empresarial, se não condicionou a inovação e a criação culturais e não nivelou por baixo alguns dos projectos diferenciados que aqui germinaram ou aqui se quiseram ancorar – tem que se afirmar pelo que propõe de novo, tanto nas formas de gestão como nas metas a atingir.
Esta candidatura parte talvez com uma expectativa moderada, em atenção à conjuntura depressiva que atravessamos, mas com um forte capital de esperança. A esperança em inverter uma tendência de um modelo de cidade gasto, incapaz de antecipar, de atrair inovação e assentar a sua projecção em dinâmicas criativas com tradução no plano do negócio e do empreendedorismo.
É isso que as gerações que têm assistido a tanta oportunidade perdida (claro que oportunidades perdidas, do ponto de vista de um certo modelo, são oportunidades ganhas de outro modelo). Mas este modelo é urbanisticamente preguiçoso, empresarialmente pouco estimulante e altamente consumidor de recursos escassos como sejam a qualidade ambiental.
O capital de esperança reside apenas nisto: esta candidatura tem de produzir o sobressalto cívico que permita acreditar na concorrência como viabilizador da alternância. A lei que impôs a limitação de mandatos é, a meu ver, justa. Tenho mesmo dificuldade em compreender como é que os constituintes se conformaram tanto tempo com a limitação de mandatos do Presidente da República, cargo de eleição directa e universal, e a possibilidade de eternização no poder de presidentes de Câmara e presidentes de Governo Regional. Mas seria desperdiçar muito tempo que a alternância tivesse que esperar o ensejo da lei, em vez de decorrer do normal exercício da escolha dos eleitores.
Para isso, esta candidatura tem de extravasar as fronteiras de um partido para ser o expoente de um movimento cívico que envolva cidadãos e associações, organizações da sociedade e pessoas que, na sua visão plural, se empenhem na definição de novas prioridades para a acção municipal e para o papel cívico dos munícipes.
Tem que ser pois uma candidatura aberta e renovadora. A modernidade caldense é em muitos aspectos uma falsa modernidade. Esta candidatura tem de ser capaz de renovar a agenda do concelho, sem perder de vista que é urgente um plano de intervenções correctoras em pontos nevrálgicos da cidade e do concelho.
Há que, por fim, ser muito claro não só sobre o que se pode fazer mas também sobre o que se deve fazer. Sobre este aspecto, sem querer antecipar o que certamente a candidatura vai discutir ou já está a discutir, gostaria de deixar duas pequenas notas. Uma é sobre a crise social: as autarquias vão ter de estar na primeira linha do combate aos efeitos mais graves da crise que ainda se não terão feito sentir totalmente. A outra é sobre a preparação para a retoma. Quando ela vier, quem estiver mais bem preparado tira enorme vantagem. Isso significa investir nas parcerias e nos projectos que permitam às Caldas estar em melhor posição para ocupar uma posição de destaque na atracção e estímulo dos factores de inovação do futuro.
Meu caro Delfim, desejo-te muito boa sorte!


A República em Setúbal

Extracto da intervenção que fiz na abertura do Colóquio "O Congresso Republicano de Setúbal: o Republicanismo entre a revolução e a ordem", hoje, às 10 horas, na Câmara Municipal de Setúbal.

