Senhor Presidente da Câmara, Senhor Secretário de Estado da Cultura
Devo, em primeiro lugar, fazer deste momento um símbolo partilhado. Nele se concentram, tanto a lembrança emocionada do esforço dispendido, como o impulso da continuidade, tanto a energia acumulada na acção cumprida, como a confiança no desafio lançado ao futuro.
É um momento de conclusão e também de prospectiva. Ao andar, fizemos o caminho, como disse o poeta António Machado. Continuando a andar, Guimarães prosseguirá o caminho. Prosseguindo o caminho, Guimarães irá mais longe.
É justo referir agora e saudar as organizações e instituições que caminharam connosco: dos órgãos de soberania: Presidente da República; Assembleia da República; Governo (e permitam-me aqui uma menção especial aos responsáveis pela Cultura - cuja presença nesta sessão nos é muito grata - pela Economia e Desenvolvimento Regional e pelo Turismo); Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte; a Comissão Europeia e o Parlamento Europeu; as inúmeras entidades, públicas e privadas, que pelas mais diversas formas de parceria e apoio, participaram com particular desvelo, no projecto Capital Europeia da Cultura.
Permitam-me que signifique na pessoa do Dr. António Magalhães, e na Câmara a que preside, o agradecimento caloroso que é devido a toda a cidade, uma cidade que exibiu e viveu o título de Capital Cultural da Europa com entusiasmo, sedução e brilho. Sr. Presidente, a nossa gratidão só encontra paralelo na admiração pela combatividade, pela visão e liderança que todos lhe reconhecem.
Neste momento, quero agradecer também a todos aqueles – e tantos foram! – que fizeram deste projecto o seu projecto, programando, produzindo, planeando, criando, trabalhando. A todos – órgãos e colaboradores da Fundação Cidade de Guimarães e de A Oficina envolvo num abraço de reconhecimento e afecto. Sei que não esqueceremos este ano e o que dele fizemos.
Toda a comunicação social nos acompanhou de forma exemplar, conferindo a este ano de cultura relevo e impacto. A todos os meios envolvidos no imenso Fazer Parte desta Capital endereço um profundo agradecimento, com um destaque especial ao grupo RTP, cujo o esforço e o empenho, dignificando um serviço publico que importa tenha continuidade, quero aplaudir.
Ao andar faz-se o caminho,
e ao olhar-se para trás
vê-se a senda que jamais
se há-de voltar a pisar.
Nesta senda, a nova criação juntou-se ao património, seguimos as raízes até ao presente, trazendo-as ao encontro do que é diferente, específico e irredutível na contemporaneidade. Neste projecto, a cultura não perdeu de vista a dimensão económica e urbana e integrou a dimensão educativa e social. Acrescentou lajes e rastos aos que tinham sido legados pelas gerações anteriores. Um dos mais importantes desses rastos liga Guimarães à Europa e ao resto do mundo, consciente do lugar próprio da cultura e das cidades na curva apertada que temos pela frente.
Caminhante, não há caminho,
somente sulcos no mar
Os sulcos abertos revelaram a cultura como sistema urbano, dotado de estruturas e profissionais, que planeia e adapta, que presta serviços e produz, que capta recursos e fixa talento, que articula interesses e expectativas. Aqui, a cultura fez-se enquanto política pública e em colaboração com o nível associativo e privado/empresarial.
Esses sulcos foi a cidade que os recebeu e fomos todos nós que os abrimos. Cada um desses sulcos pontua uma malha que, ao mesmo tempo, se apertou e se estendeu. É malha de uma rede regional e nacional, europeia e internacional.
No princípio deste caminho estava a cidade. E ela aí está, de novo, perante nós: é a mesma e já é outra.
Agora, sabe melhor que andar é trânsito e transição, passada e passagem, reconhecimento e descoberta. Neste ano memorável, transportámos memórias acrescentadas de novas memórias e actualizações de memórias antigas. Ampliámos a cidade com novas experiências e novos saberes. Forjámos laços de sentimento e compreensão que nos ajudam a ambicionar um futuro com mais sentido do colectivo e mais afirmação do singular.
O espectáculo que vai em seguida ter lugar é um resumo e uma metáfora do caminho andado. Nele intervêm mais de meio milhar de pessoas vindas de todos os lugares do concelho e arredores. Como estas:
- O Carlos que tem 16 anos. Em 2011 aderiu ao projecto Uma História do Futuro e descobriu em si o gosto da escrita. Foi seleccionado para uma visita a Maribor e acompanhou em Guimarães os jovens eslovenos que dali partiram. Participou no projecto Krisis e agora neste. Fez novas relações. Ao fim da noite procura boleia para a freguesia onde vive, Gonça, uma das mais distantes da sede do concelho.