No Congresso de Setúbal de Abril 1909 prevaleceu um orientação que colocava a revolução na ordem do dia, em prejuízo da que defendia uma via gradualista para a tomada do poder. 
João Chagas, um dos protagonistas da estratégia vencedora, ele próprio um revolucionário oriundo do 31 de Janeiro de 1891, não se cansou de repetir, no período que antecedeu o Congresso, como no que se lhe seguiu, que a revolução era um imperativo patriótico e moral, e que os problemas políticos do País já não podiam ser equacionados um a um, pois se unificavam num único problema: Portugal.
Que lembramos hoje deste tempo e destas gerações que acreditaram num programa de regeneração de Portugal, aplicando-se em identificar-lhe um destino, uma interpretação do passado, um novo sistema político, uma nova elite?
Em primeiro lugar pedimos à história que nos ajude a reconstituir os factos e os personagens, a trama dos desafios e das possibilidades, tanto as viáveis como as inviáveis, tanto as vitoriosas como as derrotadas.
A história é fundamental, mas num acto comemorativo não é tudo. Há um aspecto cívico das comemorações que, conjugando-se com a história, se apoia na memória e responde a um apelo de valores.
A memória da República sobreviveu com inúmeras dificuldades. A ditadura e o autoritarismo segmentaram-na, escolhendo um dos segmentos como justificação e legitimação, para melhor silenciarem o restante. Chegou a 1974, à Democracia, fragmentada, olhada com desconfiança ou mesmo hostilidade. Foram poucas as vozes autorizadas que então se ergueram em defesa dessa memória, tributando-lhe reconhecimento, e muito menos as que nela reivindicaram as suas origens democráticas.
Repor a memória histórica na sua dimensão plural é uma das nossas preocupações cívicas. Há valores que atravessaram gerações e dão sinais de futuro. A liberdade, a igualdade, a fraternidade não são lemas de uma utopia datada, são, com as evoluções e adaptações naturais, aspirações que mobilizam. A República como o demonstrou a eleição recente do presidente dos Estados Unidos, pode mudar o rumo de políticas, produzir rupturas sem perder a sua dimensão popular integradora. A República mostrou, neste caso, ser o mais forte elemento de coesão nacional perante uma crise de proporções insuspeitadas.
Uma Monarquia pode viver de uma tradição e uma aristocracia da vontade de poder. Uma República só pode viver da dedicação dos seus cidadãos porque é feita por eles. A dedicação precisamente àquilo que é de todos, à res publica.
É essa dedicação que aqui começamos hoje a celebrar, e dessa forma também a procurar projectar para o futuro da nossa República.

Registo de interesses

Jorge Sampaio apoia candidatura de Vital Moreira ao Parlamento Europeu.

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Há 40 anos

17 de Abril de 1969: Alberto Martins, Presidente da Associação Académica de Coimbra, pede a palavra numa sessão de inauguração do novo edifício da Faculdade de Ciências, presidida por Américo Tomás, Presidente da República.

Dossier anti-corrupção

Nem sempre as crises são boas conselheiras, mas esta chamou para primeiro plano o tema da corrupção, do enriquecimento fraudulento, dos prémios e complementos salariais abusivos praticados em empresas beneficiárias de apoios estatais. A opinião pública manifestou-se, sobretudo na Europa, contra as práticas iníquas que, a coberto do liberalismo, se sobrepuseram aos princípios da ética republicana e da justiça na distribuição do rendimento.
Importaria que este tema fosse objecto de um esforço sério das instituições representativas no sentido da melhoria dos sistemas jurídicos, judiciais e penais nesse combate e não pura arma de arremesso eleitoral.
É recorrente na história: a percepção de que à crise da economia e da sociedade se soma uma crise de valores. Claro que se trata de uma crise das elites.
A questão essencial, parece-me, é porém da partilha da riqueza. Assistiu-se, sem sobressalto cívico, ao aprofundamento da desigualdade com a crise do Estado-Providência. Criámos a sociedade mais desigual de sempre. E não é aqui que reside afinal a origem da crise?

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Pelo poder das escolas

As primeiras eleições sindicais pós 25 de Abril tiveram como protagonistas os professores de todos os graus de ensino da Grande Lisboa (distritos de Lisboa, Santarém e Setúbal). Foram decididas num Plenário realizado em Maio no Estádio Universitário, depois de, na manifestação do 1º desse mês, os professores presentes se terem agrupado em torno de dois cartazes distintos: "por uma associação de professores" e "por um sindicato de professores".
Nessas eleições, efectuadas em Junho de 1974, apresentou-se uma lista intitulada "Pelo poder das escolas" que obteve 40% dos votos. O documento principal dessa candidaturas pode ser recuperado aqui "Uma evocação crítica desse movimento, da autoria de uma das militantes da altura, Eduarda Dionísio, pode ser consultado  aqui.
Eugénia Prata Pinheiro, outra das militantes da causa em 1974, tem um blogue, aqui já várias vezes citado, onde se reporta a leituras actuais deste tema "histórico".

À janela de Benoliel

Bernardino Machado parte para o exílio e despede-se de Benoliel, 1917
Comício republicano nos Anjos, em Lisboa, 1910



Ardinas, 1917

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Stop de war!

Novos comentários sobre a situação da Escola de Santo Onofre. Textos de Edgar Ximenes, Rui Correia e Paulo Prudêncio podem ser lidos aqui e aqui.
Polémica importante: escola, professores, comunidade, gestão, tutela, autonomia.

terça-feira, 14 de abril de 2009

Identidade e escolha individual

Fernando Savater no El País:
Sobre a questão das identidades, o melhor livro que li há muito tempo é o de Amy Gutman, La identidad en democracia (ed. Katz). Estuda as vantagens que as identidades colectivas podem oferecer aos que as adoptam e à promoção de certas ideias ou formas de vida, mas assinala também que "o respeito pelas pessoas implica não respeitar a tirania exercida pelas maiorias ou minorias culturais e não considerar as culturas como todos homogéneos". Em democracia, a sobrevivência de grupos ou tradições culturais não se pode comprar pelo preço da limitação da escolha individual. O indivíduo deve ser educado para poder optar pela mudança de fidelidades e para sair, sem perda nem trauma, daquela que em princípio lhe coube em sorte.

À janela de Sena da Silva

Elevador, Lisboa, 1956/57
Cervejaria, Lisboa, 1956/57

Sena da Silva: uma Retrospectiva. Porto, Fundação de Serralves, 1990.

Pensamento em fotografia

Hoje envio um conjunto de grandes pedras perfeitamente encaixadas há décadas numa esquina da Mata.
Na Mata há, como sabem, várias pedras de grandes dimensões - colocadas em geral para evitar a passagem inapropriada de veículos.
Mas este conjunto que fotografei não está no meio de um dos múltiplos caminhos que se nos deparam.
Está num canto, abrigado pela sombra fresca das árvores vizinhas.
Há muitos anos que as conheço e diferencio.
Sempre que as contemplo aprecio a serenidade do seu porte silencioso, enquanto lá no alto o som dos pássaros, acompanhando a eternidade que cabe nesses momentos, desce com a luz por entre os ramos das árvores.
Com o decorrer do tempo foi dando guarida a pequenos fetos, musgos, heras e trevos de flor amarela, que as pintaram progressivamente com vários verdes – vibrantes e profundos.
Como um pequeno jardim secreto e mágico, transmite uma inexplicável sensação de Solidariedade incondicional.
Como a Solidariedade que senti por parte dos meus Amigos ao longo dos últimos meses.
E como um prazer que afinal prolonga outro – a Amizade recebida, transmito-vos a minha Gratidão sob a forma de uma foto – que é também um símbolo da solidariedade recíproca.
Vasco Trancoso: foto e texto 
[Enviados a amigos a 1 de Abril de 2009]