- A Maria do Carmo que trabalha numa loja no Toural. Com o marido, desempregado, entraram no Outra Voz porque “faz bem estar com outros”. Começa a trabalhar às 7h da manhã e nunca sabe a que horas consegue chegar ao ensaio da noite. A patroa deu-lhe agora a tolerância horária bastante para que pudesse concretizar o seu sonho de fazer um grande espectáculo.
- O Fernando que é professor associado no Departamento de Electrónica Industrial da Universidade do Minho. A sua vida académica é muito preenchida e tem 4 filhos. Faz parte do corpo de voluntários e integra o coro Outra Voz. Abriu a sua casa ao Mi Casa es Tu Casa e realizou um projecto no Guimarães Noc Noc. No dia seguinte às provas de agregação, o Prof. Fernando corria a Feira Afonsina trajado de guerreiro medieval.
- O Senhor Domingos que está reformado. Entrou, pela primeira vez, na fábrica de cutelaria onde o pai trabalhava, aos 4 anos. Um dia, na Herdmar, viu entrar pela fábrica as crianças envolvidas nas residências artísticas da Capital Europeia da Cultura e sentiu um grande alegria pela diferença do seu tempo de menino. Quando soube que algumas das peças que construiu nestas residências estariam aqui, lançou de novo mãos à obra, retocando os corações que martelara com as crianças.
São histórias de pessoas concretas, que fazem o arco, tantas vezes invisível, que desenha a ponte, como notou Ítalo Calvino. Estas histórias, que poderia multiplicar por mil, por 10 mil. Testemunham que valeu a pena.
São histórias de cidadania, de confiança na energia que cada um pode dar e receber, transmitindo-a a um projecto de todos e de cada um. Esta é a cidadania que não tem dúvidas em responder à pergunta: que podes fazer pelo teu País, pela tua cidade, pela tua terra?
A cidade está no princípio e no fim deste projecto. Está na transição que agora começa. Com um espaço público enriquecido, vivido de forma intensa. Com uma abertura renovada à pluralidade cultural e artística e ao cosmopolitismo. Com fronteiras mais porosas entre produtor e consumidor, entre público e privado, entre erudito e popular, entre antigo e jovem. Ficámos com um território mais apetrechado com parcerias para a cultura. Um território mais consciente de que a solidariedade se revaloriza também pela colaboração em processos artísticos e culturais.
Guimarães viveu a utopia da sua capital da cultura na realidade do seu dia a dia. Fê-lo com inovação e com realismo. Com entusiasmo e com criatividade.
É uma cidade e é todas as cidades, que se revêem na mesma ambição.
A criação artística e cultural reelabora o imaginário das cidades. Mas deve, como aqui sucedeu, ancorar-se no real, encontrando-se com as percepções, as necessidades e os sonhos dos seus habitantes.
A cultura é a casa do homem, aquela em que ele se pode sentir mais abrigado do inumano. Os humanistas acreditam nisto, desde sempre. É em nome desse humanismo cultural e crítico que a Europa se fez e tem de continuar a fazer-se. De Guimarães, cidade portuguesa, europeia e universal, nós afirmamos a nossa vontade de construir o futuro em nome do melhor que somos.
Viva Guimarães!
Viva Portugal!
Viva a Europa!
Viva a Cultura!
sexta-feira, 21 de dezembro de 2012
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5 comentários:
A cidade fica como um corpo vive. As ruas, as praças, os lugares são órgãos, artérias, veias, por onde passa o sangue que o pulsar de tantos corações deixa correr.
Que viva!
- Isabel X -
Magnífico texto pela humanidade e sentido do outro.
Emocionante e emocionado.
Mais que lê-lo, gostaria de o ter ouvido.
Aplaudo fortemente e de pé. Guimarães não esquecerá o homem por detrás da obra.
Obrigado, Amigas.. Podia ter ouvido, Isabel S. A RTP transmitiu em directo.
De facto, não vi,nem ouvi, João. Seria despropositado explicar-lhe aqui o motivo. De qualquer modo a TV não me deixaria apreciar, como gostaria, toda a dimensão humana do não dito. Simplificando digamos que as marcas da linguagem não-verbal sairiam diminuídas. Não conheço de si a forma como se emociona. Era com o que gostaria de me surpreender.
Vi, ouvi e gravei, para voltar a ver e ouvir outras vezes......os próximos dias serão passados em Guimarães....verei este ano partir em Guimarães; verei o próximo chegar em Guimarães, é a forma de eu afirmar que "então ficamos"....
Parabéns mais uma vez, João....mais não é demais.....
Abraço amigo,
NB
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