segunda-feira, 13 de abril de 2009

Aventino Teixeira


Conheci-o capitão, de férias nas Caldas da Rainha, no Verão de 1966. E a última vez que o vi foi também nas Caldas, há meia dúzia de anos. Falou-me então como se nos tivéssemos encontrado na véspera, dando-me recados para o Presidente e falando no mesmo tom arrastado de sempre, mudando surpreendentemente de tema e, aqui e ali, sorrindo com uma ironia cansada das esquinas e alçapões que não previmos.
Em 1966, o capitão Aventino Teixeira decidira fazer o Curso de Direito e, mais do que uma valorização de carreira, pareceu-me que a ideia era experimentar a hipótese de mudar de carreira. Fiquei convencido que estava saturado da vida militar, que acumulara motivos de insatisfação com a hierarquia e que estava à beira de uma ruptura (se a não fizera já) com a política da guerra.
Como eu próprio tencionava então fazer esse Curso, a aproximação entre nós começou por ter um conteúdo prático. O capitão matricular-se-ia como aluno voluntário e esperava de mim, aluno ordinário, alguma colaboração em apontamentos e notas relativas às matérias dadas nas aulas. Pouco a pouco, porém, nesse ano de múltiplas transições, as conversas entre nós, apesar da diferença de idades, foram-se ampliando e as cumplicidades tecendo. Aventino Teixeira era um cavaqueador inexgotável, sobretudo a partir do meio da tarde. Dispunha-se frequentemente a ir-me buscar ou levar ao Carvalhal Benfeito, a troco de um conversa que se prolongaria depois de jantar pela madrugada do Inferno d'Azenha.
Em Lisboa e na Faculdade o nosso convívio foi mais espaçado. Passei-lhe os meu livros e o Código Civil anotado pelo Prof. Dias Marques, no dia em que decidi mudar de Curso dizendo-lhe qualquer coisa deste género: - Este é o meu contributo para que possas tu um dia mudar de carreira. Não o fez, é certo, mas nunca o vi fardado e não consigo imaginá-lo a desempenhar funções do foro estritamente militar. Em 1969, se não estou em erro, proporcionou-me um encontro em sua casa, na Praça Olegário Mariano, com Arnaldo Matos, de quem era amigo, para troca de informações sobre a crise do movimento associativo em Lisboa, após a demissão do Secretariado da Reunião Inter-Associações de que faziam parte Alberto Costa, Jaime Gama, Teresa Milhano e Serras Gago. Nos anos setenta procurei-o, no quadro de outras missões, no Procópio, onde marcou presença desde a fundação, em 1972. Segui, sempre com benevolente curiosidade, as suas inúmeras aparições no Prec e no período subsequente, como observador crítico, irreverente e muitas vezes desconcertante. Diziam-me que o General Eanes o ouvia atentamente. Não consigo imaginar tal situação sem uma estranha sensação de divertimento.
Fotografia de Margarida Araújo

Dylan

Um novo disco, editado a 28 de Abril: Together Through Life.

Prémio Pritzker de Arquitectura

Atribuído ao suiço Peter Zumthor. O juri salientou, na atribuição deste que é considerado o Nobel da Arquitectura, a obra prima deste arquitecto nascido em 1943: os banhos termais de Vals, Colónia.
Em Outubro do ano passado, a Experimenta organizou uma exposição sobre Edifício e Projectos de P. Zumthor. Pode ler o que se escreveu na altura aqui e aqui.

domingo, 12 de abril de 2009

À janela de Jacques Brel

Les fenêtres

Les fenêtres nous guettent
Quand notre cœur s'arrête
En croisant Louisette
Pour qui brûlent nos chairs
Les fenêtres rigolent
Quand elles voient la frivole
Qui offre sa corolle
À un clerc de notaire
Les fenêtres sanglotent
Quand à l'aube falote
Un enterrement cahote
Jusqu'au vieux cimetière
Mais les fenêtres froncent
Leurs corniches de bronze
Quand elles voient les ronces
Envahir leur lumière

Les fenêtres murmurent
Quand tombent en chevelure
Les pluies de la froidure
Qui mouillent les adieux
Les fenêtres chantonnent
Quand se lève à l'automne
Le vent qui abandonne
Les rues aux amoureux
Les fenêtres se taisent
Quand l'hiver les apaise
Et que la neige épaisse
Vient leur fermer les yeux
Mais les fenêtres jacassent
Quand une femme passe
Qui habite l'impasse
Où passent les Messieurs

La fenêtre est un œuf
Quand elle est œil-de-bœuf
Qui attend comme un veuf
Au coin d'un escalier
La fenêtre bataille
Quand elle est soupirail
D'où le soldat mitraille
Avant de succomber
Les fenêtres musardent
Quand elles sont mansardes
Et abritent les hardes
D'un poète oublié
Mais les fenêtres gentilles
Se recouvrent de grilles
Si par malheur on crie
" Vive la liberté"
Les fenêtres surveillent
L'enfant qui s'émerveille
Dans un cercle de vieilles
A faire ses premiers pas
Les fenêtres sourient
Quand quinze ans trop jolis
Ou quinze ans trop grandis
S'offrent un premier repas
Les fenêtres menacent
Les fenêtres grimacent
Quand parfois j'ai l'audace
D'appeler an chat un chat
Les fenêtres me suivent
Me suivent et me poursuivent
Jusqu'à ce que peur s'ensuive
Tout au fond de mes draps

Les fenêtres souvent
Traitent impunément
De voyous des enfants
Qui cherchent qui aimer
Les fenêtres souvent
Soupçonnent ces manants
Qui dorment sur les bancs
Et parlent l'étranger
Les fenêtres souvent
Se ferment en riant
Se ferment en criant
Quand on y va chanter
Ah je n'ose pas penser
Qu'elles servent à voiler
Plus qu'à laisser entrer
La lumière de l'été

Non je préfère penser
Qu'une fenêtre fermée
Ça ne sert qu'à aider
Les amants à s'aimer


sábado, 11 de abril de 2009

À janela de Gérard Castello Lopes

1957, Algarve
1956, Évora
1958, Paris
1958, Paris
1958, Paris

Gérard Castello Lopes, Oui Non. Catálogo. Lisboa, CCB, 2004.

À janela de Mallarmé

Las du triste hôpital et de l'encens fétide
Qui monte en la blancheur banale des rideaux
Vers le grand crucifix ennuyé du mur vide,
Le moribond, parfois, redresse son vieux dos,

Se traîne et va, moins pour chauffer sa pourriture
Que pour voir du soleil sur les pierres, coller
Les poils blancs et les os de sa maigre figure
Aux fenêtres qu'un beau rayon clair veut hâler.

Et sa bouche, fiévreuse et d'azur bleu vorace,
Telle, jeune, elle alla respirer son trésor,
Une peau virginale et de jadis ! encrasse
D'un long baiser amer les tièdes carreaux d'or.

Ivre, il vit, oubliant l'horreur des saintes huiles,
Les tisanes, l'horloge et le lit infligé,
La toux. Et quand le soir saigne parmi les tuiles,
Son œil, à l'horizon de lumière gorgé,

Voit des galères d'or, belles comme des cygnes,
Sur un fleuve de pourpre et de parfums dormir
En berçant l'éclair fauve et riche de leurs lignes
Dans un grand nonchaloir chargé de souvenir !

Ainsi, pris du dégoût de l'homme à l'âme dure,
Vautré dans le bonheur, où tous ses appétits
Mangent, et qui s'entête à chercher cette ordure
Pour l'offrir à la femme allaitant ses petits,

Je fuis et je m'accroche à toutes les croisées
D'où l'on tourne le dos à la vie et, béni,
Dans leur verre lavé d'éternelles rosées
Que dore le matin chaste de l'Infini,

Je me mire et me vois ange ! Et je meurs et j'aime
- Que la vitre soit l'art, soit la mysticité -
À renaître, portant mon rêve en diadème,
Au ciel antérieur où fleurit la beauté !

Mais, hélas ! Ici-bas est maître : sa hantise
Vient m'écœurer parfois jusqu'en cet abri sûr,
Et le vomissement impur de la Bêtise
Me force à me boucher le nez devant l'azur.

Est-il moyen, ô Moi qui connais l'amertume,
D'enfoncer le cristal par le monstre insulté,
Et de m'enfuir, avec mes deux ailes sans plume,
- Au risque de tomber pendant l'éternité ?

Stéphane Mallarmé, "Les fenêtres", Album de vers et de prose. Bruxelas, Librairie nouvelle, 1887.
In Fenêtres. Paris, Éditions des Cendres, col. "Collages, 1983.

sexta-feira, 10 de abril de 2009

Stop the war!

Atenção ao texto de comentário que Edgar Ximenes acaba de enviar para este blogue (e que, desde já agradeço). Observações pertinentes e desassombradas que merecem uma reflexão. Este espaço está à disposição de todos os que queiram prosseguir a discussão do tema.

Solitude (by Jeremy Bailey)

quinta-feira, 9 de abril de 2009

Clip do dia 9


Miranda July ("Babelia", El Pais, edição on line)

A la mode de Palissy

Proposta da designer japonesa Junko Shimada.

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Obama e Aliança: uma perspectiva comum

Em Istambul, 6 e 7 de Abril, II Forum da Aliança das Civilizações cujo alto Representante é o antigo Presidente Jorge Sampaio (vide entrevista sobre as relações entre a Aliança e a nova Administração americana).

À la mode de chez nous

[Pavilhão de Portugal, 1889]
Abre amanhã, dia 9, uma exposição de Joana de Vasconcelos e Júlio Pomar na Gulbenkian em Paris
Sob coordenação de Lúcia Marques, são apresentados trabalhos que estabelecem explicitamente relação com o universo imaginário e produtivo de Rafael Bordalo Pinheiro, ceramista nas Caldas da Rainha, entre 1884 e 1905.
[Hansi Stäel]
A convite da comissária, escrevi um texto para o catálogo da exposição, no qual além de caracterizar alguns dos aspectos emblemáticos da obra de Rafael e de referenciar a sua presença em Paris em 1889, na Exposição Universal que assinalou a passagem do primeiro centenário da Revolução Francesa,
[Paula Rego]
aludo aos autores contemporâneos cujas obras têm tecido articulações com a cerâmica bordaliana: Joana de Vasconcelos, Júlio Pomar, Hansi Stäel, Paula Rego e Ferreira da Silva.
[Ferreira da Silva, 1994]
Não criei condições para poder estar presente, mas desejo aos autores, comissária e restantes colaboradores uma jornada bem sucedida.

sábado, 4 de abril de 2009

Stop the war!

Tenho o maior apreço pelo trabalho realizado no Agrupamento Escolar de Santo Onofre. Conheço há muito alguns dos professores que com a sua dedicação e competência fizeram da escola EBI de Santo Onofre uma escola de que a comunidade local justamente se orgulha. Sei também como foi difícil lutar pela integração de uma unidade escolar que foi territorialmente mal planeada e socialmente mal implantada. Testemunhei o esforço organizativo feito internamente e o valor de inúmeras realizações das equipas da Escola, aliás reconhecidas por instituições nacionais e internacionais. Chegaram-me provas da alta craveira profissional dos seus responsáveis a quem a cidade das Caldas deve o empenho e o exemplo.
Lamento por isso que Santo Onofre se tenha tornado palco da guerra que opõe professores e ministério da Educação. Não que a controvérsia seja em si condenável ou a divergência menos legítima. Mas porque, quando todos os instrumentos de mediação falham, corremos o risco sério de segmentar o que antes era dinâmico, quebrar o ímpeto do serviço público e afinal destruir em poucos dias o que tanto tempo levou a erguer.
Sabemos o capital acumulado que representa levantar e manter instituições sociais - neste caso escolas - conscientes e seguras dos seus objectivos, eficazes na articulação de interesses e motivadas para a sua realização. As cidades dependem mais delas do que nunca. Boa parte da sua atractibilidade está aí. A qualidade das escolas é um dos mais importantes indicadores da qualidade da vida urbana.
É preciso saber parar esta guerra, com a sua lógica mutiladora.